sábado, 21 de março de 2009

Linguistas criticam publicação de vocabulário

Na FOLHA DE S.PAULO:

Lançada anteontem, a nova edição do Volp ("Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa") não deveria ser publicada agora, sem que os outros países tivessem sido consultados, dizem linguistas. A publicação já traz a grafia nova de palavras alteradas pelo Acordo Ortográfico, que entrou em vigor no início deste ano.
De nove dos 17 membros da Colip (Comissão para Definição da Política de Ensino-Aprendizagem, Pesquisa e Promoção da Língua Portuguesa, ligada ao Ministério da Educação) ouvidos pela Folha, seis criticaram a posição da ABL (Academia Brasileira de Letras) de publicar a obra sem discutir lacunas do Acordo com as outras nações lusófonas.
Na opinião desses especialistas, Portugal pode questionar a escolha da grafia de algumas palavras pela ABL. O hífen, por exemplo, gerou muitas dúvidas, uma vez que o Acordo não era claro sobre a sua utilização, ou seja, a ABL decidiu internamente a grafia de muitas palavras e expressões, como "coerdeiro", sem hífen e sem a letra "h", embora o texto oficial indicasse o uso de "co-herdeiro".
"Não entendo como um acordo internacional tenha sido interpretado como sendo de execução de um só país", diz Gilvan Müller de Oliveira, professor de linguística da UFSC e diretor do Ipol (Instituto de Investigação e Desenvolvimento em Política Linguística).
José Luiz Fiorin, professor da USP e autor de livros sobre linguística, tem opinião semelhante: "O fato de o Brasil publicar um vocabulário ortográfico dá a impressão de que ele está querendo governar a implantação do Acordo".
Para Fiorin, a publicação do Volp pode gerar um mal-estar com os outros países. "O Brasil deveria estar atento para isso, não levantando mais suscetibilidade nenhuma", diz, lembrando o fato de alguns portugueses terem reclamado das mudanças provocadas pelo Acordo -enquanto apenas 0,5% do vocabulário brasileiro foi modificado, em Portugal a mudança chegou a 1,5%.
O professor diz que "não é possível que alguém ache que se trata de um vocabulário definitivo, uma vez que o Acordo é explícito" em relação à criação de um "vocabulário ortográfico comum".
Segundo Godofredo de Oliveira, presidente da Colip, "o entendimento é que este vocabulário é a contribuição brasileira para o Volp, o que implica dizer também que, se lá na frente houver alguma pequena adequação, a academia deve estar pronta para fazê-la".
Evanildo Bechara, coordenador da Comissão de Lexicografia e Lexicologia da ABL e coordenador da elaboração do Volp, argumenta que, "se os portugueses seguirem o Acordo que eles assinaram, o vocabulário será igual".
Sobre a escolha de "coerdeiro", sem hífen e sem "h", e de palavras cuja grafia o texto do Acordo não esclarece, ele diz que a tradição foi levada em conta. Segundo Bechara, "nenhum ponto de vista adotado pela academia é aleatório" e, caso Portugal questione a posição da ABL, a academia irá "defender o ponto de vista dela".
Sobre uma reunião que a Colip quer fazer com os outros países, Bechara diz não entender "como é que vão fazer reuniões para modificar aquilo que está de acordo com o que ficou decidido num acordo". "Olha, acontece o seguinte: se partíssemos do pressuposto de que não deveríamos fazer o vocabulário agora, porque dentro de algum tempo haveria alterações, o homem estaria ainda no tempo das cavernas."
Paulo Coimbra Guedes, da Colip e professor da UFRGS, concorda com Bechara. Ele diz que a ABL fez certo ao tomar a dianteira e lançar o Volp. "Não é culpa nossa se a gente tem muito mais habitantes que eles e se a gente é economicamente muito mais importante", diz.
O Volp custa R$ 120. A ABL ainda não sabe quando ele estará disponível para consulta na internet.

Nenhum comentário: