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A sede da Dispará: empresa é acusada pelo Ministério Público do Estado de jamais ter produzido ou comercializado álcool em gel |
O Ministério Público do Estado do Pará, através do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco), Grupo de Atuação Especial de Inteligência e Segurança Institucional (GSI) e o Núcleo de Combate à Improbidade e à Corrupção (NCIC), em conjunção de esforços institucionais com a Promotoria de Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Belém, deflagrou nesta sexta-feira (18) a terceira fase da operação “Transparência” que investiga a atuação de uma organização criminosa que estaria atuando dentro da Secretaria de Estado de Saúde (Sespa).
Denominada de "Álcool 70%”", nesta fase o Ministério Público investiga fraude na dispensa de licitação nº 2020/229598, especificamente quanto à aquisição de 159.400 frascos de 500ml de álcool gel, pela absurda quantia de R$ 2.869.200,00 (dois milhões, oitocentos e sessenta e nove mil e duzentos reais), da empresa Dispará Hospitalar Comercial E Serviços Ltda, que jamais produziu ou comercializou a substância.
Segundo as provas já colhidas na investigação, uma organização criminosa chefiada pelo ex-Secretário de Saúde Alberto Beltrame e formada ainda por Peter Cassol Silveira, Cíntia de Santana Andrade Teixeira, Daniel Jackson Pinheiro Costa, Luiz Felipe Fernandes, Francisco Leandro Rodrigues Rocha, Débora Pinheiro Mesquita, Carlos Eduardo de Sousa Lima e Cláudia Cristina Silva Machado transformou a Sespa em um balcão de negócios, deixando a população paraense à mercê do vírus covid-19.
A investigação foi reforçada pela colaboração premiada dos proprietários da Dispará Hospitalar Comercial e Serviços Ltda, que confirmaram que a empresa foi contratada, por intermediação de Daniel Jackson, apenas apara emitir nota fiscal, enquanto a mercadoria foi adquirida de terceiros, por valores muito inferiores.
A operação cumpriu mandados de busca e apreensão, prisão preventiva expedidos pela Vara Especializada de Combate ao Crime Organizado para serem executados em endereços localizados em Belém, São Paulo e Porto Alegre, que foram cumpridos com apoio dos Gaecos dos Ministério Públicos de São Paulo e do Rio Grande do Sul, e também das polícias civis e militares dos referidos Estados.
O empresário e Presidente do Conselho Regional de Farmácia, Daniel Jackson Pinheiro Costa, foi preso preventivamente em sua residência.
O ex-Secretário de Saúde Alberto Beltrame, teve decretado, além de ordem de proibição de acesso ou freqüência à sede da Secretaria de Estado da Saúde do Estado do Pará e de qualquer estabelecimento das empresas investigadas ou envolvidas, ainda que indiretamente, nas investigações, proibição de ausentar-se da Comarca onde reside, salva autorização deste juízo, recolhimento domiciliar no período noturno, entre 20h, e 6h do dia seguinte nos dias de folga, como sábado, domingo e feriados, salvo em razão da necessidade de trabalho ou outro motivo de força maior, devidamente comprovado, suspensão do exercício de função pública pelo período de 1 (um) ano, e monitoração eletrônica por tornozeleira eletrônica. A mesma medida foi estabelecida para Peter Cassol Silveira, Cíntia de Santana Andrade Teixeira, Luiz Felipe Fernandes, Francisco Leandro Rodrigues Rocha e Cláudia Cristima Silva Machado.
O Ministério Público do Estado do Pará, através do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) cientificou inclusive para fins de fiscalização quanto ao efetivo cumprimento da ordem, ao Secretário de Estado de Administração Penitenciária do Pará através da Direção da Central Integrada de Monitoramento Eletrônico sobre o teor da ordem de monitoração eletrônica em desfavor dos réus acima indicados.
Foram apreendidos diversos aparelhos de telefones celulares, além de equipamentos eletrônicos tipo notebooks, documentos, notas fiscais, tablets, veículos que serão objeto de análise para prosseguimentos dos trabalhos de investigações e ulteriores aditamentos.
Denúncia
Em peça de 225 laudas, o Ministério Público imputa aos denunciados Alberto Beltrame, Peter Cassol Silveira, Cíntia de Santana Andrade Teixeira, Daniel Jackson Pinheiro Costa, Luiz Felipe Fernandes, Francisco Leandro Rodrigues Rocha, Débora Pinheiro Mesquita, Carlos Eduardo de Sousa Lima e Cláudia Cristina Silva Machado a prática de crimes de peculato (art. 312, caput, segunda parte, c/c a causa de aumento de pena prevista no art. 327, § 2°, todos do Código Penal Brasileiro); fraude licitatória ( arts. 89 e 96, I, c/c art. 84, § 2°, todos da Lei nº 8.666/93); organização criminosa(art. 2º, c/c art. 1°, § 1°, e art. 2º, § 4°, II, todos da Lei n° 12.850/13);e lavagem de capitais (art. 1º, §§ 1°, II, e 4º, da Lei 9.613/98). As penas somadas podem atingir mais de setenta anos de reclusão para alguns dos réus.
O esquema criminoso funcionava, de um modo geral, da seguinte maneira: sabia-se de antemão quem seria o vencedor da licitação, através de conluio e prévio ajuste entre o núcleo político da ORCRIM e as empresas, por seus representantes ou intermediários; a divisão do dinheiro público que seria desviado também era previamente ajustada, sendo que em alguns casos, como o ora denunciado, o percentual do núcleo político chegou a 20% (vinte por cento) do valor total contratado; alguns produtos foram licitados apenas para fazer o dinheiro público circular e beneficiar a ORCRIM, pois sequer tinham a justificativa de aquisição (isso, tanto em qualidade quanto em quantidade), ou seja, a finalidade da pandemia não foi atendida; escolhido o vencedor, ocorria o pagamento antecipado do valor total contratado, mesmo com produtos não entregues; a licitação era “montada” extemporaneamente, adaptando-se os valores supostamente pesquisados em planilhas (mapas de preço), sendo que vários outros documentos também foram assinados com datas retroativas, de maneira fraudulenta, tudo para dar aparência de legalidade à licitação; notas de entrega dos produtos foram forjadas ou antecipadas (mesmo sem entrega formal); algumas empresas contratadas serviram apenas para emitir nota fiscal, não tendo prestado qualquer serviço diretamente; com a expedição da nota de empenho, emissão de nota fiscal e posterior pagamento, os valores eram divididos (a depender da negociação) entre os integrantes da ORCRIM16; gerados os recursos ilícitos, e para fins de dar aparência de legalidade, os valores monetários eram submetidos a atos de lavagem para ocultação e dissimulação de origem e natureza. Encerrado esse ciclo, partia-se para novas licitações, com outros objetos e empresas, buscando novos lucros, mas sempre atuando com modus operandi similar.
A organização criminosa se comunicava através de um grupo criado no app Whatsapp.
A denúncia foi recebida pela Vara Especializada de Combate ao Crime Organizado.
Acesse aqui a denúncia na íntegra.
Relembre o caso
No período do pico da covid-19, surgiram diversas denúncias de fraudes e superfaturamento de contratos da Secretaria de Estado de Saúde, realizados sob dispensa de licitação. Os escândalos levaram ao afastamento e posterior exoneração do Secretário de Estado Alberto Betrame.
As notícias de crime causaram grande indignação na população paraense que sofria com as mortes, internações e restrições econômicas.
Em 18 de março, a Secretaria de Estado de Saúde, na gestão de Alberto Beltrame, contratou, com dispensa de licitação, a empresa Dispará Hospitalar Comercial e Serviços Ltda para fornecer 159.400 unidades de álcool gel 70%, em frascos de 500 ml, pela quantia de 2.869.200,00 (dois milhões, oitocentos e sessenta e nove mil e duzentos reais).
O preço elevado logo chamou a atenção de jornalistas e blogueiros.
As várias denúncias resultaram em investigações conjuntas do Ministério Público Estadual e Federal e da Polícia Federal. De acordo com as regras de competência jurisdicional e atribuição administrativa, o contrato da Dispará Hospitalar Comercial e Serviços Ltda, entre outros, ficou para investigação direta do GAECO-MP/PA, com apoio dos demais órgãos de investigação da Instituição.
Com o final das investigações, o Ministério Público concluiu haver provas suficientes da existência de uma organização criminosa, desvio de verbas, fraude à licitação e lavagem de dinheiro, submetendo o caso a julgamento pelo Poder Judiciário.
Fonte: Ministério Público do Estado do Pará