Ronaldo Porto: nossas lágrimas por ele aliviam a nossa dor e afogam as gargalhadas cavernosas |
Noutro dia, outro golpe.
Pelo terceiro dia, o terceiro golpe.
É assim, nestes tempos de tragédia.
Tem sido assim, nestes tempos em que a morte, um dia sim, outro também, vai golpeando as vidas, vai ceifando-as e tornando-as mais breves - para desespero dos que ainda têm sensibilidade e para o êxtase de negacionistas cruéis, desalmados, repugnantes, que dão gargalhadas, nos mandam parar com frescuras quando choramos esses horrores e nos aconselham a comprar vacinas na casa da mãe.
A morte do radialista e apresentador do Grupo RBA Ronaldo Porto, na manhã deste domingo (14), vítima de Covid, é mais um golpe - que nos entristece, abate e atordoa.
Sua morte consterna seus familiares, amigos e os que eram íntimos dele há décadas, sem efetivamente sê-lo.
Eu era íntimo de Ronaldo, mesmo sem sê-lo.
Como já disse aqui, uma vez, há pessoas que são íntimas nossas, mesmo que nunca as tenhamos conhecido pessoalmente.
Criança pequena e depois adolescente lá pelos idos de 1970, em Santarém, eu ouvia suas intervenções como repórter esportivo da Rádio Marajoara, onde formava ao lado de gigantes como Ivo Amaral, Jones Tavares, Carlos Castilho e outros.
Ouvia-o colando os ouvidos num radião de meu avô Vidal. Depois, passei a ouvi-lo como narrador.
Desde então, tornei-me íntimo de Ronaldo, mesmo sem conhecê-lo.
Muito depois, acho que na década de 1990, nossos trilhos se cruzaram por imposições profissionais minhas e dele. E acabei conhecendo-o pessoalmente.
Desde então, travamos um relacionamento sempre dos mais respeitosos e cordiais.
Chocou-me saber, há pouco mais de um mês, que Ronaldo havia sido internado em estado grave num hospital particular de Belém para tratar-se de Covid.
Chocou-me e indignou-me, mais recentemente, a veiculação de uma fake news criminosa que o dava como tendo morrido.
Choca-me, agora, sabê-lo de fato sem vida.
Mas não totalmente sem vida, devo dizer.
Porque ficam as lembranças de Ronaldo Porto bem vivo, exalando a vitalidade que só poderia emanar de quem, como ele, era o 40 Graus, como o chamavam carinhosamente.
Ronaldo se vai.
Ficamos nós, seus íntimos - inclusive os que verdadeiramente não o são -, chorando de saudades e boas lembranças.
São lágrimas que aliviam um pouco a nossa dor, mas também servem para afogar as gargalhadas tenebrosas e cavernosas do que insistem em achar que toda essa tragédia é causada apenas por uma gripezinha. E que chorar não passa de coisa de maricas.
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