sexta-feira, 19 de junho de 2009

Aumento de despesa sob a ótica do STF

WALMIR MOURA BRELAZ

"Passaram-se muitas gerações antes de supor-se tivesse o parlamento algo a ver com as leis, senão dar-lhes assentimento ou retirá-lo quando novas leis lhe eram submetidas pelo rei".
Com essa revelação, o constitucionalista José Afonso da Silva, amparado na afirmação de Woodrow Wilson, nos mostra que, ao contrário do que possa parecer, iniciativa de leis pelo Legislativo não é algo original deste Poder. Trata-se de uma conquista histórica.
No Brasil, entretanto, a possibilidade de iniciativa parlamentar vigora desde a primeira, 1924, até a atual Constituição Federal de 1988, embora com razoáveis alterações. E assim, chegou-se ao reconhecimento formal de iniciativa tanto do Executivo como do Legislativo, nos termos do art. 61 da Constituição vigente.
Ocorre que o exercício dessa prerrogativa parlamentar esbarra em algumas condições, que não raras vezes são encaradas como obstáculos jurídicos, impeditivos da iniciativa de leis, dos quais destacamos a criação de despesas que tais normas podem ocasionar ao Poder Executivo. Ou seja, o parlamentar não pode apresentar proposição que crie despesa ao Executivo, sob pena de ter declarada a sua inconstitucionalidade.
Essa concepção tem, em várias ocasiões, "engessado" a iniciativa parlamentar, servindo de fundamento para vetos do Executivo a projetos do Legislativo, ou considerados inconstitucionais na apreciação no próprio Parlamento.
Porém, é uma interpretação equivocada, que ignora os estudos doutrinários e decisões judiciais, inclusive do Supremo Tribunal Federal, que reiteradamente tem decidido sobre a questão, afastando a interpretação incondicional de que qualquer proposição que ocasione despesa ao Executivo reveste-se de inconstitucionalidade. Tendência que se observa em recente julgamento de ação judicial: "Não procede a alegação de que qualquer projeto de lei que crie despesa só poderá ser proposto pelo chefe do Executivo. As hipóteses de limitação de iniciativa parlamentar estão previstas, em numerus clausus, no art. 61 da Constituição do Brasil - matérias relativas ao funcionamento da Administração Pública, notadamente no que se refere a servidores e órgãos do Poder Executivo. Não se pode ampliar aquele rol, para abranger toda e qualquer situação que crie despesa para o Estado-membro, em especial quando a lei prospere em benefício da coletividade" (ADIN 3394-8. Min. Eros Graus).

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“Não procede a alegação de que qualquer projeto de lei que crie despesa só poderá ser proposto pelo chefe do Executivo”
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Esta decisão faz menção a manifestações, no mesmo sentido, de outros ministros do STF: "a Assembléia pode até criar despesa num projeto que não seja de iniciativa exclusive do Poder Executivo; ela não pode é alterar o orçamento. (...) A síntese da inicial é esta: não pode haver aumento de despesa em projeto do Poder Legislativo. Na Constituição não está escrito isso. Não pode haver aumento de despesa por emenda a projeto do Poder Executivo" (ADI 2072/MC. Min. Octávio Gallotti).
O sentido da incidência da despesa deve ser analisado diante do caso concreto. Há situações de fácil identificação, como em projeto que visa criar um novo órgão na Administração Pública. Entretanto, não se pode afirmar que haverá aumento de despesa em projeto que obriga o Executivo a divulgar, em cartaz, campanha contra o fumo, ou exigir ao Estado exames gratuitos de DNA em pessoas pobres, já que "a falta de previsão orçamentária, conforme precedente do STF (RTJ 137/1067), é obstáculo ao cumprimento da Lei no mesmo exercício, mas, não, no subseqüente". (ADI 1.243-MC. Min. Sydney Sanches).
São decisões que valorizam e defendem a iniciativa parlamentar: "Se se entender que qualquer dispositivo que interfira no orçamento fere a iniciativa exclusiva do chefe do Executivo para lei orçamentária, não será possível legislar, sem essa iniciativa, a respeito de qualquer matéria - assim, por exemplo, pensão especial, doação ou remissão - que tenha reflexo no orçamento" (ADI 2072/MC. Min. Octávio Gallotti).
Com base em estudos de Carlos Maximiliano (Hermenêutica da Constituição), o Tribunal de Justiça de Rondônia, resume uma tendência do STF - embora sem unanimidade - sobre o papel a ser adotado pelos magistrados - e não só por eles - quando envolvidos na questão de interpretação de inconstitucionalidade de leis. Deve-se seguir duas regras: "A primeira é que não sendo evidente a inconstitucionalidade, havendo dúvida ou a possibilidade de razoavelmente se considerar a norma como válida, deve o órgão competente abster-se da declaração de inconstitucionalidade; e a segunda, que havendo alguma interpretação possível que permita afirmar-se a compatibilidade da norma com a Constituição, em meio a outras que carreavam para ela um juízo de invalidade, deve o interprete optar pela interpretação legitimadora, mantendo o preceito em vigor".
A conclusão que se ressalta é a possibilidade do Legislativo legislar, principalmente quando a lei objetiva beneficiar o bem estar da comunidade, mesmo que tudo nos possa parecer tão redundante.

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WALMIR MOURA BRELAZ é advogado

Um comentário:

Anônimo disse...

Nossos parlamentares, infelizmente, não discutem nesse nível.