sábado, 1 de novembro de 2008

Poder do juiz e ato discricionário

O artigo 5º, XXXV da Constituição Federal assegura que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.
Referida Carta também dispõe sobre o sistema de freios e contrapesos, autêntica distribuição de competências (administrativa, legislativa e judicial) a traduzir o efetivo exercício do poder, cuja finalidade é garantir a independência e a harmonia entre os Poderes de Estado (Executivo, Legislativo e Judiciário).
Costuma-se pensar que o poder dado aos juízes não encontra limites quando se trata de impor obrigações à Administração Pública.
Para compreender a matéria, é necessário distinguir atos vinculados de atos discricionários.
Os poderes exercidos pelo administrador público são determinados pelo sistema jurídico. Não podem ultrapassar os limites impostos pela lei, sob pena de ilegalidade. Por essa razão, diz-se que o agente público só pode fazer o que a lei lhe determina.
Há casos em que o poder da Administração é vinculado, porque a lei não deixou margem para a sua atuação. Para exemplificar: o cumprimento pelo gestor municipal do código de posturas de uma cidade e o lançamento tributário feito pela autoridade fiscal em desfavor do contribuinte. Esses atos, comissivos ou não, sujeitam-se à correção judicial. Uma particularidade do poder vinculado: a lei não dá segunda opção ao administrador.
O mesmo não ocorre com o poder discricionário. O administrador público tem, diante de um caso concreto, a possibilidade de escolher uma entre as soluções postas em lei. É a aplicação dos critérios de conveniência e oportunidade. Alguns exemplos, entre muitos: a abertura de ruas, as alterações no trânsito e a escolha das obras com as quais o agente político pretende implantar o seu programa de governo.
A discricionariedade corresponde a uma escolha entre o fazer e o não fazer. Se pudermos optar entre o atuar ou não, então ela existe. Nessas hipóteses, os atos do administrador não ficam sujeitos à correção judicial.
Somente questões referentes ao aspecto da legalidade do ato e a verificação se o administrador público não ultrapassou os limites da discricionariedade são de livre apreciação pelo juiz, que poderá invalidar o ato desde que fundamentado no argumento segundo o qual a autoridade excedeu o limite deixado pela lei e invadiu o campo da ilegalidade.
Inúmeros são os julgados no Supremo Tribunal Federal (STF) a dizer que é vedado ao juiz controlar atos discricionários (AI-AgR 630997/MG; RE-AgR 478136/MG; e RMS 23543/DF).
O juiz encontrará óbice para atuar sempre que a lei der ao administrador público a possibilidade de decidir a respeito do mérito do ato administrativo.
Contudo, se a Administração Pública revogar ato por motivo de conveniência ou oportunidade sem respeitar direitos adquiridos, o juiz terá espaço para o controle, segundo a súmula 473 do STF (AgR no RE nº 342593/SP).
Parte da doutrina e da jurisprudência admite que o juiz possa investigar o âmbito discricionário, dado o grau de subjetivismo que algumas situações comportam. É quando o magistrado adota o princípio da razoabilidade para medir se a valoração feita pelo administrador público harmonizou-se com a lei e com os princípios adotados pelo sistema jurídico.
Portanto, o Judiciário não será totalmente livre para decidir a respeito dos atos discricionários da Administração Pública.

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ROBERTO DA PAIXÃO JÚNIOR é bacharel em Direito
roberto.jr@orm.com.br

Um comentário:

Poster disse...

Anônimo,
Respondendo à sua dúvida que estava entre parênteses: é sim.
Abs.