sexta-feira, 6 de junho de 2008

''Você não tem que se meter nisso'', disse Dilma

No ESTADO DE S.PAULO:

A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, operou para silenciar resistências no governo à venda da VarigLog para o fundo americano Matlin Patterson e três sócios brasileiros, há dois anos. Acusada pela ex-diretora da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) Denise Abreu de pressionar o órgão a tomar decisões favoráveis ao negócio, Dilma também agiu em outros setores da administração federal, segundo pessoas que acompanharam o processo de transferência de ações.
Na manhã de 25 de junho de 2006, dois dias depois de a Anac aprovar a transferência do controle acionário da VarigLog para a Volo do Brasil, em sociedade com o fundo americano, a ministra-chefe da Casa Civil telefonou para o então presidente da Infraero, brigadeiro José Carlos Pereira, reclamando de declarações contra o posicionamento "impatriótico" da agência, termo usado por ele em entrevistas publicadas naquele dia. "Você não tem que se meter nisso, você exorbitou na sua função", disse Dilma Rousseff ao brigadeiro, em tom exaltado, relataram fontes do governo. "A Infraero não deve se envolver nas questões da Anac."
Dilma Rousseff reclamava especialmente de uma entrevista dada por José Carlos Pereira em Brasília, em que ele avaliou que a transferência de ações da VarigLog para a Volo do Brasil desrespeitava o Código Brasileiro de Aeronáutica, que limita a 20% o capital estrangeiro nas companhias aéreas. "É um risco para a aviação civil colocar capital estrangeiro desse jeito; vai permitir a competição predatória", disse o então presidente da Infraero.
A assessoria de imprensa da Casa Civil foi procurada na tarde de ontem para comentar o assunto. A ministra Dilma Rousseff, segundo assessores, mantém a linha de não comentar questões que, na avaliação dela, não dizem respeito à Casa Civil. Em entrevista coletiva anteontem no Palácio do Planalto, Dilma Rousseff disse que a responsabilidade pela venda da VarigLog foi da Anac e da Justiça.
Procurado ontem pela reportagem, José Carlos Pereira confirmou ter recebido, à época, o telefonema da ministra-chefe da Casa Civil. Ele, porém, não quis dar detalhes da conversa. Em entrevistas na ocasião, o brigadeiro falou de "forte pressão" sofrida pela Anac para permitir a venda da empresa aérea. "O Código Brasileiro de Aeronáutica é muito claro, e a lei vale para todo mundo. Como cidadão, me preocupo", disse na época.
Na época da negociação, havia suspeita de que os sócios brasileiros da empresa que comprava a Variglog eram "laranjas". A Anac permitiu a venda da empresa após um parecer do então procurador-geral do órgão, João Ilídio Lima Filho, que considerou desnecessária uma análise da declaração do Imposto de Renda de um dos sócios, o empresário Marco Antonio Audi, como exigia a Superintendência de Serviços Aéreos (SSA) da Anac.
No parecer 13/2006, Lima Filho argumenta que o respeito ao limite de participação de capital estrangeiro estava garantido nos documentos apresentados e não era o caso de avaliar a situação de uma pessoa física na Receita Federal.
O dinheiro para a compra da VarigLog, segundo o parecer do então procurador-geral da Anac, veio dos Estados Unidos em procedimento que respeitava a legislação. Ele nega ter sido pressionado por Dilma Rousseff. "Agi estritamente dentro dos autos", disse Lima Filho. "Não havia comprometimento dos 20% (do capital estrangeiro); tecnicamente a operação estava correta."

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