quinta-feira, 11 de julho de 2013

O brado retumbante



Os jovens nas ruas caminhando, protestando e cantando escreveram uma nova página na história do Brasil.
A imagem dos manifestantes ocupando pacificamente umas das cúpulas do Congresso Nacional é de grande beleza plástica e da maior simbologia.
Os caras-pintadas voltaram às ruas para dar um recado aos "caras-pálidas" que se recusam a reciclar velhos métodos e velhacas práticas de se fazer política no Brasil. "Saímos do Facebook e ganhamos as ruas" - são dizeres de um dos cartazes portados por jovens manifestantes, que acabaram também arrastando seus pais, tios e avós dos sofás e das novelas edulcoradas para as ruas em ebulição.
As manifestações se sucederam em ritmo frenético. As ruas das grandes metrópoles e também de médias e pequenas cidades brasileiras viraram rios de sonhos de multidões que desejam mudanças. De repente , os brasileiros se deram conta de que, em grande maioria, seus representantes não mais os representam e sim os interesses corporativos de grupos econômicos, de castas e de feudos. Os políticos profissionais estão em polvorosa. Não contavam com essa explosão nas ruas justamente em tempos de Copa das Confederações. Afinal, as modernas arenas foram construídas com recursos do BNDES, que é um banco oficial, para festejar a alegria do povo brasileiro, certos e que o Brasil iria entrar em campo, transformando-se na "Pátria de chuteiras", tomando também por empréstimo a frase famosa do grande Nelson Rodrigues.
A Copa das Confederações/2013 e depois a Copa do Mundo/2014 seriam a dose certa para uma "anestesia geral" do povo brasileiro, notadamente se o Brasil, honrando suas tradições e recuperando seus brios, acabe conquistando os dois títulos. A Fifa também aposta nesse jogo (não seria jogada ?!).
O chamado padrão Fifa de qualidade foi feito em cima dos recursos públicos, investimentos em torno de R$ 44 bilhões, que dariam para construir, no mínimo, uns 5 mil hospitais (padrão Porto Dias) e umas 5 mil unidades de Urgência/Emergência (PAS), umas 5 mil novas escolas, além de promover a tão falada mobilidade urbana nas 27 capitais brasileiras. Apesar de bancar a conta dessa festa, o povo brasileiro ainda pagou mais caro nos estádios, com ingressos caríssimos e uma coca-cola custando R$ 8, em bares e lanchonetes explorados pela própria Fifa.
Faturando alto, sem ter feito investimentos, a FIFA ainda "se achou " investida de poderes para determinar normas ao governo e até dar "pito" no povo brasileiro, como fez seu presidente Blatter, pedindo respeito na famosa vaia da abertura da Copa. Aliás, ele só fez aumentar os apupos. Podia ter ficado calado, pois assim teria agradado mais à presidente constrangida com sua desastrada intervenção.
Na verdade, são muito mais de 20 os motivos que desencadearam as manifestações, a partir do reajuste de 0,20 centavos nas passagens de ônibus em São Paulo, apenas a gota d'água que transbordou do oceano de insatisfações e demandas sociais reprimidas. Corrupção deslavada, impunidade e cinismo de políticos profissionais; compadrio e afilhadismo em nomeações para o serviço público, em detrimento dos aprovados em concursos; filas e apertos para apanhar ônibus sucateados e sujos; metrôs lotados embarcando gente como gado; privilégios odiosos desfrutados pela classe (casta) política, a exemplo dos adiposos aditivos aos seus honorários nada honoráveis, como auxílios de gabinetes, de moradia, de saúde e até de paletó, "tunga" de 50% praticada pelos parlamentares nos salários de seus assessores e servidores de gabinetes, tida como "coisa normal, isso todo mundo faz" - como disse um deputado federal paraense, ao ser denunciado pelo MP pela prática, antes do brado das ruas contra todo esse estado de putrefação moral vivido pela classe política e até então bovinamente tolerado pelo distinto público pagante, que resolveu despertar, graças aos jovens que transformaram as ruas de nossas cidades em rios de esperanças e de sonhos de um Brasil melhor.
Acuados, parlamentares e governo, tratam agora de tentar acalmar a "fera ferida" despertada pela voz rouca das ruas, com a adoção de algumas medidas paliativas que, sinalizando mudanças cosméticas, possam ser "monitoradas" de modo a não fugir do controle e de seu comando. Renan Calheiros, presidente do Senado, um dos alvos das manifestações, se faz de desentendido (não é comigo!) e propõe simplesmente o "passe livre" para estudantes e desempregados em todo o país. De onde viriam os recursos?"
Ora, diz Renan, recursos sempre os há! O que faltava era "vontade política" - aduz candidamente, antes de partir para mais um voo doméstico no jatinho da FABTur. Trata-se da mais deslavada confissão de cinismo feita por um "cara-pálida" da política nacional. Dona Dilma, por seu turno, trata de mudar seu visual taciturno, com um "trato" no cabeleireiro oficial (coisa de uns R$ 3,5 mil por sessão) convoca uma rede nacional de televisão e anuncia que a saída é a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte, despertando a ira de políticos profissionais de sua "base" nada sólida e o estupor de juristas, advogados e meros estudantes de direito diante do absurdo da proposta. Ela não ouviu ninguém, nem seus assessores jurídicos da AGU, nem seu vice (que não viceja nem apita nada), por sinal professor de direito constitucional.
Para corrigir a gafe monumental, em horário nobre e em cadeia nacional, dona Dilma, sem confessar seu erro, aponta agora como solução milagrosa para "acalmar o clamor das ruas" a realização de um Plebiscito. Os parlamentares de sua "base" porém não gostaram e querem transformar o Plebiscito em Referendo. Qual a diferença ? Ora, elementar, caro cidadão-eleitor-contribuinte. No plebiscito o cidadão iria votar em propostas para uma Reforma Política, no estilo Sim ou Não. No referendo ele vai apenas "degustar" o prato feito pelo Congresso Nacional, preparado pelos mesmos políticos que desejam mudar, sim, mas desde que seus privilégios sejam mantidos. Tem mais: as mudanças cosméticas só iriam valer para as eleições de 2018, empurrando com a pança possíveis riscos de uma "degola" de suas mordomias. Afinal, "no longo prazo todos estaremos mortos", como dizia o grande economista e pensador inglês Mr. Keynes. Todavia, a vida continua e renovar também é preciso.
A juventude também tem pressa, pois não quer herdar um país falido e destruído. "Brasil, país do futuro" foi título de livro famoso de autor estrangeiro meio trapalhão, que queria se dar bem, mas acabou muito mal.
Mesmo sem ter sido consultado, dou minha modesta contribuição para o caso de ser adotada a consulta popular para a reforma política, via plebiscito, com as seguintes perguntas na base do SIM ou NÃO:
- Você concorda com a extinção do cargo de vices em todos os níveis da gestão pública?
- Você concorda com a extinção da figura dos suplentes de senadores?
- Você concorda com o lançamento de candidaturas independentes, sem o crivo dos partidos?
- Você concorda que os honorários de um vereador sejam equiparados ao teto de um servidor municipal, sem os penduricalhos e aditivos adiposos?
- Você concorda com a mudança na lei para impedir a reintegração de posse de terrenos ocupados por famílias sem teto para morar?
- Você é a favor do fim da cela especial para quem tem curso superior?
- Você é a favor de que propriedades rurais que, ilegalmente, ocupam territórios indígenas sejam devolvidas aos povos que as reivindicam?
- Você concorda que fazendas e imóveis palco de trabalho escravo sejam confiscados sem direito à indenização e destinadas aos sem-terra e sem-teto?
- Você concorda com a expulsão de juízes venais do serviço público, com a perda de sua gorda aposentadoria compulsória?
- Você é a favor de que o Imposto de Renda seja cobrado apenas de quem aufere rendas de aluguéis (mais de 2 imóveis), aplicações (mais de R$ 500 mil), grandes fortunas e heranças milionárias - e não sobre os salários até R$ 10 mil?
- Você concorda que os salários de deputados estaduais, federais e senadores sejam equiparados ao dos servidores públicos, estaduais ou federais, com o mesmo índice de reajuste anual?
- Você concorda que o teto do salário de um senador ou deputado seja o mesmo adotado para os servidores públicos?
- Como é você quem paga, concorda com a extinção de todos os adiposos "aditivos salariais" (gabinete, assessores, combustível, moradia, paletó, etc.) percebidos pelos deputados e senadores?
- Você concorda que seja vedada a reeleição para os cargos do Executivo?
- Você concorda que seja vedada a reeleição (mais de dois mandatos) para deputados e senadores?
- Você concorda que os 22 mil cargos comissionados do governo federal sejam preenchidos mediante concurso público?
Data venia, eis minha modesta contribuição para o plebiscito sobre a reforma política no Brasil , já que Dona Dilma deseja ouvir as vozes das ruas.

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FRANCISCO SIDOU é jornalista
chicosidou@hotmail.com

2 comentários:

Anônimo disse...

Eu digo sim.

em tempo: faltou um item pra penalizar os empresários corruptos também. SIM.

Metro Quadrado Imoveis disse...

Parabéns Sidou pelos comentários que refletem de forma lúcida os anseios de todos os brasileiros. O gigante acordou disposto a recuperar o tempo em que ficou "dormindo em berço " nada espêndido.
Abs