segunda-feira, 19 de novembro de 2012
Excesso de exposição
Antes de tudo, usando as lentes propostas pelo ministro-relator Joaquim Barbosa pude entender melhor como é difícil julgar. Ouso dizer que Barbosa definiu muito claramente os delitos a que os réus deste interminável “mensalão” foram acusados. A seriedade e a reputação de Barbosa em nenhum momento foram arranhadas. Mesmo os que estão do outro lado, os amigos dos que estão sentados no banco dos réus do “mensalão”, reconhecem que não houve movimentação estranha e nem mercado de balcão de negócios.
Foi de fundamental importância a forma como se conduziu o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Carlos Ayres Britto, que após sete anos como ministro do STF, se aposentou pela compulsória, no domingo, 18, e dirigiu os trabalhos deste que foi, talvez, o maior julgamento da história do STF de maneira técnica e consistente. Foi alvo de muitas homenagens. Ao se despedir falando com a Imprensa, disse: “A toga gostou dos meus ombros”. O ministro abandona a toga sem esclarecer uma dúvida crucial entre os fãs dele: Britto é melhor juiz do que poeta ou é melhor poeta do que juiz?
Com certa assiduidade, assisti pela TV Justiça verdadeiras aulas magnas de todos os juízes togados, mas não há dúvida, o ministro decano Celso de Mello foi o mais diferenciado. Pela qualidade e análise, Mello nos brindou com seu notório saber jurídico diante desse imenso salão escuro e malcheiroso que se tornou a Ação Penal 470. Deu a entender que numa sociedade dos significados invertidos e pervertidos cabe às associações de cidadãos lutarem pela fiscalização infatigável dos poderes públicos e privados.
Ademais, tem aquela turminha que, digamos assim, decididos a não se decidirem, ficam tirando a fórceps conclusões precipitadas. Achando que se enganou quem esperava um STF mais tranquilo durante a fase de definição das penas dos condenados no chamado “mensalão”. Deu-se exatamente o oposto. Assim que os ministros retomaram o julgamento após uma parada de dez dias, os ânimos se acirraram. Não bastassem as costumeiras discussões entre o relator Barbosa e o revisor Ricardo Lewandowski, outros juízes resolveram entrar no sururu. Acham que além do desentendimento técnico, há outra razão para o aparente nervosismo dos ministros. Acreditam que estão incomodados com a proposta de Marcos Valério de “delação premiada”, com redução da pena em troca de hipotéticas revelações. Nada disso. Os entreveros, os bate-bocas com acaloradas trocas de acusações são perfeitamente normais. Faz parte da liberdade de expressão e do regime democrático.
Ações e interpretações realizadas fora de tempo e contexto são alguns dos principais motivos da insatisfação generalizada e desigualdade visíveis no mundo de hoje. Sobretudo aqueles que querem ver na própria sombra a silhueta fantasmagórica da perseguição. Os incomodados querem a qualquer custo alertar para o excesso de exposição da Corte. Do histrionismo de alguns magistrados, o foco da crítica é a transmissão pela televisão, das sessões de julgamento. Acham os magistrados preocupados com o visual, pelo exagero de certas gravatas coloridas, perucas bem tratadas e melenas brancas matizadas ou ocultadas pela tintura preta.
No mais, já se começa sentir falta do ministro Britto, do seu talento em promover a concórdia. Um jurista que com certeza vai ficar na memória e no respeito de todos os brasileiros. Ayres Britto já tem lugar garantido na história.
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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com
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