Poucos eventos ocuparam tanto a mente dos brasileiros como a conspiração que levou ao suicídio do presidente Getúlio Vargas, que retrata um dos momentos mais sensíveis do nosso passado recente. Em um cenário de exacerbada turbulência política, o assassinato do repórter Nestor Moreira, do jornal "A Noite", acirrou dramaticamente o presidente Getúlio Vargas, que acabaria, meses depois, se matando. Esse golpe nos transporta ao Rio de Janeiro da década de 1950, aos subterrâneos de Copacabana, aos corredores do Palácio do Catete e a um sistema penal de uma cidade que ganhava ares de modernidade, mas que ainda tinha fortes laços com um passado de práticas retrógadas.
Nesse ambiente, impregnado de ressentimentos e paixões, personagens fascinantes como Carlos Lacerda, João Goulart, Luis Carlos Prestes, Samuel Wainer, Oswaldo Aranha, Tancredo Neves, o tenente-coronel Golbery do Couto e Silva e o presidente Getúlio Vargas digladiavam-se em uma disputa política que desembocaria na grande tragédia do mês de agosto.
A morte de Nestor Moreira e o atentado da Rua Tonelero continuavam sendo os principais assuntos dos jornais. Avançava 1954 e a novidade política de junho foi o pedido de impeachment
A "Tribuna da Imprensa" de 15 de junho usava uma retórica no melhor estilo macartista para pregar a queda do chefe da nação: "Decide-se na Câmara a Batalha do Impeachment - Vargas afronta a consciência política e jurídica - Ameaças subversivas - É o germe da desordem social".
Samuel Wainer, através da "Última Hora", reagia: "A conspiração da anarquia e do caos está em marcha acelerada. A nata da demagogia eleitoreira, no Congresso e fora dele, nos quartéis e na Imprensa, está desenfreada". Wainer enumerava, de modo irônico, os opositores de Vargas, cujas reações poderiam ser usadas pelos seus adversários para criar um ambiente à decretação do golpe.
Apesar do rebuliço criado, o pedido de impeachment
O que seria dos oposicionistas no dia em que não houvesse uma crise, um escândalo, um motivo de agitação? Falhou o golpe à custa do Memorial dos Coronéis? Então surgiu o caso Perón-Vargas. Também essa tentativa fracassou? Então veio à luz o impeachment
No mais, diante da gravidade do momento, quase não se falava mais no assunto. A lucidez e a razão eram substituídas por sensações, aromas e sentimentos que deixavam no ar as mais torpes paixões. Os meses de junho e julho de 1954 foram o prenúncio do fim da era Vargas.
-------------------------------------------------
SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário