quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Fordlândia

KENNETH MAXWELL

Na margem leste do rio Tapajós, o quinto maior tributário do Amazonas, no lado oposto a Urucurituba, fica uma vasta extensão de terras um dia conhecida como "Fordlândia".
O território é comparável em tamanho ao Estado de Connecticut. Entre 1927, quando a área foi adquirida por Henry Ford, e 1945, quando Henry Ford 2º, em um de seus primeiros atos como presidente da Ford Motor Company, a entregou ao governo brasileiro, a Fordlândia foi cenário de uma impressionante experiência, relatada em detalhes fascinantes por Greg Grandin em seu novo livro.
Henry Ford era um homem singular. Nascido em uma fazenda no Michigan em 1863, ele tinha 40 anos ao fundar a Ford Motor Company. Para todos os efeitos práticos, inventou a moderna indústria automobilística ao padronizar a produção em massa do Modelo T, que, por volta dos anos 20, respondia por 50% do mercado de automóveis norte-americano.
Ele vivia frustrado com a política interna e a cultura dos Estados Unidos, com os sindicatos, Wall Street, dança moderna, vacas, leite, álcool e intervenções governamentais. Acreditava, porém, em "pagamento justo e em dinheiro pelo trabalho" e introduziu padrões sanitários e de saúde modernos para seus trabalhadores.
A seringueira brasileira, Hevea brasiliensis, oferece a mais pura e elástica forma de látex. No final do século 19, a borracha brasileira atendia a 40% da demanda mundial. Manaus e Belém disputavam o título de "Paris dos trópicos". Ford acreditava que seria capaz de remodelar esse lucrativo comércio.
Mas a história da Fordlândia tem por temas centrais a arrogância, as teorias indevidamente aplicadas e as consequências imprevistas.
Acima de tudo, a tentativa de plantar seringueiras em estreita proximidade, como em uma plantação de café, fracassou no Brasil, porque permitia que as pragas agrícolas se espalhassem rapidamente. As 70 mil sementes que Henry Wickham havia contrabandeado do Brasil em 1876 e incubado no Real Jardim Botânico da Inglaterra, enquanto isso, forneceram as mudas utilizadas como base para a vasta expansão das plantações britânicas, francesas e holandesas de seringueira na Ásia.
Quando Henry Ford 2º entregou a Fordlândia ao governo brasileiro, em 1945, a experiência de Ford havia fracassado na Amazônia. No entanto, diante do ataque que hoje vemos à floresta tropical, a usina de energia arruinada, o salão de dança abandonado, os restos do hospital comunitário, os canos de água quebrados e em desuso e os pequenos e asseados bangalôs restantes são indicação de que a visão de Henry Ford quanto a uma Arcádia na selva era relativamente benigna.

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Artigo disponível na edição desta quinta-feira da Folha de S.Paulo

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