No AMAZÔNIA:
Texto: AVELINA CASTRO E JAQUELINE ALMEIDA
Fotos: SHIRLEY PENAFORTE
Não é fácil encontrar o edifício Andorinhas. O arranha-céu de 19 andares não está em listas de busca eletrônica, não aparece na maioria dos mapas de ruas e bairros, tampouco nas propagandas que enaltecem as qualidades da maior cidade do País. Talvez por isso o Andorinhas seja, hoje, o principal destino dos meninos travestis paraenses traficados entre o Pará e as capitais do Sudeste. No sedutor esquema de aliciamento de adolescentes para exploração sexual, além de promessas de felicidade todo menino paraense leva no bolso o endereço do prédio, no cruzamento da rua dos Gusmões com a avenida Rio Branco, no bairro de Santa Ifigênia. 'A cafetina que está me levando (para São Paulo) tem vários apartamentos lá. É um prédio cheio de travestis paraenses', contou o adolescente Carlos*, 17 anos, explorado sexualmente na avenida Almirante Barroso, em Belém.
Quem conhece o prédio de perto percebe imediatamente a que ele serve: o Andorinhas não é uma moradia; é um cativeiro criado e mantido por redes de tráfico para submeter adolescentes e jovens travestis homossexuais à escravidão, à privação de liberdade e a todos os tipos de humilhação. Na portaria, em vez de vidros ou portas, o Andorinhas tem chapas de ferro trancadas. As paredes são sujas e pichadas. O elevador, caindo aos pedaços, é uma ameaça e as janelas são tampadas com pedaços de papelão - em agosto último, um menino de 3 anos despencou do sexto andar.
Apesar de abrigar algumas famílias de baixa renda, a movimentação nos arredores, portaria e corredores do prédio sugere um esquema de vigilância, com homens fortes, tatuados, cabelos pintados que, estranhamente, observam quem entra e sai. 'Toda cafetina tem os seus vigilantes. Eles ficam na nossa cola o tempo todo', disse Renato*, aliciado aos 15 anos para São Paulo.
Além do Andorinhas, pelo menos outros três edifícios no centro de São Paulo são usados pelos traficantes de pessoas. No entorno da praça da República, o edifício Século XX, na avenida São João, abrigou a travesti 'Paulete', presa em 2006 pela polícia paraense, acusada de chefiar uma das maiores redes de tráfico de adolescentes do Estado. 'Os apartamentos são alugados pelas pessoas que trazem eles (os meninos) para cá. O aluguel é feito no nome dessas pessoas. Têm umas (aliciadoras) que têm de seis a sete apartamentos, todos cheios de travestis', disse um funcionário, que não quis ser identificado.
Na rua Guaianases está localizado o edifício Los Angeles, 'moradia' de paraenses, pernambucanos, piauienses, entre outros. Nas proximidades, o edifício Esther, na rua Ipiranga, aparenta ser mais um edifício comercial de tantos em São Paulo, mas também possui apartamentos alugados por cafetinas de redes de exploração sexual de adolescentes. O esquema é conhecido dos funcionários, que não se identificam, mas contam detalhes. 'Aqui tem dois blocos que são comandados por cafetinas. Cada uma delas tem vários apartamentos alugados', relatou um deles.
* Nomes fictícios para preservar a identidade dos adolescentes e de suas famílias.
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