segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Cavalo de Troia


As circunstâncias forçam, e o pior são as ilações de caráter político. Eivadas de precipitações, há inadequação para todos os gostos. Eis aí mais um fracasso. Há tempos, pretende-se evitar que a tragédia grega se espalhe pelo mundo. Por quê? É difícil atinar com o porquê do fracasso? A proposta de Georgios Papandreou de submeter a plebiscito o plano de resgate laboriosamente armado pela União Europeia pegou de surpresa os líderes políticos e financeiros da Europa e do G-20, o povo grego, os mercados e seu próprio partido. Na reunião do G-20, convocada, principalmente, para respaldar o plano de contenção da crise europeia, as chances de avanços substanciais são duvidosas mesmo com o problema europeu aparentemente equacionado a médio prazo.
 O episódio é importante. Requer compostura e, na medida do possível, cautela. Os repasses de que Atenas necessitava com urgência para pagar salários e pensões em dezembro foram congelados até a definição da Grécia. Uma consulta era tudo o que os poderes políticos e econômicos da Europa queriam evitar. Desde 2005, quando franceses e holandeses rejeitaram a relativamente anódina Constituição Europeia em tempos de prosperidade, a tensão entre mercado, instituições europeias e democracia é crescente.
Tanto quanto a impopularidade das próprias medidas, essa arrogância antidemocrática minava a confiança popular no projeto europeu antes mesmo de a crise se manifestar e hoje Bruxelas é um dos principais alvos de todos os, digamos assim, "indignados". Pode parecer paradoxal, para quem leva ao pé da letra a retórica segundo a qual a Europa está "salvando" a Grécia e rejeitar o acordo é "suicida". Mas não somente manifestantes radicais, como também especialistas, acham o remédio oferecido por Bruxelas pior que a doença.
Mais meritório, o "resgate" não abre uma perspectiva de recuperação, pois a Grécia continuará com sua competitividade deprimida pela moeda supervalorizada por mais uma década, senão por todo o futuro previsível. Na realidade, trata-se de evitar o "calote desordenado" que criaria o pânico financeiro, provavelmente arrastaria outros países em apuros - principalmente a Itália, nova "bola da vez" e um dos maiores devedores do planeta -, quebraria vários bancos europeus e deixaria Bélgica e França na posição de devedores de risco. O que, por sua vez, abalaria os pilares de Wall Street, abrindo uma nova rodada de crise financeira em todos os países ricos, talvez mais grave do que a primeira.
Dificuldades são dificuldades, e não se prestam a estratégias, inclusive porque há o imponderável. O resto é precipitação. Ante esse quadro, é no mínimo defensável propor que, considerando o ponto de vista do povo grego e não da UE ou do sistema financeiro, o mal menor é uma solução argentina, ou seja, abandonar o euro e declarar uma moratória unilateral de divida externa.
Pergunta pertinente: É isso que Papandreou desejava? Com certeza não: seu governo defendia a permanência na Zona do Euro. Mas diante de tantas greves e manifestações do povo e sob o fogo cruzado da oposição conservadora, avaliou, provavelmente com razão, que impor a "austeridade" sem um referendo que a legitimasse e comprometesse o povo com suas consequências acabaria com qualquer governabilidade. Nesse mundo em crise, fica a lição difícil. É preciso ensinar os líderes europeus e do G20 a levar a democracia a sério. Sem pressa, a sessão mais tarde é em 3D.
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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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