sábado, 21 de março de 2009

Violadas e feridas. Dentro de casa.

Na VEJA:

A família e a própria casa são a maior proteção que uma criança pode ter contra os perigos do mundo. É nesse ninho de amor, atenção e resguardo que ela ganha confiança para lançar-se sozinha, na idade adulta, à grande aventura da vida. Mas nem todas as crianças com família e quatro paredes sólidas em seu redor são felizes. Em vez de contarem com o amor de adultos responsáveis, elas sofrem estupros e carícias obscenas. Em lugar do cuidado que a sua fragilidade física e emocional requer, elas são confrontadas com surras e violência psicológica para que fiquem caladas e continuem a ser violadas por seus algozes impunes. No vasto cardápio de vilezas que um ser humano é capaz de perpetrar contra um semelhante, o abuso sexual de meninas e meninos é dos mais abjetos – em especial quando é cometido por familiares. Para nosso horror, essa é uma situação mais comum do que a imaginação ousa conceber. Estima-se que, no Brasil, a cada dia, 165 crianças ou adolescentes sejam vítimas de abuso sexual. A esmagadora maioria deles, dentro de seus lares.
A frequência intolerável com que esse tipo de crime ocorre no país ficou evidente com a divulgação do caso da menina G.M.B.S., engravidada pelo padrasto aos 9 anos de idade, em Pernambuco. Sua mãe decidiu que ela, grávida de gêmeos, deveria ser submetida a um aborto. Quando, há três semanas, G. chegou ao hospital carregando uma sacola de brinquedos, os médicos encarregados do procedimento ficaram atônitos: não tinham ideia da quantidade de medicamentos que deveriam usar numa gestante tão diminuta – G. mede 1,36 metro e pesava então 33 quilos. "Nunca havíamos atendido uma criança tão pequena", disse o médico Sérgio Cabral. O caso de G. chamou atenção por causa da polêmica sobre o aborto a que, no fim, ela se submeteu, amparada pela lei que autoriza a intervenção nas situações em que a mãe corre risco de vida. Já a gravidez de G., e mesmo a situação que resultou nela, causa menos escândalo no país do que deveria.
As notificações vêm aumentando exponencialmente nos últimos anos graças, em boa parte, à internet. A popularização da rede mudou radicalmente tanto a prática da pedofilia quanto o seu combate. Ela estimulou a propagação desse crime ao facilitar a troca de material pornográfico infantil e aproximar os predadores de suas vítimas potenciais – inocentemente expostas em sites de relacionamento. Além disso, deu aos criminosos voz e uma certa sensação de "legitimidade", como explica a advogada Maíra de Paula Barreto. Em sua dissertação de mestrado sobre o assunto, ela cita um trecho do estudo das psicólogas italianas Anna Oliverio Ferraris e Barbara Graziosi: "Se antes o pedófilo cultivava sua perversão na solidão, hoje tem a possibilidade de conectar-se com outros como ele, de sentir-se apoiado e legitimado em seus desejos". Até o ano passado, era comum encontrar no Orkut comunidades com títulos tão ostensivos como "Sou pedófilo". Dirigida àqueles "que gostam mesmo é das meninas novinhas, sem rugas e com nenhuma experiência", ela abrigava dezenas de participantes que faziam relatos de suas "experiências" e trocavam informações sobre suas relações com crianças com a naturalidade dos que compartilham receitas de doces. Esse tipo de comunidade não deixou de existir, mas já não se apresenta de forma tão escancarada. Vem disfarçada sob siglas como "pthc" – ou "preteen hardcore" ("pornografia explícita com pré-adolescentes"). Isso porque, se a rede ajudou a propagar o crime, também aumentou a visibilidade dos criminosos – bem como a sua punição. De 2006 a 2008, a SaferNet Brasil, ONG destinada a combater a pedofilia na internet, recebeu denúncias sobre 109.000 páginas eletrônicas com conteúdo pornográfico infantil. As que revelavam indícios de crime foram encaminhadas ao Ministério Público e à Polícia Federal.

Mais aqui.

Nenhum comentário: