quarta-feira, 7 de outubro de 2009

“Alô? Doutor Trindade? Sua cunhada está aqui.”

Podem acreditar.
Neste Pará em que tudo pode e que mais se parece, às vezes, com uma terra de ninguém, tudo pode mesmo.
Tudo pode acontecer.
Se você duvida, imagine esta situação.
Doutor Trindade, o José Raimundo Trindade, Sua Excelência o secretário da Fazenda, recebe qualquer dia desses um aviso de sua secretária.
- Dotô, está aqui na antessala, querendo falar com o senhor, a dotora Vera Lúcia.
- Vera Lúcia...?
- Sim, a sua cunhada.
- Ah, sim. Mande ela entrar.
Vera Lúcia entra no gabinete do secretário para colocá-lo a par de uma boa nova, de uma ótima nova: ela é quem foi escalada para auditar as contas da Secretaria de Fazenda.
Pronto.
Com o cunhado tendo as contas do órgão que dirige auditadas pela própria cunhada, é claro que estará tudo em casa.
Pois isso mesmo é o que pode acontecer.
Vera Lúcia, no caso, é Vera Lúcia Costa de Sousa.
É cunhada Trindade, aquele mesmo que, encerrando abruptamente um conversa com o repórter aqui do blog por telefone, quando questionado sobre nepotismo em sua secretaria, disse que nepotismo era bobagem.
Mas não era.
Não era e nem é bobagem.
E tanto é assim que Vera Lúcia, a sua cunha, foi logo depois exonerada da Sefa.
E aí?
E aí que ela está agora no Tribunal de Contas do Estado.
O ato está publicado no Diário Oficial desta terça-feira (06). Vejam aí na imagem e cliquem nela, para que a visualizem melhor.
A historinha que se encena é apenas ilustrativa de uma situação esdrúxula.
Isso não quer dizer, claro, que o secretário, por mais remotamente que seja, tenha tido influência na indicação da cunhada para o TCE.
Aliás, vamos acreditar que não tem qualquer ingerência nisso.
Mas vamos reforçar: a historinha é ilustrativa de situação que pode perfeitamente acontecer, neste Estado onde tudo pode.
E o certo é que Vera Lúcia não foi nomeada para um cargozinho qualquer, não.
Foi logo entronizada – toma-te! – no cargo de analista de controle externo.
E ainda por cima, na condição de temporária.
Sabe o que faz um analista de controle externo num tribunal de Contas como o TCE?
Ele não serve cafezinho para o chefe, não – sem qualquer demérito, claro, para o trabalhador que tem por incumbência servir cafezinho.
O analista de controle externo exerce, num TC, função das mais relevantes.
Audita as contas do governo.
Põe a lupa sobre elas.
É tecnicamente habilitado a detectar eventuais erros, que podem ser resultado ou não de má-fé.
O analista é quem assina os relatórios sobre auditorias.
Os relatórios é que são chancelados ou não – e quase sempre o são – pelos conselheiros, nas votações de plenário.
O cargo de analista de controle externo, num TC, deveria necessariamente ser privativo de servidor concursado.
Deveria, seja bem dito.
Porque isso aproveita à moralidade pública, já que o servidor concursado está um pouco menos exposto a pressões dos chefes durante o trabalho do qual se desincumbe.
Se o cargo de analista de controle externo, no Tribunal de Contas do Estado, ainda não é privativo de concursado, então o TCE deveria reformar os seus conceitos, urgentemente.
Para não ocorrer uma situação em que analista de controle externo, exercendo o cargo temporariamente, seja um dia despachado para auditar as contas do cunhado.
Do próprio cunhado.

7 comentários:

Anônimo disse...

Poster,

A Súmula Vinculante nº 13, do STF, veda a nomeação para a mesma pessoa jurídica e também o nepotismo cruzado, que é feito mediante nomeações recíprocas.

E isso ainda que o sujeito não tenha tido influência na nomeação!

De qualquer modo, é nojento verificar que cargos dessa natureza sejam providos assim.

Deveriam ser apenas mediante concurso público de provas ou de provas e títulos!

Um governo que se diz popular deveria ser o primeiro a identificar que cargos dessa natureza não podem ser de livre nomeação e de exoneração, já que não são relacionados com direção, chefia ou assessoramento.

É o patrimonialismo sem-vergonha, descarado, descabido e imoral revelando-se como arsenal pronto para ajudar as injustiças, beneficiando apaniguados do Poder.

Quem dera que o caso fosse o único!

Haverá quem compreenda que a crítica não tem lugar ou valor, afinal, a nomeação deve ter tido como base uma lei e nunca, jamais ou em tempo algum quem se beneficiou concordará com opiniões contrárias.

Não sei se tal lei existe. Se existir, foi outra criada sem respaldo no interesse público, princípio da Constituição que prevalece sobre os interesses da própria Administração Pública, quando em conflito com fundamentos como os do ingresso na atividade pública por meio de concurso, da igualdade e da moralidade.

Se fosse um dos legitimados processuais (a OAB, por exemplo) ingressaria com uma ação direta de inconstitucionalidade para afastar eventual norma que permitiu esse tipo nefasto de contratação.

E mais. Fosse o juiz e escreveria ao final da decisão um lamente-se no lugar do cumpra-se!

Se a situação ocorre há décadas, porque um governo que se rotula popular não acaba com a farra?
Onde está o Legislativo que deixa transfigurar completa falta de interesse pela matéria? Acaso os seus representantes também possuem parentes nessa condição?

Certamente não foi isso que o presidente da República imaginou quando aprovou o slogan (frase de efeito) "Brasil, um País de todos".

Parece que o Brasil é, sim, um País de tolos, ou seja, de pessoas e instituições que não movimentam uma palha para mudar circunstâncias iguais a esta ou quando o fazem é somente para assegurar-lhes algum benefício.

Anônimo disse...

Como é que pode? Alem de tudo - favorecimento, falta de ética, engessamento para se contrapor ao governo -, quem vai demitir essa temporária? O outro governo? Tem um montão se segurando ai. E os concursados, como ficam? E nós, continuamos pagando essa boa vida!

Anônimo disse...

Esse é o tal "Governo Popular".
Na verdade verdadeira, é "Governo Pra Pular"!!!
Na "Terra de Direitos": direito de nomear parentada; apaninguados; aspones; direito de gerar "emprego e renda" pros cumpanherus...e por aí vai.
E pensar que era "governo da mudança".
Mudou; o que era ruim ficou péssimo!

Anônimo disse...

Anônimos, o governo é verdadeiramente popular: para o povo do PT.

Anônimo disse...

Kd o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado? Não vai fazer nada? Cuidado, porque qualquer dia etarão CONTRATANDO promotor temporário. Acham impossível? Não duvido de mais nada. Nesta TERRA DE DIREITOS (VIOLADOS) TUDO PODE, TUDO É PERMITIDO, TUDO É PERDOADO.

Anônimo disse...

Que vergonha, ZÉ Raimundo!

Anônimo disse...

Um cargo de importância estratégica para o estado, só poderia ser preechido através de concurso público e de títulos, mas pelo que parece, o governo rasgou a constituiçao federal e o espetáculo dos horrores nepotistas continua.