domingo, 20 de abril de 2008

Voltou à baila o terceiro mandato



É crível, mas já está virando regra: a cada nova crise, renasce a conversa de permitir uma nova reeleição para Lula. Nos bastidores da discussão, é só do que se fala. Um eventual terceiro mandato para o presidente da República voltou à baila. Coincidência ou não, o assunto foi retomado em um momento de crise política - a que foi gerada pelo dossiê com gastos sigilosos da gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Ademais, novas versões, velhas dúvidas sobre os cartões corporativos, fizeram com que a Polícia federal abrisse inquérito para investigar o vazamento dos gastos com cartão corporativo da presidência no governo de FHC. O autor do dossiê - com os dados que supostamente seriam usados para chantagear à oposição - e as suas motivações não serão apurados. Ou seja, a Casa Civil, principal suspeita de montar a papelada, por meio de uma assessora da ministra Dilma Rousseff, está fora da mira da Polícia Federal. Mas uma nova CPI, agora no Senado, vai investigar onde o governo tem influência modesta.
Paralelamente, Dilma ordenou uma sindicância interna: técnicos do Instituto de Tecnologia de Informação do Palácio do Planalto farão uma varredura nos computadores da presidência em busca de uma possível invasão do sistema. A ministra diz que os dados podem ter sido ilegalmente copiados da base de dados do governo e montados posteriormente na forma de dossiê. A oposição, apesar das denúncias de que o documento tenha sido vazado pelo senador Álvaro Dias (ele nega o vazamento, mas admite que conhecia o dossiê), não comprou a versão da ministra.
Em passado recente, discussões sobre o terceiro mandato apareceram casadas com períodos difíceis para o governo: em setembro do ano passado, época do julgamento do mensalão, das votações pela cassação do senador Renan Calheiros (PMDB-AL) e do caos aéreo; e novamente em dezembro, durante o embate pela prorrogação da CPMF.
Desta vez a lebre foi levantada pelo vice-presidente José de Alencar. Ele afirmou que, "se perguntarem aos brasileiros" o que eles desejam, "é que Lula fique mais tempo no poder". Em seguida o prefeito de Recife, João Paulo Lima e Silva (PT-PE), foi mais enfático: "O terceiro mandato de Lula é o plano A, Dilma é o plano B e o plano C é quem Lula indicar". E então o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP) novamente tirou da gaveta sua proposta de emenda constitucional (PEC) que pretende criar a chance de espichar a permanência de Lula no Palácio do Planalto.
Para apresentá-la à Câmara, Ribeiro precisa recolher assinaturas de deputados favoráveis à matéria. "Estou convicto de que o povo aceitará essa discussão, de que o momento é oportuno", defendeu. Arlindo Chinaglia (PT-SP), presidente da Casa, descartou a hipótese de a proposta ser votada este ano. Maurício Rands, líder do PT, garantiu que a bancada do partido é contra o terceiro mandato: "As regras do jogo não devem ser mudadas". A oposição, mais uma vez, falou em golpe.
A emenda de Ribeiro sugere alteração na Constituição. Ela acaba com a possibilidade de reeleição e amplia o mandato de prefeitos, governadores e presidente de quatro para cinco anos. O texto da PEC, no entanto, não fala especificamente de terceiro mandato nem deixa claro se as mudanças valeriam para quem está no poder. Especialistas acham que não. Como, então, a emenda Ribeiro beneficiaria Nosso Guia? Pela lógica do deputado, e velho amigo do presidente, se a lei for mesmo mudada, o jogo eleitoral começa do zero. Ora, sujeito a regras novas (aí que mora o perigo), o presidente poderia concorrer a um novo mandato, como se nunca tivesse ocupado o Palácio do Planalto. Outra alternativa, segundo defensores da re-reeleição, seria apresentar emendas ao texto para que fique mais claro.
Será que estes senhores pensam que usamos aqueles narizinhos vermelhos, que somos imbecis ou que não estamos em alerta diante dessa armação? Concordo perfeitamente com o blogueiro Ricardo Noblat. Ele acredita que a discussão sobre o terceiro mandato "é uma manobra urdida no Planalto para dividir a atenção da mídia, concentrada no caso do dossiê sobre despesas sigilosas do governo anterior". Noblat lastreou sua teoria na falta de bons candidatos do PT à sucessão de Lula. Afinal, lembrou ainda, o partido já perdeu José Dirceu e Antônio Palocci, abatidos no rastro de escândalos e "outro escândalo, agora, ameaça Dilma Rousseff", acusada pela oposição de estar por trás do dossiê anti-FHC.

Sergio Barra é medico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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