quinta-feira, 21 de maio de 2009

Abrir a caixa-preta da grilagem no Pará


As grandes nações do mundo, para chegarem ao desenvolvimento, tiveram que realizar a reforma agrária, processo quase sempre ocorrido no interior de revoluções, guerras civis e pressão da luta social. Esse fato aconteceu há mais de 100 anos nos Estados Unidos, França, Canadá entre muitos.
O Brasil chegou ao século XXI como um país industrializado e democrático e, embora sofrendo as privatizações e o agravamento das condições sociais durante o período neoliberal de Collor e FHC, dá passos firmes no sentido de se tornar uma potência com justiça social: crescimento econômico com distribuição de renda, rede de proteção social, elevação de parcela considerável dos trabalhadores a níveis de classe média, novas parcerias comerciais, estancamento do endividamento externo, financiador do desenvolvimento dos irmãos latino-americanos e africanos, afirmação soberana no mundo pautando a agenda mundial para combater a pobreza, consolidação da nossa democracia com experiências de participação popular, a entrada em cena das classes populares e o investimento na geração de jovens para criar um novo padrão societário no futuro próximo. O Estado com suas funções redefinidas por uma direção de centro-esquerda possibilitou isso.
Hoje, a Nação enfrentará a agenda da reforma política, para que tenhamos uma representação mais próxima da soberania popular e liberta dos constrangimentos do poder econômico, que já tramita no Congresso e esquenta os humores da sociedade. Também enfrentará, com o advento da TV Pública e a Conferência Nacional de Comunicação, a necessária democratização dos meios de comunicação.
Porém, não haverá uma nação justa e desenvolvida sem realizarmos a reforma agrária, cuja pendência histórica gera a escassez de alimentos aos mais pobres, a miséria e o trabalho degradante - de bóia-fria ao análogo ao escravo, no campo - o êxodo rural que produz violência e exploração sexual de crianças, jovens e adultos nos centros urbanos, além das milhares de mortes em conflitos fundiários. Ouso afirmar que nossa condição de "Fíndia" - Finlândia para os ricos e Índia para os pobres - tem gigante participação de não havermos resolvido nossa questão agrária.
O Pará, como todos sabemos, está no cerne desta celeuma. A violência no campo já nos tragou Dorothy Stang, Paulo Fonteles, João Batista. Já nos custou o massacre de Eldorado dos Carajás e a demagogia da presidente da federação do latifúndio, senadora Kátia Abreu, ter pedido intervenção federal em nossas terras a serviço do grileiro Daniel Dantas após um confronto ente seus paramilitares e trabalhadores rurais em 17 de abril deste ano, corroborando com a senadora uma desmoralizada manipulação midiática.
Se sonhamos com um Pará de paz e igualdade, precisamos começar a enfrentar a questão agrária aqui, no seu foco mais agressivo: o produto social, econômico e político da grilagem de terras.
Entre os anos de 2005 e 2006, a Corregedoria de Justiça das Comarcas do Interior do Tribunal de Justiça do Estado do Pará iniciou uma varredura em dezenas de cartórios imobiliários, fazendo um levantamento do tamanho da grilagem de terras paraenses, então computadas pelo MDA como algo em torno de 30 milhões de hectares.
Pela Constituição, o Congresso Nacional teria que ser consultado para o registro de áreas maiores do que 2.500 hectares. Até hoje, o Congresso concedeu 8 autorizações para registro de propriedades no Pará maiores do que o limite constitucional, mas os cartórios registram mais de 6 mil títulos de imóveis entre 2.500 e mais de 1 milhão de hectares.
Nada menos que 5 mil registros superam o limite estabelecido pela nossa Carta Magna, que é de 2.500 hectares, sem que tenha havido autorização do Congresso Nacional, como, repito, estabelece a Constituição Federal para estes casos. Em grande parte destes casos não estão disponíveis dados do título de origem. E pior: há registros de títulos originários da emissão pelo governo do Estado que ultrapassam o limite constitucional sem que tenha havido as suas respectivas aprovações pelo parlamento.
Alguns municípios têm registros bloqueados com área muito superior à da sua superfície territorial. Boa parte desta documentação é baseada em títulos de posse e provisórios, cessão de direitos, arrendamento ou escrituras de compra e venda. A mais vil ilegalidade que engendra tanta desgraça social e econômica, além de erguer um poder político carcomido, viciado e distante da vontade e necessidade popular e intrínseco aos interesses dessa rede que não temos dúvida em classificar de mafiosa.
Os 6.102 títulos de terra registrados nos cartórios imobiliários estaduais que possuem irregularidades somam 110 milhões de hectares, equivalentes ao próprio Estado do Pará em áreas griladas, ou seja, usurpadas do Poder Público. O Pará tem 124 milhões de hectares. Não é à toa que um jurista que não pode ser acusado de ser de esquerda ou simpatizante de trabalhadores rurais, mas que foi um dos mais notáveis paraenses, Otávio Mendonça, afirmou certa vez: “Infelizmente, e com louváveis exceções, registrou-se tudo quanto se quis nos cartórios da Amazônia".

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“Se sonhamos com um Pará de paz e igualdade, precisamos começar a enfrentar a questão agrária aqui, no seu foco mais agressivo: o produto social, econômico e político da grilagem de terras.”
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Mas, essa atividade criminosa, essa ilegalidade ostensiva não encontra limites. Ao contrário do que muitos pensam não se trata de ignorantes senhores de chapelão de palha e espingarda na mão. Estudos do Greenpeace, que combate os ataques ao meio ambiente em todo o planeta, revelam que 7 corretoras oferecem na Internet 11 milhões de hectares de floresta na Região Norte, estando o Pará entre eles, evidentemente, pela "bagatela" de 1 bilhão de reais. Criaram a "cybergrilagem"! É um negócio que envolve grandes investidores, banqueiros, industriais de todos os cantos da Terra, marcadamente seus parceiros comerciais no Brasil e gente dos países do G-7.
Com intuito de estancar esse crime contra o povo, o meio ambiente e a economia do Pará, o Iterpa, nos anos 90, encaminhou mais de 40 ações que solicitavam o cancelamento dos títulos irregulares, mas esbarrou em hermenêuticas jurídicas do tipo: "a pretensão de seu reconhecimento na via administrativa, com o seu conseqüente cancelamento, não é possível", quando se sabe que diante da dimensão da grilagem de terras paraenses não é possível equacioná-la pelos procedimentos corriqueiros, como se fosse o julgamento de um tribunal de pequenas causas.
O Pará deu passos firmes, sob a liderança da governadora Ana Júlia e do PT, ao construir um cronograma de reintegrações de posse. O Estado não serve mais para proteger os fortes e punir os fracos, não se sujeita mais a ser a gerência de interesses privados em detrimento do interesse público e nem mais atentar contra sua economia, natureza e povo por causa de uma lumpemburguesia sem raízes e projetos de desenvolvimento. Por isso, saímos de campeões de violência no campo para campeões em redução desta violência.
Mas, a situação das terras griladas, a escabrosidade dos fatos conhecidos e a tensão política aberta pela Senadora Kária Abreu coloca na ordem do dia a necessidade de abrirmos a caixa-preta da grilagem de terras no Pará. Não podemos mais admitir suas consequências sociais nefastas, nem mais sermos coniventes com um capitalismo permeado pela atividade criminosa. O Pará tem grande contribuição a dar para o Brasil se tornar uma superpotência, desde que enfrente o latifúndio e desmonte essa estrutura fundiária que depõe contra nosso progresso, aquele possível apenas se for sustentável.
Precisamos seguir o exemplo do Amazonas, onde a Corregedoria do TJE cancelou um total de 48.478.357,558 hectares de terras, sendo estes foram devolvidos ao patrimônio fundiário federal, utilizando o disposto no Art. l° da Lei Federal n° 6.739, de 05.12.79. Que se respeite a ampla defesa e o contraditório, mas que não se aguarde "zilhões" de anos para se julgar "caso a caso", pois é um problema estrutural.
Por isso, para subsidiar essa luta e deixar a classe política se permear do clamor da opinião pública, defendo a instalação imediata da CPI da Grilagem pela Assembléia Legislativa, para que construamos mais que uma Terra de Direitos, mas nossa contribuição para a redução das desigualdades regionais brasileiras, para o sonho de um Brasil que cresça com justiça social e a nossa passagem para o time das fortes economias brasileiras.

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CARLOS BORDALO é deputado estadual (PT-PA) e vice-presidente do estadual do partido

2 comentários:

Anônimo disse...

Um bom começo para a reforma agraria que o Dep Bordalo quer, é acabar com a enormem corrupção no Incra, que tem as digitais de cabeças coroadas do PT do Pará e que tem contribuido com a eleição deles.

Anônimo disse...

´ Ora pois, de falácias e sofismas esse deputado parace que é bom ,mas e do resto será ?