domingo, 8 de junho de 2008

Desafios para Dimitri Medvedev



A crise na Geórgia e o combate à inflação serão os principais desafios que terá de arrostar o novo presidente da Rússia, Dimitri Medvedev. O ato final da elaborada coreografia da transição do poder na Rússia foi em 7 de maio passado, quando Medvedev assumiu a presidência. A primeira decisão: apontar seu mentor, Vladimir Putin, para o cargo de primeiro-ministro. A dupla inicia a gestão com uma perigosa e espinhosa crise política nas mãos.
Em primeiro lugar, o presidente russo terá que lidar com o tema sensível da Abkházia a da Ossétia do Sul, dois territórios da Geórgia que proclamaram sua independência e provocam uma tensão crescente entre Moscou e Tbilisi. Os russos até hoje ainda não digeriram a fragmentação da URSS. O ministro georgiano encarregado da Reintegração destes territórios separatistas, Temuri Yakobashvili, considerou recentemente em Bruxelas que os dois países estão "muito próximos" de uma guerra civil.
Mês passado, a agência de notícias russa Itar-Tass afirmou que a ex-república soviética da Geórgia estava prestes a invadir a Abkházia, sua antiga província, que declarou independência em 1992. Logo em seguida, quatro aviões militares georgianos foram derrubados quando sobrevoavam o território separatista. Suspeita-se que fogo russo tenha derrubado as aeronaves. A Rússia é a maior aliada da Abkházia.
A notícia provocou calafrios na região porque ficou subtendido que o governo de Moscou estaria tentando criar um casus belli - expressão bélica, em latim, para justificar guerras - de modo a lançar um ataque contra a Geórgia. Se o ato de provocação funcionar e a Rússia realmente invadir a Geórgia - uma democracia emergente, com tropas do Iraque e aspirante a membro da OTAN -, então o Ocidente terá que dar uma resposta, senão militar, ao menos política e diplomática. É perspectiva preocupante. A Primeira Guerra Mundial teve um início igualmente obscuro, em Saravejo, e os atuais problemas na Abkházia podem levar um confronto armado de maiores proporções (mais um Vietnã).
A Casa Branca, por sua vez, pediu à Rússia que pare com as "provocações" nestes dois territórios, para onde Moscou, que apóia os regimes separatistas, acaba de enviar soldados. Para Fiodor Lukianov, radator-chefe da revista Rússia, parece pouco provável que o novo presidente mude as principais orientações definidas pelo seu predecessor e mentor, Vladimir Putin, em matéria de política externa. "O slogan de Medvedev é a continuidade. Não faria sentido modificar uma política tão popular como a de Putin", destacou Lukianov.
Sob Vladimir Putin, a Rússia se opôs aos Estados Unidos sobre o escudo antimísseis que Washington pretende instalar em países do Leste da Europa, e sobre a ampliação da OTAN às ex-repúblicas soviéticas como à Ucrânia e à Geórgia e o apoio às forças políticas anti-russas nas antigas repúblicas soviéticas - coisas do presidente Bush para alimentar a guerra fria e de tentar dissipar quaisquer dúvidas de ressuscitar as políticas expansionistas do passado.
Forte como nunca, Vladimir Putin manobra o sistema parlamentar do barco russo, surrupiando parte de sua independência. Quando quer abre fissuras na malha administrativa. Maquinações envolvem empresários, políticos e quadros da administração. Os espaços abertos na administração vão contribuindo para expandir seu poder já consolidado.
Pelo inflamado ponto de vista anglo-americano, Medvedev poderia adotar uma posição menos conflitante com o Ocidente. A crise no Cáucaso testará a liderança do presidente russo, que, segundo comenta-se, trata-se de um xerife do todo poderoso ex-presidente e terá que dosar força e sabedoria, para provar que pode defender os interesses russos com pulso firme. Para isso, contará com os conselhos de Putin, que permanece à sombra, mas nem tão à sombra assim. Há quem aposte que parte da autoridade presidencial seja transferida para o primeiro-ministro.

Sergio Barra é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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