Começamos a segunda-feira com uma pérola jurídica assinada por ninguém menos que o digníssimo doutor William Tito Schuman Marinho, delegado da Polícia Federal que presidiu o inquérito para apurar se o puro, o ínclito e imaculado Jair Bolsonaro prevaricou no caso da negociação para compra da vacina indiana Covaxin.
A Polícia Federal concluiu que não, que Bolsonaro não praticou o crime de prevaricação.
Para começo de conversa, prevaricação, anotem bem, é um crime contra a administração pública e ocorre quando um funcionário público, tomando conhecimento de supostas irregularidades, deixa de comunicar a suspeita às autoridades - à Polícia Federal e ao Ministério Público, por exemplo.
Pois bem.
Nesta segunda (31), a PF mandou ao Supremo um relatório apontando que não identificou conduta criminosa de Bolsonaro. Simples assim.
O raciocínio do doutor-delegado é espantoso.
Escreve o digno investigador: "Ainda que não tenha agido, ao presidente da República Jair Messias Bolsonaro não pode ser imputado o crime de prevaricação. Juridicamente, não é dever funcional (leia-se: legal), decorrente de regra de competência do cargo, a prática de ato de ofício de comunicação de irregularidades pelo Presidente da República".
O delegado reconhece que há elementos que apontam que Bolsonaro soube das supostas irregularidades, e citou como exemplo os depoimentos do ex-ministro Eduardo Pazuello e do deputado Luís Miranda. Porém, de acordo com Marinho, um presidente só pode ser enquadrado no crime de prevaricação quando envolver uma conduta inerente ao cargo e que esteja prevista na Constituição. Não era esse o caso, segundo ele. “Não está presente o ato de ofício, elemento constitutivo objetivo impresindível para caracterizar o tipo penal incriminador", completou.
Diante dessa interpretação do delegado, imaginemos o seguinte cenário.
Bolsonaro recebe, em mãos, documentos autênticos indicando que ministro seu, seja quem for, está metendo as mãos nas burras do Tesouro, aliviando-o em milhões e milhões de reais.
De posse dos documentos, de posse das provas desse crime estupendo e monumental contra a Administração Pública, Bolsonaro, simplesmente, diz assim para o interlocutor que lhe levou a papelada em mãos: "Chá comigo que eu vou mandar apurar. Vou só acabar de mentir um pouquinho aqui nas redes sociais e já vou mandar apurar." Mas não apura absolutamente nada.
Aí, algumas semanas depois, o interlocutor do presidente apresenta à Nação um vídeo ou uma imagem qualquer, para demonstrar que levou os documentos ao Puro, que o Puro viu tudo, prometeu mandar apurar e esqueceu de fazê-lo.
Pronto. Eis a prevaricação.
Então, nesse caso, não houve prevaricação porque o prevaricador é o presidente da República.
É isso mesmo?
E enquanto o prevaricador nada fez, o ministro ladrão continuou roubando à vontade, porque seu chefe, o presidente da República, que deveria agir de ofício para apurar as falcatruas, nada fez. Em vez de agir, preferiu ficar na labuta, grudado nas redes sociais todo dia, o dia inteiro, sem fazer nada.
É isso mesmo?
Se é isso, vamos combinar: bandido bom é bandido impune. Combine com Bolsonaro pra saber como um criminoso pode ser protegido.
Nenhum comentário:
Postar um comentário