O fascismo está de tocaia

SERGIO BARRA

Não é fácil admitir coisas como o medo das ditaduras ou a contumácia nas derrotas políticas, ainda mais quando isso, muitas vezes, não é necessário. A promoção da intolerância começa a desfigurar a Primavera Árabe. No presente, o Oriente Médio experimenta uma adversidade de pensamento, de insatisfações só vivenciadas por aqueles que lutam a vida toda sem alimentar rancores e a mácula da prepotência. Há existências que nos ensinam muito. E a democracia é uma delas. A diversidade de pensamento não é apenas um direito constitucional fundamental. É, sobretudo, um mecanismo de autoproteção do Estado Democrático. A sensação que se tem acompanhando ao longo dos anos é que o OM atravessa o fundo do poço da política e o chamado Crescente Fértil virou um inferno.
É notória a desigualdade social e religiosa que vige nesses países, e a iníqua distribuição de justiça é mais um reflexo desse quadro. Nove meses após o início da Primavera Árabe, a falta de respostas convincentes às reivindicações, para não falar dos problemas de fundo que as geraram, começa a azedar o caldo.
Em países onde ditaduras caíram: Tunísia, Egito e Líbia - Muammar Kaddafi é morto -, regimes de transição mantêm figuras-chave do antigo regime no poder, adiam eleições, aliam-se a entreguistas islâmicos ou, digamos assim, tudo isso ao mesmo tempo. Onde o conflito continua em aberto, como se constata no Iêmen, no Bahrein e na Síria, as chances de uma saída democrática são remotas.
Em Israel, até prova em contrário, um movimento, digamos, de “indignação”, tem ares de maior densidade, fortalecendo uma musculatura que se hipertrofia e pressiona por reformas sociais, mas também se vê um recrudescimento do extremismo da direita política e religiosa e atentados a propriedades, mesquitas e túmulos de não judeus. Até onde isso leva?
Em boa hora o Egito tenha marcado as eleições parlamentares para 28 de novembro, o governo militar adiou por tempo indeterminado a entrega do poder e fala aos quatro ventos que pretende permanecer pelo menos até 2013. Dia desses, moveu contra uma manifestação liderada por cristãos coptas - povo egípcio do período helenístico e do tempo sob dominação romana, que conserva suas características étnicas primitivas -, em 9 de outubro, a repressão mais violenta desde a queda de Hosni Mubarak. Houve pelo menos 550 feridos e 26 mortos, um massacre. De quem, no Egito, partiu a ordem de esmagar manifestantes com blindados e instigar fanáticos a atacá-los?
Na Tunísia, onde mais de cem partidos pretendem participar da eleição inicialmente marcada para 24 de julho e depois adiada para 23 de outubro, o primeiro nas pesquisas é o partido Nahda, “Renascença”, que originalmente se chamou “Ação Islâmica” e é tido como islamita moderado, seguido por três partidos laicos de centro-esquerda e pelo Partido Comunista.
Nesse cenário de crise, a teatralidade é sinistra. Circula na Síria a tese, alimentada pela mídia governista, que o Ocidente, a Arábia Saudita e Israel planejam expulsar as minorias cristãs do OM. É provável que os EUA aceitem a parceria com os fundamentalistas como um mal menor que lhes permite reter interesses estratégicos. Trata-se de uma conspiração absurda. Assim, faziam os fascismos europeus e talvez pretendam fazer, hoje, os novos regimes líbio e egípcio, este um país superpovoado e uma economia frágil.  Todo fascismo é indício de uma revolução fracassada. 

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Sergio Barra é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com