segunda-feira, 30 de maio de 2016

O Pará e os portos (parte I)


ISMAEL MORAES – advogado socioambiental

O Pará é o Estado brasileiro dotado da mais privilegiada costa fluvial-marítima para recebimento e escoamento de produção em razão da formidável quilometragem de enseadas, baías, taludes e penínsulas contendo centenas de refúgios naturais onde podem ser instalados portos para embarcações dos mais variados calados. Ou seja, entre o continente e o oceano existe a malha hidroviária natural, onde a navegação está abrigada das inconstâncias marítimas.
Mas os frutos dessa vocação não reverteram em quase nada em bens e em investimentos perenes ao Pará. Após a exploração desse potencial pelo empresário norte-americano Percival Farquhar, que possuiu por quase 40 anos a concessão dos serviços portuários por meio da empresa Port of Pará Co., em 1940 entrou no processo de mumificação que a estatização e as relações sindicais parasitárias causaram em todo o setor portuário. Hoje vem a ser a atual Companhia Docas do Pará.
A partir de 1993, com o início da modernização do setor, portos privados passaram a ser planejados, mas de novo, sem que os investidores trouxessem perspectivas de investimentos locais. Ao contrário, deixando passivos socioambientais gravíssimos. Exemplo disso são as atividades ilegais e criminosas da multinacional norte-americana Bunge Alimentos, que é titular de uma alça portuária de Miritituba em Itaituba até Vila do Conde em Barcarena, adquirida do atual Secretário de Estado de Transportes, Kleber Menezes, sem qualquer investimento para reduzir os impactos sociais e ambientais das suas operações. Até junho do ano passado, quando foi subjugada por ordem judicial liminar com multa diária milionária, a empresa ianque barbarizava as comunidades ribeirinhas no Furo do Arrozal.
O deputado federal Edmilson Rodrigues tornou-se, de crítico diário na tribuna da Câmara, no mais festivo anfitrião dessa empresa, tendo realizado um seminário em Barcarena para celebrar “os investimentos sociais” (?!?!) da Bunge Alimentos. Se não estivesse filmada e gravada a patacoada, eu não teria acreditado, porque tudo é uma simulação, porque nunca a empresa norte-americana investirá em Barcarena!
Na sessão do Tribunal de Justiça do dia 18 passado, o mais profícuo debatedor do Tribunal de Justiça, desembargador Milton Nobre, demonstrou desconhecer como estão as relações dessas exportadoras de grãos que estão ocupando os mais privilegiados espaços portuários no Pará. Exaltou os empregos e os investimentos que fazem aqui. Empregos? Investimentos? Se eu não tivesse assistido, não acreditaria se me contassem!
Além do passivo deixado (desgaste de estradas, prostituição infantil, danos ambientais, enfim) sem qualquer remediação, as empresas de exportação de grãos que utilizam a malha fluvial e possuem terminais portuários quase não geram empregos e quase nada pagam de tributação.
Mas parece que algumas autoridades do Estado do Pará começaram a despertar.  Na sua 5oª Sessão Ordinária, ocorrida na semana passada, o Conselho Estadual do Meio Ambiente acolheu por unanimidade o voto do secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico, Adnan Demachki, condicionando autorização de construção de porto pela empresa Odebrecht Transport a que ela apresente, em 180 dias, projeto de uma indústria que verticalize a produção de grãos no Pará, o que redundará em empregos e receitas tributárias diversas.

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