quinta-feira, 15 de outubro de 2009
Origem do Círio e da Assembleia de Deus
Semana passada, visitando uma exposição num shopping sobre os Círios no interior do Estado, um fato me chamou à atenção: a ausência de Vigia, notoriamente o berço da devoção nazarena. Contive-me em perguntar. Acabaria defendendo a minha terra e sei que isso poderia ser mal interpretado. Afinal de contas, hoje sou um pastor. Mas, história é algo que mexe com sangue cabano. Domingos Antônio Raiol, conhecido como Barão de Guajará, que diga! Mesmo vendo o próprio pai sucumbir na revolta popular, encontrou forças para escrever importantes obras. O melhor registro do período colonial provém desse meu conterrâneo.
Sobre o Círio, não precisamos de muito esforço para reconhecer a origem. O professor José Ildone, historiador e membro da Academia Paraense de Letras, expôs isso com clareza na edição do dia 11 de O LIBERAL. Demonstrou como a tradição foi trazida por Dom Jorge Gomes dos Álamos, português que morava próximo a Nazaré, cidade de Portugal que é berço ocidental dessa veneração. Sendo colonizador de Vigia, Álamos trouxe consigo a tradição portuguesa ainda no começo do século XVII. Francisco de Melo Palheta, vigiense que introduziu o café no Brasil, em cartas de 1727, já assina como local a "Villa da Vegia de Nazareth", elevação do povoado em 1697, há exatos 312 anos.
Ao contrário do costume católico, Nazaré nunca fez parte do nome de Belém. Caldeira Castelo Branco a chamou Feliz Lusitânia em 1616. Depois, foi Santa Maria do Grão-Pará. Mais tarde, Santa Maria de Belém do Grão-Pará.
Em relação à Assembleia de Deus, embora de história recente, também há quem ouse discordar. Fundada aqui em Belém pelos missionários suecos Daniel Berg e Gunnar Vingren em 1911, encontra resistência no Sul. Já teve gente que tentou de todo modo provar que a obra começou por lá. Só para você ter uma ideia, há uma igreja em São Paulo, no bairro do Belém, cujos líderes chegam a fazer trocadilho com o lugar da fundação da denominação. É uma tentativa sutil de distorcer a história. Se colar, colou. Mas a Assembleia de Deus foi fundada aqui em Belém do Pará. Não foi em Belém de Judá nem no bairro do Belém. É história! Não há como mudar, enquanto não se inventa a máquina do tempo.
Acredito que o Círio começou em Vigia. E a Assembleia de Deus aqui em Belém. O que aconteceu com esta igreja em nível nacional, sucedeu com a procissão em termos locais. Ambos nasceram anônimos. Seus primeiros seguidores foram caboclos humildes. Todavia, se expandiram para centros importantes. Acompanharam a expansão das grandes metrópoles. Veja que o Círio agora chegou ao Rio. Mas o berço sobrevive. Não podemos concorrer com a história.
A questão do Círio é mais delicada devido ao decurso do tempo. Em Belém, tivemos a edição nº 217. Vigia já ultrapassou 300 círios. Some-se a isso a questão mística que envolve a festividade. Alguns falam até em lendas. Aí fica mais difícil mesmo. A religião tem o poder de divinizar coisas comuns. Um claro exemplo é a corda. Introduzida na procissão para proteger a berlinda, hoje é um símbolo vivo do Círio, retalhada como amuletos. O que será dito às gerações futuras a respeito da origem desse elemento? Que histórias serão contadas?
Sobre a Assembleia de Deus, menos dificuldade. O porto onde os missionários desembarcaram está firme com a imponente Estação das Docas. A Praça da República, onde descansaram e comeram mangas, intacta. O templo de 1926, reconstruído, adorna ainda o bairro de Nazaré. Deixemos a história sossegada. Cuidemos do futuro. E vigiemos!
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RUI RAIOL é pastor e escritor
Mais artigos: www.ruiraiol.com.br
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