SERGIO BARRA
Os descaminhos da política brasileira, de
enigmático desfecho, encontram análises díspares. Especialistas sustentam que
haveria uma luz no fim do túnel para o governo nesses tempos de crise. É, pode
ser. Descontados os que sabem perfeitamente que sofismam, sobram os otimistas e
os esquecidos a compartilhar dessa visão. Mas, é fato que, o elegante Palácio
da Justiça, projetado por Oscar Niemeyer para abrigar o Ministério da Justiça,
tradicionalmente uma das pastas mais importantes do governo federal, está se
transformando num castelo de areia, ou melhor, no mais vistoso ministério que
desapareceu e, no momento, vive o maior desprestígio político de sua longa
história.
O esgotamento do Ministério da Justiça já vinha
dando sinais de decadência e já vinha perdendo relevância nos últimos anos. E
mais se acentuou depois que o presidente Michel Temer criou, em fevereiro, o
Ministério Extraordinário da Segurança Pública. A nova pasta levou a Polícia
Federal (PF), a Polícia Rodoviária Federal, a Secretaria Nacional de Segurança
Pública e o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), que eram a antiga
espinha dorsal do antigo ministério. É bom lembrar que, a PF forma, com a Receita
Federal e o Banco Central, a Santíssima Trindade dos órgãos do Estado que está
na base do exercício do poder pelo Executivo federal.
Criado no Império de Dom Pedro I, em 3 de julho
de 1822, com o nome de Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça. De lá para
cá se tornou uma área central da administração, não só do imperador, mas de
todos os presidentes desde o nascimento da República. É bom destacar que, pelo
ministério, passaram personagens relevantes como Ruy Barbosa, Oswaldo Aranha e
Tancredo Neves. Na história recente, a pasta foi chefiada por Saulo Ramos,
Paulo Brossard, Oscar Dias Corrêa, Nelson Jobim e Márcio Thomaz Bastos,
personagens que tiveram papel fundamental na definição dos rumos políticos dos
governos a que estavam vinculados e, por tabela, no destino do país.
O enfraquecimento do ministério começou com a
quebra da tradição que, pela importância, o ministro da Justiça deve ter
cadeira cativa ao lado direito do presidente da República em reuniões
ministeriais. O costume só foi rompido quando, no início do primeiro mandato do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o então Chefe da Casa Civil, José
Dirceu – que gostava de mandar e aparecer –, exigiu o lugar, para demarcar
poder. O cargo, não resta a menor dúvida, sempre foi muito cobiçado porque
cabia ao titular da pasta duas tarefas nobres: a articulação política com o
Congresso Nacional e, de quebra, a interlocução do governo federal com os
tribunais. Ou seja, o ministro da Justiça podia discutir as grandes questões
nacionais com o privilégio de, aparentemente, estar acima de disputas menores.
O abandono político a que foi submetido o
Ministério da Justiça vem se agravando dia a dia. Em grande parte, culpa do
próprio ministro Torquato Jardim, que tomou posse em maio passado, num momento
em que o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot se preparava para fazer
a primeira denúncia contra Michel Temer. Em seguida, criticou as investigações
contra Temer e, deixou claro, que poderia trocar o diretor da PF. Disse também
que o seu conhecimento de segurança pública se resumia ao relato de uma tia
vítima de um assalto. Foi a senha para que, semanas depois, Raul Jungmann
entrasse em cena para falar sobre combate à violência no Rio de Janeiro e sobre um plano de segurança pública para o país – e ganhasse,
no colo, o Ministério da Segurança Pública –, até então seara exclusiva do
titular da Justiça.
Na verdade, o Ministério da Justiça está
esvaziado porque deixou de ser, na prática, um ministério de Estado e se
tornou, em seu sentido decadente, um ministério político de governo.
---------------------------------------------
SERGIO BARRA é médico e professor
Nenhum comentário:
Postar um comentário