terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Novas eleições em Santarém


Formula-me este blog algumas indagações acerca do rumoroso caso da ex-prefeita reeleita de Santarém - caso único em todo o Brasil - que provocou, como não podia deixar de provocar, perplexidade no mundo jurídico e, sobretudo, no mundo político. Tais indagações direcionam-se para questões práticas no caso de realização de novo pleito naquela cidade, se a decisão do TSE, que negou registro à candidata, for mantida pelo STF.
Devo dizer que o imbróglio era perfeitamente previsível e só surpreendeu os pouco afeitos ao Direito Eleitoral. Em artigo publicado no Informativo do Ministério Público do Estado do Pará (edição nº 2, de abril/maio/junho-2008, p.10/18), registrei, minuciosamente, o intenso vaivém da legislação e das decisões jurisprudenciais (desde a promulgação da Constituição de 1988) sobre o exercício da atividade político-partidária por membros do Ministério Público, objeto de flagrante antinomia da própria Carta Magna que, em sua redação originária, ao mesmo tempo vedou e permitiu essa atividade, ao juntar à proibição a velha e traiçoeira ressalva das "exceções previstas em lei."

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“A biruta jurisprudencial do TSE soprou para o lado contrário aos interesses da ex-prefeita reeleita. Mas não pôs fim ao caso. A votação do TSE foi apertadíssima, por 4 x 3, o que bem demonstra que o tema ainda não está de todo pacificado.”
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O titubeante ordenamento legal e jurisprudencial sobre a matéria tem gerado, com efeito, extremada insegurança jurídica, de modo que a ninguém era dado dizer, com certeza, o que seria válido, sobre o tema, nas eleições de outubro do ano passado. Tanto que eu assim concluí aquele mesmo artigo com a seguinte observação: "Resta, portanto, esperar para ver para que lado vai soprar, nas eleições de 2008, a biruta jurisprudencial do TSE."
A biruta jurisprudencial do TSE soprou para o lado contrário aos interesses da ex-prefeita reeleita. Mas não pôs fim ao caso. A votação do TSE foi apertadíssima, por 4 x 3, o que bem demonstra que o tema ainda não está de todo pacificado. Bastaria que apenas um dos votos contrários mudasse de lado, para que a reeleição da candidata fosse confirmada.
Na verdade, falta, ainda, o pronunciamento final e definitivo do STF, que é a quem compete, em última análise, decidir sobre a questão constitucional de fundo que causou todo esse quiproquó - ou seja, se a proibição de exercer atividade político-partidária, imposta aos membros do Ministério Público pela EC nº 45/2004, que expurgou a antinomia do texto originário da Constituição, alcança, ou não, os membros do Ministério Público que ingressaram na carreira antes da promulgação dessa emenda - que é, precisamente, o caso da ex-prefeita reeleita.
Abstraídas as tentativas de obtenção de provimento liminar, por via de medidas cautelares, para permitir a diplomação e a posse nas datas previstas no calendário eleitoral, tentativas essas não conhecidas por razões meramente processuais, o STF ainda não decidiu, e nem se sabe quando decidirá, em caráter final, sobre aquela questão de fundo, o que deverá ocorrer somente quando for julgado o mérito do recurso extraordinário interposto contra o acórdão do TSE que cassou o registro da candidata.
Se essa decisão de mérito for prejudicada por questões estritamente processuais, tão do agrado do sistema judiciário brasileiro, ou se a decisão de mérito do STF mantiver a decisão anterior do TSE, caberá ao TRE marcar nova eleição, nos termos do artigo 224 do Código Eleitoral, e isso ocorrerá porque a ex-prefeita obteve mais de 50% dos votos válidos, que, uma vez mantida a sua inelegibilidade, serão declarados nulos, ficando prejudicada a eleição anterior.
Para a renovação do pleito - exclusivamente para os cargos majoritários de prefeito e vice-prefeito - o TRE editará nova "resolução fixando as regras e o calendário a ser observado no pleito", conforme o pronunciamento já firmado pelo TSE (Resolução nº 22.087 - Consulta 1140-DF, de 20/09/2005, relator Min. Gilmar Mendes). É certo que, renovando-se a eleição, "reabre-se todo o processo eleitoral", conforme também já definido pelo TSE (Acórdão em REsp Eleitoral nº 25.436-ES, de 30/05/2006, relator Ministro Gerardo Grossi).

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“Apesar do Código Eleitoral dizer que o TRE marcará dia para a realização de nova eleição no prazo de 20 a 40 dias, o TSE, certamente atento ao princípio da razoabilidade, já decidiu que é necessário aguardar o trânsito em julgado da decisão que, reconhecendo a inelegibilidade da candidata mais votada, acarretou a nulidade dos votos por ela obtidos, e, por via de conseqüência, a da eleição anterior.”
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Obviamente, "na renovação do pleito, por se tratar de situação excepcional, os processos de registro [de candidatos] merecem tratamento específico e diferenciado dos demais, interpretando-se de forma sistêmica as normas eleitorais, inclusive se levando em conta o princípio da razoabilidade" (Acórdão em REsp Eleitoral nº 21.241-GO, relator Ministro Fernando Neves - DJU de 29/08/2003).
Assim, em que pese o artigo 224 do Código Eleitoral dizer que o TRE marcará dia para a realização de nova eleição no prazo de 20 a 40 dias, o TSE, certamente atento ao princípio da razoabilidade acima aludido, já decidiu que é necessário aguardar o trânsito em julgado da decisão que, reconhecendo a inelegibilidade da candidata mais votada, acarretou a nulidade dos votos por ela obtidos, e, por via de conseqüência, a da eleição anterior. E isso porque, segundo o TSE, "há necessidade de se prevenir a perturbação que decorreria de uma nova eleição, enquanto não houver o acertamento judicial definitivo sobre a elegibilidade ou não" (Acórdão em MS nº 3.275-PE, de 15/05/2005, relator Min. Luiz Carlos Madeira).
A reabertura do processo eleitoral abrange, naturalmente, todas as suas fases: das convenções partidárias para a definição de coligações e escolha de candidatos até à diplomação dos eleitos, de acordo com o novo calendário eleitoral que será fixado na resolução do TRE que marcar o dia da nova eleição.
Os casos de inelegibilidade e de desincompatibilização são os mesmos, e atenderão aos mesmos prazos previstos na Constituição Federal e na Lei de Inelegibilidades (LC nº 64/1990), mas "serão aferidos no processo de registro [das novas candidaturas], seguindo como parâmetro a data do novo pleito", conforme já decidiu o TSE (Acórdão em REsp Eleitoral nº 25.436-ES, de 30/05/2006, relator Ministro Gerardo Grossi).
Obviamente, não é possível abarcar nas modestas dimensões deste artigo todas as situações possíveis em cada pleito, o que demanda alentados cartapácios de que têm sido pródigas nossas editoras jurídicas. Mas, respondendo às indagações do blog, é possível dizer, com algum grau de certeza respaldada nas decisões do TSE, que:
* "o candidato que deu causa à nulidade da eleição anterior" não poderá participar do novo pleito (Acórdão em /REsp Eleitoral nº 26.018, de 12/-6/2007, em REsp Eleitoral nº 26.140, de 12/06/2007 e em REsp Eleitoral nº 02/08/2007);
* o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, da ex-prefeita, evidentemente não poderão concorrer à nova eleição (CF, art. 14, § 7);
* os secretários municipais, os quaisquer servidores públicos na jurisdição do pleito, que não tiverem se desincompatibilizado no prazo previsto na LC nº 64/1990, tomando-se por base a data do novo pleito, também não poderão concorrer ao novo pleito;
* no caso dos secretários municipais ou quaisquer servidores públicos na jurisdição do pleito terem se desincompatibilizado regularmente por ocasião da eleição anulada e voltado a ocupar os cargos de origem, o TSE tem admitido que "é suficiente que se afastem nas 24 horas seguintes à sua escolha em convenção, para que se torne viável a sua candidatura ao novo pleito" (Acórdão em REsp Eleitoral nº 25.436-ES, de 30/05/2006, relator Ministro Gerardo Grossi);
* Os vereadores eleitos no pleito de outubro de 2008 e empossados em 1º de janeiro de 2009 não são, só por isso, inelegíveis para concorrer ao cargo de prefeito ou vice-prefeito na nova eleição, pois não se enquadram "em qualquer das hipóteses da LC nº 64/1990" (Acórdão em REsp Eleitoral nº 21.241-GO, relator Ministro Fernando Neves - DJU de 29/08/2003).

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LUIZ ISMAELINO VALENTE é advogado, Procurador de Justiça Aposentado e ex-professor de Direito Eleitoral na Escola Superior da Magistratura do Pará e na Fundação Escola Superior do Ministério Público do Estado do Pará.

3 comentários:

Anônimo disse...

O blog do Jeso Carneiro publicou a seguinte nota com o titulo DEVOLUÇÃO "A ex-prefeita Maria do Carmo (PT) prometeu devolver hoje, 5, o carro oficial da Prefeitura de Santarém - um Corolla preto.

O prefeito interino José Maria Tapajós (PMDB) ainda não desfrutou, como nº 1 da cidade, os confortos do veículo"

Tal fato demonsta que a promotora publica resiste a se afastar das benesses do cargo.
A licença da mesma terminou dia 31/12 e para que volte ao exercicio do cargo há de desfilia-se do partido, pergunta-se. A promotora já voltou ao cargo? A mesma apresentou a certidao de desfiliaçao? O MP vai reintegrar a mesma ao cargo e pagar seus salarios sem que a mesma cumpra o contido na lei.

Dárcio Nunes Alves disse...

Olá caro Sr.LUIZ ISMAELINO VALENTE,diante do vosso vasto conhecimento na área jurídica,agradeceria muito a sua ajuda,o municipio que moro Cândido Sales - Bahia está atravessando uma situação nunca vista antes,por vavor nos diga,haverá aqui novas eleições,segue no linque abaixo o resultado das eleições aqui:
http://www2.camara.gov.br/eleicoes2008/el134339.html Não consta o 1ºcolocado que teve o seu registro cassado,mesmo assim concorreu por conta e risco as eleições para Prefeito obteve 7.748 os votos nulos foram 1098,agradeço a sua ajuda,FELIZ 2009.

Poster disse...

Olá, Dárcio.
Remeti sua consulta ao dr. Ismaelino.
Abs.