Unido ao contrito momento nacional, a Grécia fez voto de protesto nas legislativas antecipadas na última semana de janeiro. A União Europeia está à beira de um ataque de nervos. Querem tirar conclusões imediatistas pelo governo liderado pelo Syriza, que, segundo especialistas, poderá desencadear um “efeito dominó” para incluir a Frente Nacional (FN) de extrema-direita de Marine Le Pen. Os extremismos se assemelham. Está bem claro com a vitória dessa legenda de extrema-esquerda. Medidas de austeridades impostas pela troika (Banco Central Europeu, UE e FMI) não funcionaram durante seis anos de recessão. A Grécia sofreu uma queda produtiva de 25%, tem um nível de desemprego de 26%. Pelo menos 30% da população está mergulhada na miséria.
Alexis Tsipras (na foto), novo primeiro-ministro da Grécia, líder do Syriza, pretende permanecer na Zona do Euro. Contudo, seu programa econômico é de difícil implementação, sem violar os acordos de políticas econômicas selados com os credores internacionais. A legenda de esquerda radical prioriza a negociação da dívida grega de 240 bilhões de euros. Os gregos têm razões para estarem cansados de tantos sofrimentos. Além das dificuldades na vida cotidiana, eles lêem todos os dias os malfeitos de um passado de corrupção. Leve-se em conta uma UE, onde o mercado livre é o alvo abençoado pela chanceler alemã, Angela Merkel. Nem por isso se tem certeza de que Tsipras é a solução. O Syriza ainda não explicou de forma convincente onde vai encontrar os fundos para os 12 bilhões de euros que colocariam um fim na austeridade, como prometeu aos eleitores.
Embora até dois anos atrás fosse favorável à saída da Grécia da Zona do Euro, e por isso não foi recebido por socialista algum em uma visita a Paris, Tsipras percebeu que um calote de Atenas e a saída da Zona do Euro implicariam a expulsão imediata da Grécia da UE. Ademais, o país não teria acesso aos mercados financeiros. Ao não abandonar o euro, revelou, mais uma vez, seu pragmatismo político sem, ao mesmo tempo, deixar de lado sua formação de homem de esquerda. Na verdade, o líder do Syriza teve de enfrentar cerca de 30% de integrantes de sua própria legenda, pletora de agremiações de diversas inclinações esquerdistas, que gostariam de deixar a Zona do Euro.
Tsipras prometeu libertar o país da humilhação e recuperar sua soberania. Nos últimos anos, a economia e o salário mínimo encolheram e o desemprego aumentou. A dívida pública desde 2010 virou um pesadelo econômico e humano. O PIB só voltou a crescer no fim do ano passado. A vitória do Syriza é uma rejeição às medidas impostas de fora do país. A maioria dos gregos quer continuar com o euro, mas discorda das regras atuais. Tsipras tinha no máximo três dias para formar um governo. Fechou em um dia. Falta-lhe experiência? De verdade, ele surpreendeu o eleitorado grego e o mundo.
O objetivo maior de Tsipras é conferir maior poder aquisitivo ao povo. Deverá introduzir medidas de isenções fiscais e políticas de bem-estar para os menos favorecidos. Abolirá a Enfia, o equivalente ao IPTU. Obviamente que isso levou os cidadãos da classe média, cada vez mais afetada pela crise econômica, a lhe consagrar nas urnas. Seu programa impõe impostos progressivos aos endinheirados, que pagarão mais, inclusive, sobre bens herdados. Contudo, chocou e surpreendeu os líderes conservadores da UE pondo fim à privatização do porto de Pireu e recontratou funcionários públicos.
Ademais, os bancos do país perderam um terço de seu valor. Não se trata só do resgate moral e econômico, mas de rejeitar a política de austeridade imposta pela Comissão Europeia. Tsipras se alia à direita nacionalista e promete libertar o país do pesadelo econômico. Ainda é uma incógnita saber até que ponto vai o radicalismo dessa esquerda à grega. Se a esquerda pode empurrar a Grécia para fora do euro e eventualmente do bloco europeu, ninguém arrisca um palpite no momento.
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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com
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