quarta-feira, 23 de setembro de 2015
Desejo antigo é realizado
No fim da eleição de 2014, o País acordou para as regiões de clivagens a que foi submetido. Esses níveis de clivagens, claro, não passaram despercebidos. São na realidade espaços de descontentamentos, humilhações e surpresas que apareceram em forma de frustrações. O governo achou que mais uma vez era o "dono da situação", não deu muita bola, seguiu sem fortalecer a mobilização de seu próprio grupo. Em política, você governa para quem te elegeu, ou seja, levando em conta as expectativas de quem te elegeu, pois são essas pessoas que te defenderão em contextos de tensão.
O governo agiu de modo mais amador possível, mentiu em demasia, o País entrou em derrocada política e econômica. Há de se reconhecer que existem momentos nos quais a inteligência animal da situação superou toda expectativa, demonstrando laivos de genialidade mefistofélica. Um desses momentos é exatamente o presente. O governo sempre pensa e tenta passar para a sociedade que estamos conspirando, tentando dar o golpe. Desta vez, o truque não funcionou, mostra o governo nas cordas tentando respirar. O desejo de impeachment cresceu, alimentado pela insatisfação popular e, atualmente, mostrando que todos os envolvidos na Operação Lava Jato não devem escapar das condenações.
Mas o espantalho do amedrontado governo são as CPIs que, trazem a reboque, rupturas muitas vezes traumáticas. As clivagens afastaram as interfaces do governo, a divisão do partido governista se constata com sua ala esquerda virando-lhe às costas, se desmobilizando. Obviamente, esse espaço foi um campo aberto para a oposição que, mobilizada pela desesperança, foi às ruas para fazer pressão. Detalhe: pela primeira vez na história tal pressão não teve contrapressão.
Agora, um desejo antigo da oposição é realizado. Os primeiros requerimentos apresentados à CPI do BNDES não deixam dúvidas sobre a estratégia da oposição. É óbvio, é ampliar cada vez mais a pressão sobre o Planalto. A situação não se conforma e sabe que o principal alvo, na verdade, é o ex-presidente Lula. A comissão foi instalada uma semana após o recesso parlamentar e como havia prometido antes o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, deputados petistas foram impedidos de ocupar a presidência e a relatoria da comissão. Lula é alvo de ao menos três pedidos de convocação para prestar depoimentos na CPI, apresentados pelos deputados Raul Jungmann (PPS), Cristiane Brasil (PTB) e Carlos Melles (DEM). Baseiam-se em procedimento investigatório contra o ex-presidente aberto pela Procuradoria da República no DF em julho. Por suposto tráfico de influência em favor da construtora Odebrecht.
Na prática, funciona assim: o procurador Valtan Furtado, responsável pelo caso, acolheu as suspeitas levantadas pela mídia, segundo a qual Lula atuou como lobista de empreiteiras brasileiras no exterior. Furtado pretendeu - segundo a situação - dar ainda mais munição à oposição ao solicitar cópia do documento da Lava Jato com referência a obras executadas fora do Brasil que tenham sido financiadas com recursos diretos ou indiretos do BNDES.
O deputado Jungmann apresentou ainda requerimento para convocar o filho de Lula, Fábio Luiz da Silva, e quebrar seus sigilos: fiscal, bancário e telefônico. Ele alega que a Gamecoop, empresa de Lulinha, foi beneficiada em um negócio suspeito com a Oi-Telemar, companhia com participação acionária do BNDES. Para completar o cerco, a oposição solicitou a convocação dos ex-ministros Fernando Pimentel, Antonio Palocci e Guido Mantega, além de Paulo Okamoto, presidente do Instituto Lula. Por ora, somente Luciano Coutinho, presidente do BNDES, vai depor.
Ao defender a CPI, em abril, o deputado Rubens Bueno, líder do PPS, sugeriu a investigação dos empréstimos internacionais concedidos pelo BNDES, a exemplo do financiamento do Porto Mariel, em Cuba. Há suspeita? Sim, porque atenderam a demanda das nove empreiteiras arroladas na Lava Jato.
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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com
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