quinta-feira, 13 de junho de 2013

"Política social": a voz do dono e o dono da voz

LEOPOLDO VIEIRA

O Instituto Fernando Henrique Cardoso publicou, dia 15, artigo de Xico Graziano que visa pautar, neste sábado, a convenção nacional do PSDB com a linha de Aécio Neves de valorizar a Era FHC. Graziano, ex-chefe de gabinete da Presidência, busca resgatar uma suposta agenda liderada pelos tucanos entre 1995 e 2002, a qual o PT haveria apenas desenvolvido e se beneficiado.

Em síntese, trata-se de tentar uma narrativa de que Lula e Dilma colhem frutos de leis do quadrante histórico que enterraria a Era Vargas. Dessa forma, Graziano conclui que o Bolsa Família foi a união do Bolsa Escola, Bolsa Família, Auxílio Gás e PETI. Foi com esta prosa que Fernando Henrique acusou a presidenta Dilma de ser "ingrata" por não considerar o que acredita que é sua "herança bendita".


Nada mais inadequado.

O Bolsa-Escola nunca foi criação do ex-ministro Paulo Renato de Souza. Embora tenha sido implementado em âmbito federal pelo PSDB, ele era bem mais limitado do que o que o PT criou e implantou em Brasília, Belém, Porto Alegre, Santo André, entre outros exemplos. Nestes locais, a família era financiada com um Salário-Mínimo, renda básica na época, já que extremamente desvalorizado. Era um melhorador das condições sociaisdos trabalhadores e não poderia ter sido diferente, já que o fluxo econômico do país era outro e o BE era apenas uma mola a rodar contra a engrenagem

Sobre os programas em si e a polêmica em torno de já haver ou não cadastro, a verdade é que a unificação de vários programas foi feita apenas em 2002, véspera do fim da Era FHC, e tinha um orçamento de 3 bilhões que sequer foram 100% executado, buscando contemplar apenas 1,7 milhão de pessoas [1]. Sem falar que a lei mesma deles ocorreu entre 2001, há dois anos do final do segundo mandato (Ver aqui ).

Eram programas focais, para tentar compensar os efeitos da própria política econômica neoliberal e embalar a candidatura de José Serra à presidente, tentando dar um rosto mais social a quem já era conhecido mais pelo desemprego do que pela estabilidade.

Contudo, o contraponto à retórica do PSDB nos termos acima feitos converge para uma visão de substrato também neoliberal, lançando os parâmetros do baçanço da década para o nível da "competência administrativa" ou "sorte" em relação à conjuntura econômica. Em outra palavras, significa jogar no "estádio" deles.

A mesma direita que bancou 1964 e, depois, 1989, 1994 e 1998 não tem mais vergonha de voltar a falar em privatização, aumento de juros e desemprego para conter a inflação, flexibilização de direitos, desnacionalização da economia, apostando na falta de memória dos jovens e que a nova condição social da classe trabalhadora possui apenas um viés consumista.

Apostam um pouco no espírito da história contada por Slavoj Zizek sobre a viagem de John Galbraith à URSS, no final da década de 1950: "ele escreveu para seu amigo anticomunista Sidney Hook: 'Não se preocupe, não me deixarei seduzir pelos soviéticos voltando para casa e dizendo que eles têm socialismo!'. Hook respondeu imediatamente: 'Mas é isso que me preocupa – que você volte dizendo que a URSS não é socialista!'". E arrebata: "O que Hook temia era a defesa ingênua da pureza do conceito: se as coisas derem errado com a construção de uma sociedade socialista, isso não invalida a ideia em si, mas significa apenas que não a executamos apropriadamente".

O debate de fundo é que a expansão dos direitos se deu através da institucionalização de uma série de políticas que buscam a universalização dos serviços públicos. Programas como o Bolsa-Família e o Pronatec, por exemplo, são para generalizar o acesso universal aos direitos sociais.

Esta é uma questão que envolve até mesmo o debate recente em torno da carteirinha de meia-entrada no bojo da votação, pelo Senado Federal, de mais um novo arcabouço de direitos, no caso o Estatuto dos jovens [2].

O Pronatec, assim como o Bolsa-Família, não é um fim em si mesmo, mas ponte para acesso rápido da população mais pobre e vulnerável ao trabalho, formalização de seus direitos e melhora da renda, para poder se beneficiar da mobilidade social em vigor. Como, aliás, precursionava o antigo programa de governo do PT de 2002, ainda coordenado pelo saudoso Celso Daniel.

O Pronatec não substitui a expansão pública dos Ifets, dos cursos tecnológicos superiores ou da educação superior em cursos de alta tecnologia. Já o Bolsa-Família funcionou associado à geração de empregos na ordem dos 19 milhões, para o que o próprio programa contribuiu ao movimentar a pequena economia local a partir de uma nova fonte de renda. Para fortalecer o "empurrãozinho" dado pelo Bolsa, teve aumento do financiamento da nova educação básica via Fundeb, a revolução do PAC na infraestrutura social (UPAs, UBSs, creches pré-escola), etc.

Pensar diferente disso é como desejar que o programa Brasil Sorridente se eternize, ao invés de ser extinto junto com a incidência da cárie na população brasileira.

Dessa forma, o confronto programático com a oposição tem seu buraco mais embaixo, como sabem, no mínimo, todos que se emocionam ao ver Roberto Azevedo conquistando, pelos emergentes, o comando da OMC, porque nasceram para a militância se engajando na resistência ao neoliberalismo, nas marchas contra a privatização da Vale, Telebrás e Petrobrás;, nas passeatas dos servidores públicos contra o corte de investimentos sociais e o arrocho. Ao mesmo tempo na luta e na contradição do governar na resistência da década de 90. Aliás, o exemplo da OMC contempla bem a diferença de narrativas quanto aos programas sociais e seu papel no rumo do projeto nacional. Embora sem esta clareza, por se tratar de um órgão discreto em termos de articulação política fora das coxias, o brasileiro ganhou a partir de uma coalizão internacional que busca um novo modelo global de desenvolvimento, com mais estado e planejamento para o progresso inclusivo. O mexicano batido era sustentado por EUA e UE, que não vêem contradições entre um Bolsa-Família e uma economia livre-cambista. O próprio México, que foi o Cavalo-de-Troia do Norte contra o Sul, por justamente ser do Sul, acha que tem sua versão do PBF.


Em tempo: A nova geração de jovens do Brasil, que não lembra dos tempos de Fernando Henrique, têm duas leituras obrigatórias: A Privataria Tucana, do Amaury; e A Outra História do Mensalão, do Paulo Moreira Leite. Além disso, vale assistir ao O Dia que Durou 21 Anos, filme-documentário lançado sobre a participação dos EUA no golpe de 64.

E depois? Esticar um pouco a noite com uma atividade cultural para regar a pintura de umas faixas e bandeiras para um ato político. Restam ainda vários governos neoliberais a rodar a engrenagem da mudança geral do país para trás a serem questionados.

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LEOPOLDO VIEIRA é  assessor especial da Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e coordenador do Monitoramento Participativo do PPA.

3 comentários:

Anônimo disse...

...e tinha um orçamento de 3 bilhões que sequer foram 100% executado, buscando contemplar apenas 1,7 milhão de pessoas [1]. Sem falar que a lei mesma deles ocorreu entre 2001, há dois anos do final do segundo mandato...
Três linhas, quatro erros de gramática e um de redação. Sem contar a incoerência do discurso.
E a vaidade é tanta que ele nem hesita em publicar...
Volte pra escola, mano!

Anônimo disse...

"assessor especial da Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e coordenador do Monitoramento Participativo do PPA."
Que boquinha maravilhosa, hein aspone-cumpanheru?!
E nós pagando a conta...
Assim, qualquer um derrama elogios ao "paraíso" cumpanheru.
Fica a minha indignação.

Nativista disse...

Caro Leopoldo, excelente reflexão.

É muito importante para o futuro de todas as gerações termos em mãos a história passada a limpo. Muitos crimes lesa-pátria foram cometidos recentemente e, temo que ainda estejam acontecendo nos bastidores, que deste regime "democrático" (entre aspas!) acaba permitindo que aconteça. Todos devem ser informados de como foi o processo de privatização (doação) da Cia Vale do Rio Doce, hoje "Vale", assim como da Embratel, da Telebras (no momento da virada tecnológica com a chegada dos celulares, mais receitas e menos custos), fatiamentos da Eletrobras e Petrobras...
Embora seja fundamental estas lembranças, há também a necessidade de se contruir uma pauta olhando para frente. Que seja construído um Plano Nacional de Desenvolvimento de longo prazo, com a participação de todos, de forma apartidária e com a presença da sociedade civil. Construí-lo de olho na situação geopolítica de hoje e os diversos cenários de médio e longo prazos. Também há que se garantir que tal plano seja seguido por qualquer grupo que venha a assumir o governo no futuro, afinal de contas, o país e o futuro de seu povo não pode ficar refém do jogo político que ocorre de 4 em 4 anos, mas que já é sabotado de 2 em 2 anos quando começam as campanhas políticas.
Por um Brasil Gigante e fulgurante, para que o país do futuro esteja presente já nas vidas dos brasileiros de hoje e de amanhã.

Saudações!

Brasil Acima de Tudo!