O custo da prática da criminalidade no Brasil é baixo, o retorno é alto. Há um evidente desequilíbrio entre incentivos e punições. O caldo de cultura da violência permanece em ebulição.
Providências são sempre bem-vindas, ainda que tardias. Não dispensam, porém, algumas observações a respeito de um assunto com o tamanho de escândalo de proporções gigantescas. Por exemplo, a mais óbvia: os crimes bárbaros que vêem acontecendo em nosso País.
O cidadão anda inseguro e as autoridades não nos asseguram o direito de ir-e-vir. Estamos a todo momento com medo, sejam eles reais ou imaginários. Somos assaltados na parada do ônibus, na farmácia, posto de gasolina, banco, em reunião social, na rua, entrando ou saindo do carro e até chegando em nossa residência.
Já estamos perdendo a capacidade em relação ao universo da criminalidade. O estudo da criminalidade, da exclusão social, dos sistemas de poder e, por extensão, da intolerância oferece novas possibilidades para compreender melhor o relacionamento interpessoal e, por continuidade, a sociedade em que vivemos.
Esse raciocínio acima nos serve para exemplificar o que ocorreu recentemente no Rio de Janeiro, quando três rapazes do morro da Providência foram oferecidos por um tenente como um "presentinho" aos traficantes do rival Morro da Mineira, que depois os executaram como "inimigos". Agora, o que se passa pela mente das autoridades, quando os próprios militares são criminosos?
A imagem que nos passa nesse momento acerca do perfil desses militares é o da intolerância. E quando se sabe que uma determinada quantidade deles não tem a sanidade que deveriam ter ao serem engajados. Pois apresentam valores frágeis e transpõem uma barreira ética que gente comum não ultrapassa. Por isso, matam e torturam.
Quatro dias após o assassinato, a Justiça manda o Exército sair do morro da Providência, e os militares são vaiados pela comunidade enlutada e revoltada. Notícia veiculada pelos jornais diz que a juíza Regina Coeli Medeiros de Carvalho determina que a Força Nacional de Segurança substitua o Exército. Mas o Exército bateu o pé e até o momento não tinha se retirado. É evidente que se revelam uma frouxidão moral e um abuso funcional de tantas autoridades em diversos escalões.
Agora, na terça-feira passada, 17 de junho, dentro de um estabelecimento de ensino, uma Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio, localizada no bairro de Val-de-Cães, em Belém, uma jovem de 15 anos foi brutalmente assassinada por uma colega de 18 anos com duas facadas, dentro da sala de aula. Segundo informações das próprias colegas, elas já vinham discutindo por motivos banais. Um alisante de cabelo teria sido o estopim de mais uma briga que terminou em tragédia. Há informações que foram e precisam ser apuradas, de que a homicida já teve passagens pela polícia quando era menor de idade.
Em depoimento à polícia, a estudante disse que levou a faca escondida na cintura para matar a colega. O que nos leva a racionar que tudo fora premeditado. A adolescente homicida diz que matou "movida pelo ódio", mas fez um mea-culpa dizendo estar arrependida. Apesar do fato inusitado, alunos e funcionários aproveitaram para fazer denúncias. Uma estudante afirma que a escola tem muitos alunos envolvidos em confusões e que todos os dias há enfrentamento com gangues que não podem se encontrar. É fácil imaginar como deve estar o ambiente dentro desta escola.
A pergunta que se faz é: como funciona a cabeça de uma adolescente que mata por motivo banal? Será que há ausência de sentimento de culpa, pena ou remorso? Pouca aversão ao risco? Baixa visibilidade de futuro? Aliados, os três fatores compõem a personalidade dos chamados psicopatas. São pessoas com comportamento anti-social e, por isso, capazes de extrema violência e frieza.
Depois da casa arrombada, é difícil encontrar um adjetivo para descrever o sentimento que se apoderou das populações do Rio de Janeiro e de Belém, um início de semana para sair da lembrança. O povo sofre as conseqüências de um Estado que falha miseravelmente no cumprimento de sua função primordial: garantir a segurança dos cidadãos. O custo da prática da criminalidade no Brasil é baixo, o retorno é alto. Há um evidente desequilíbrio entre incentivos e punições. O caldo de cultura da violência permanece em ebulição.
Sergio Barra é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com
O cidadão anda inseguro e as autoridades não nos asseguram o direito de ir-e-vir. Estamos a todo momento com medo, sejam eles reais ou imaginários. Somos assaltados na parada do ônibus, na farmácia, posto de gasolina, banco, em reunião social, na rua, entrando ou saindo do carro e até chegando em nossa residência.
Já estamos perdendo a capacidade em relação ao universo da criminalidade. O estudo da criminalidade, da exclusão social, dos sistemas de poder e, por extensão, da intolerância oferece novas possibilidades para compreender melhor o relacionamento interpessoal e, por continuidade, a sociedade em que vivemos.
Esse raciocínio acima nos serve para exemplificar o que ocorreu recentemente no Rio de Janeiro, quando três rapazes do morro da Providência foram oferecidos por um tenente como um "presentinho" aos traficantes do rival Morro da Mineira, que depois os executaram como "inimigos". Agora, o que se passa pela mente das autoridades, quando os próprios militares são criminosos?
A imagem que nos passa nesse momento acerca do perfil desses militares é o da intolerância. E quando se sabe que uma determinada quantidade deles não tem a sanidade que deveriam ter ao serem engajados. Pois apresentam valores frágeis e transpõem uma barreira ética que gente comum não ultrapassa. Por isso, matam e torturam.
Quatro dias após o assassinato, a Justiça manda o Exército sair do morro da Providência, e os militares são vaiados pela comunidade enlutada e revoltada. Notícia veiculada pelos jornais diz que a juíza Regina Coeli Medeiros de Carvalho determina que a Força Nacional de Segurança substitua o Exército. Mas o Exército bateu o pé e até o momento não tinha se retirado. É evidente que se revelam uma frouxidão moral e um abuso funcional de tantas autoridades em diversos escalões.
Agora, na terça-feira passada, 17 de junho, dentro de um estabelecimento de ensino, uma Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio, localizada no bairro de Val-de-Cães, em Belém, uma jovem de 15 anos foi brutalmente assassinada por uma colega de 18 anos com duas facadas, dentro da sala de aula. Segundo informações das próprias colegas, elas já vinham discutindo por motivos banais. Um alisante de cabelo teria sido o estopim de mais uma briga que terminou em tragédia. Há informações que foram e precisam ser apuradas, de que a homicida já teve passagens pela polícia quando era menor de idade.
Em depoimento à polícia, a estudante disse que levou a faca escondida na cintura para matar a colega. O que nos leva a racionar que tudo fora premeditado. A adolescente homicida diz que matou "movida pelo ódio", mas fez um mea-culpa dizendo estar arrependida. Apesar do fato inusitado, alunos e funcionários aproveitaram para fazer denúncias. Uma estudante afirma que a escola tem muitos alunos envolvidos em confusões e que todos os dias há enfrentamento com gangues que não podem se encontrar. É fácil imaginar como deve estar o ambiente dentro desta escola.
A pergunta que se faz é: como funciona a cabeça de uma adolescente que mata por motivo banal? Será que há ausência de sentimento de culpa, pena ou remorso? Pouca aversão ao risco? Baixa visibilidade de futuro? Aliados, os três fatores compõem a personalidade dos chamados psicopatas. São pessoas com comportamento anti-social e, por isso, capazes de extrema violência e frieza.
Depois da casa arrombada, é difícil encontrar um adjetivo para descrever o sentimento que se apoderou das populações do Rio de Janeiro e de Belém, um início de semana para sair da lembrança. O povo sofre as conseqüências de um Estado que falha miseravelmente no cumprimento de sua função primordial: garantir a segurança dos cidadãos. O custo da prática da criminalidade no Brasil é baixo, o retorno é alto. Há um evidente desequilíbrio entre incentivos e punições. O caldo de cultura da violência permanece em ebulição.
Sergio Barra é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com
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