segunda-feira, 20 de outubro de 2008
A mudança do traçado da 25 de Setembro
Sei não, mas a liminar do juiz que manda a prefeitura mudar em 120 dias o traçado da Avenida 25 de Setembro me parece totalmente equivocada.
Essa avenida é o único projeto urbanístico público em Belém que prioriza a "qualidade de vida" dos moradores. Esse é o ideal de vida nas grandes cidades. A criação de mais espaços com a mesma característica é a aspiração máxima dos que vivem nesses enormes hospícios em que se transformaram as metrópoles. Transformar a 25 de Setembro numa via de linha reta e de velocidade só piora a qualidade de vida do local e põe em risco cotidiano a vida dos seus moradores. Quem responderá pelas mortes que faltalmente ocorrerão com a transformação da 25 numa pista de Fórmula 1? O juiz? O promotor?
O sacríficio do bem-estar dos moradores em favor "de toda a coletividade", como diz o juiz, é uma balela. Qual a "coletividade" que se quer beneficiar com a mudança? A elite econômica que tem carro? Por que os direitos destes são mais nobres do que os dos pacíficos moradores (dentre estes muitos idosos, crianças, pessoas enfermas) da Avenida 25 de Setembro?
Outra grande balela é o argumento de que o atual traçado contribui para o tráfico de drogas e a prostituição. Na Almirante Barroso, na Pedro Álvares Cabral, na Nazaré, na Gentil, na Conselheiro, na Presidente Vargas e em tantas e tantas outras ruas em linha reta não tem tráfico de drogas nem prostituição? No CAN, na Praça da República, no Reduto, na Cidade Velha e em todos os bairros de Belém - viu, senhor juiz? -, o tráfico e a prostituição campeiam abertamente, nocauteando as autoridades de qualquer quilate, que deveriam combatê-los onde quer que existam.
Em quê a mudança do traçado da 25 de Setembro vai melhorar o meio ambiente? Com o aumento da poluição do ar pela emissão do carbono dos automóveis? O que se entende por meio ambiente? Pensam que meio ambiente é só grama e paisagismo raquítico como na Nova Duque, que não tem sequer uma calçadinha no canteiro central para um cooperzinho básico?
O "caos do trânsito" em Belém é realmente terrível. Mas, a retidão do traçado de uma só rua não vai resolver coisíssima nenhuma. Quando mudaram a sede do Tribunal de Justiça para a Almirante Barroso, disseram que ia "desafogar" o "caos do trânsito" na Praça Felipe Patroni. Desafogou? Que nada!
A verdade é que Belém não tem para onde crescer, senão para trás, feito rabo de cavalo. A cidade não comporta o aumento desenfreado, assustadoramente crescente, da frota de veículos a cada ano, para gáudio apenas do Detran, que arrecada o IPVA. Os leitos das ruas são péssimos, nem o asfalto eleitoreiro dá jeito. Daqui a pouco, teremos de andar carregando nossos carros na cabeça, porque não tem mais lugar para estacionar. Em cidades como São Paulo, carros são proibidos de trafegar em determinados dias. Mas, em vez de se melhorar o leito das ruas, de se reduzir a frota ou de se estabelecer o rodízio de carros, únicos modos de melhorar um pouco - só um pouco! - o trânsito numa cidade que está a ponto de explodir de tão cheia de carros, os sábios de Sião da justiça alternativa, auto-intitulada "de vanguarda", impõem um inaceitável "retrocesso" e acabam com a única rua da cidade em que realmente tem valido a pena viver (e eu não moro nem nunca morei lá, infelizmente!).
Como sempre digo: cada qual devia fazer só o que cabe a cada qual. Daria mais resultados. Promotor não é prefeito, juiz não é governador. A concepção urbanística de uma artéria, de um bairro, de um setor da cidade é assunto eminentemente de administração pública, de políticas públicas. Promotores e juízes, como "agentes políticos" que são, devem lutar pela fiel implementação das políticas públicas, mas não lhes cabe impor, como políticas públicas, aquilo que não passa de "achismo" de suas próprias idiossincrasias.
O orçamento público não é casa-da-mãe-joana, não se presta para improvisações nem para arroubos de promotorite ou de juizite.
A mudança de uma concepção urbanística como a da Avenida 25 de Setembro - que há décadas já vem sendo discutida, não é nenhuma novidade -, no mínimo é uma matéria altamente polêmica, o que, por si só, deveria afastar a temeridade de uma liminar (que é uma decisão provisória, sem o julgamento final do mérito), que, no caso, se tornou, como dizem os bacharéis, "satisfativa", ou seja, o juiz já deu definitivamente aquilo que, ao fim e ao cabo, pode até vir a ser negado, quiçá em instância superior...
Direito difuso, embora difuso, é um direito real, não virtual, não imaginário, que não se inventa, porque é um direito de todos de fato pré-existente. Quando o direito não é de todos, mas só de uma parte ou de um segmento, não é lícito priorizar o direito de uns em detrimento do direito de outros, porque assim estaríamos apenas trocando seis por meia dúzia e nada ficaria resolvido.
Numa época em que o "orçamento participativo" já se tornou um instrumento corriqueiro de planejamento e gestão, por que não deixar a própria comunidade dizer o que ela quer sobre a permanência ou a mudança do traçado da Avenida 25 de Setembro? Impor essa decisão judicialmente me parece demasiadamente abusivo e arbitrário.
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LUIZ ISMAELINO VALENTE é advogado, procurador de Justiça aposentado e agraciado em abril de 2008, no Hangar, pela Abrampa (Associação Nacional do Ministério Público de Meio Ambiente), como um dos "pioneiros na defesa jurídica do Meio Ambiente no Estado do Pará".
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7 comentários:
Luiz Esmaelino, o senhor tem razão, mas também têm razão aqueles que querem a 25 com ciclovias, com áreas para a prática de exercícios, mas que tudo isso também permita a circulação de veículos, ou as ruas, basicamente, não são feitas para os carros? Ruas são abertas ou melhoradas para fazer fluir o trânsito. Claro que hoje é preciso equipar ruas, travessas e avenidas ainda com espaço para os que não podem se locomover com as pernas, como os cadeirantes, os velhos (com todo o respeito aos idosos, pois que tenho mãe de 82) e aparelhá-las aos adeptos das caminhadas e corridas, não esquecendo o que foi esquecido na "nova" Duque, as ciclovias.
A observação de Luiz Ismaelino Valente é totalmente equivocada. A avenida 25 de Setembro não é condomínio fechado, é uma via pública e como tal deve servir a todos os moradores de Belém.
Que "qualidade de vida" é essa, onde o cidadão fica preso no ônibus durante horas, devido à ausência de vias para o escoamento do tráfego?
Repito, sr. Luiz: a avenida 25 de Setembro não é condomínio fechado. É uma via PÚBLICA. Se os moradores da 25 querem silêncio, sossego e tranqüilidade, que procurem um condomínio fechado como os Greenvilles da Augusto Montenegro para viver.
Denise Pacheco
Concordo com você, Denise. Muito bem.
Discordo, completamente, do texto.
O autor esqueceu que a abertura da 25 de setembro vai atingir - favoravelmenete - um sem número de cidadãos, que pagam seus impostos e esperam da Administração Pública medidas sérias tendentes a melhorar o dia-a-dia.
Logo, trata-se, inequivocamente, de um interesse difuso.
De outro lado, há o interesse individual dos moradores da rua, que buscam um espaço para lazer, em total falta de sintonia com o anseio da população, em geral.
Correta a medida liminar. Há prova inequívoca nos autos de que a situação, como posta, causa prejuízos enormes à circulação de veículos em Belém.
Então, chega de choradeira!
O bloguero autor do texto, esta equivocado. A 25 somente serve para os donos de bares e os meliantes de araque, que utilizam a via ridícula em sua forma, para seus interesses ilicitos e contrários a sociedade. Porque a via deve beneficiar apenas o interesse de meia duzia e não o de seus moradores e da população em geral. Andou bem o magistrado quando utilizando seu poder de aplicar a lei em beneficio da maioria , encontrou uma forma de acabar com essa baderna. Parabéns a ele que julga pelo interesse do povo.
Adolfo Alves.
Interesse individual dos moradores da rua uma pinóia!
Que vão fazer corredor de tráfego em outro lugar, esses ignorantes que só pensam em escoar carros, o juiz e o senhor promotor inclusos. Queria saber em quais leis eles se basearam para mandar derrubar aquele mundaréu de árvores em troca de alguns minutos a mais de celeridade nesse trânsito louco. Porque não terminar a 1 de Dezembro? Ou abrir um outro corredor qualquer? O que querem vocês arautos desse progresso estúpido? Transformar a cidade inteira em um caminho cinza e sujo? Tirem suas mãos cobiçosas do pouco que resta de verde nessa cidade. A 25 é patrimônio da cidade inteira, do jeitinho que está. Ruas retas, sem árvores, sem charme, cheias de loucos atrás de volantes, tudo isso tem de sobra nessa Belém que cada dia mais parece uma pista de "racha" dos ignorantes.
Belém precisa é de mais verde!
Só quem mora no seu carro com ar-condicionado pode achar que nós temos condições de prescindir de alguma árvore. Qualquer folhinha nos fará falta nessa canícula infernal, que dirá uma 25 inteira de árvores frondosas.
Tenho uma proposta alternativa: vamos fechar a 25 definitivamente para os carros. De agora em diante por lá só passam bicicletas e passarinhos.
Ass: Não-moro-na-25-mas-quero-que-ela-continue-como-está
Pensar em uma parcela da população apenas é um egoísmo sem fim. Mais vias, escoam o trânsito e diminui o transtorno de muitos (muitos!!).
Provavelmente, o autor do texto mora ao lado de casa e não precisa enfrentar o trânsito caótico do centro da cidade até a Augusto Montenegro, por exemplo (onde eu moro).
A opinião aplica-se também ao binário Pedro Alvares Cabral-Senador Lemos... Tem gente que não quer andar 100 metros pra parada, só porque antes pegava o onibus na porta de casa.
Na situação péssima do trânsito de Belém, qualquer via nova ou ampliada ajuda muito.
Infelizmente o remédio é amargo, mas cura.
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