7 de janeiro.
Há exatos 175 anos, portanto no dia 7 de janeiro de 1835, os cabanos tomaram Belém, mataram o então presidente da Província, o português Lobo de Souza, e colocaram no poder o fazendeiro Félix Clemente Malcher.
Era o início da Cabanagem.
Era o início da Revolução Cabana.
Uma revolução em sua essência popular.
Uma revolução que atingiu todos os rincões do Estado - de Belém à região do Baixo Tocantins, de Belém à região nordeste do Estado, de Belém ao Baixo Amazonas.
Uma revolução que uniu - em torno do nacionalismo então nascente e dos anseios de reduzir enormes injustiças sociais - índios, mestiços, negros, brancos sem posses, boa parte do clero e, vejam só, muitos ricaços da época.
Exemplo disso é o próprio Malcher, que era fazendeiro, dono de vastas áreas de terras, mas ficou apenas pouco mais de um mês como presidente cabano da Província do Grão-Pará.
E aí?
E aí que a Cabanagem, como sempre esteve, continua esquecida.
Os paraenses deveriam saber de todos os seus detalhes.
Deveriam contá-los para seus filhos, desde crianças.
Deveriam fazê-los perceber, nos ideais dos cabanos, o orgulho de ser paraense.
Deveriam dar-lhes a conhecer os personagens que ou participaram ativamente da Cabanagem – como Eduardo Angelim e os irmãos Vinagre – ou a influenciaram grandemente, casos de Felipe Patroni e do cônego Batista Campos. Este último morreu no dia 31 de dezembro de 1834, portanto uma semana antes do início da Cabanagem, cujas sementes ele plantou.
Mas que nada!
A Cabanagem, para nove em cada dez paraenses, é quase um palavrão.
Não passa de uma estranheza.
Ou então não passa de um nome, da mera denominação de um monumento esquecido ali no Entrocamento ou do prédio da Assembleia Legislativa. Ou ainda a denominação de um bairro de Belém - dos mais violentos, diga-se - ou de uma vila, a Vila dos Cabanos, em Barcarena.
E assim vamos deixando de lado as nossas melhores memórias.
Exemplo concreto são as ruínas do Murucutu (veja parte dela, na foto do próprio blog), ali pelos lados na Embrapa.
Era um engenho.
Foi lá que morreu Antonio Landi – o arquiteto bolonhês –, que deixou preciosidades arquitetônicas em Belém, a Sé e a capelinha de São João Batista, entre outras.
Foi lá, em agosto de 1835, que os cabanos se reuniram para atacar Belém pela segunda vez e instalar no poder o terceiro e último governador cabano, Eduardo Angelim, que sucedeu Francisco Vinagre.
Há cerca de dois anos, o poster levou um casal de amigos, ambos jornalistas paulistas, até o Murucutu.
Sentiu até vergonha.
Chegou ao portão da Ceasa e perguntou ao porteiro.
- Amigo, como eu faço para chegar ao Murucutu?
- Murucutu...?!
- É. Murucutu...
Por pouco o rapaz não chama a polícia.
Quando adivinhou o que se queria, indicou o lugar.
- O senhor vai por ali. Mas tenha cuidado com as cobras por lá.
Foi assim que ele indicou o rumo daquilo que deveria ser uma das referências da memória histórica de todo belenense, de todo paraense.
É assim que assistimos todos, estupefatos, esvair-se o interesse que deveríamos cultivar pelas nossas coisas.
Mesmo assim, vale lembrar.
Hoje é o dia 7 de janeiro.
Dia da Cabanagem.
Dia em que todos deveríamos sentir orgulho de pisar num solo que os cabanos pisaram.
Dia em que precisamos não perder de vista a nossa própria História.
Aliás, Batista Campos, jornalista e panfletário dos mais destemidos – talvez o mais destemido que já nasceu neste Estado até hoje -, adotou o seguinte como dístico, como divisa, como lema de seu jornal, O Paraense, tribuna da qual vergastava o stablishment da época:
“De circunlóquios nada sei.
O caso conto como o caso foi.
Na minha frase de constante lei,
O patife é patife; o boi é boi.”
Ah, se Batista Campos vivesse ainda hoje!
Ah, se vivesse...!
15 comentários:
Meu amigo, vocês pelo menos conseguiram chegar até as ruínas. E eu, que nem isso? Veja como foi a minha tentativa vã:
http://yudicerandol.blogspot.com/2009/11/murunoteu.html
http://blogflanar.blogspot.com/2009/11/projeto-murutucu-viola-no-saco.html
Se você conhecer algum canal que me permita conhecer o local, agradeço desde já.
Que coisa, hein, Yúdice?
Vou comentar isso amanhã.
Abs.
Amigão, só uma pequena correção para um equívoco bastante comum: o nome correto do engenho é Murutucu. No mais, parabéns pela excelente postagem.
Oi Paulo,
Uma data para se orgulhar e tb para refletir sobre esse silêncio que impera qdo o assunto é cabanagem...nem o tempo resgatou a memória. Que tal o blog passar a divulgar um pouco, cada dia, sobre nossa história, neste mês de janeiro?
Grande abraço.
Mary
Esqueceste de citar Felipe Alberto
Patroni Martins Maciel Parente, meu tio trisavô, pois sem ele a Ca-
banagem não teria existido!!
Abs
Zeca Teixeira
VÔO ENTRE ARMAS I
Era sete de janeiro.
De quando em vez um banzeiro
rebentava na muralha
antecipando a batalha
contra o Forte do Castello
primeiro e mortal duelo
na Belém recém-nascida
precocemente envolvida
em sua casta inocência
nos lençóis da violência.
Era janeiro. Chovia.
Céu escuro, manhã fria
com feição de luto e medo.
vez por outra do arvoredo
um agourento chincoã
engravidava a manhã
com seu canto mandingueiro.
Era sete de janeiro...
Do Piri as verdes margens
escondiam nas ramagens
guerreiros Tupinambá,
angelins do Grão Pará
pintados de amor e guerra,
de revolta e bem querer
para lutar pela terra
ou sobre a terra morrer.
Belém nem tinha três anos
e já registrava os danos
de um batismo a ferro e fogo
no brutal e eterno jogo
entre opressor e oprimido
entre mocinho e bandido
entre balas carniceiras
e taquaras justiceiras,
bordunas de redenção
contra espadas de opressão!
Tomba o grande Guaymiaba,
cacique Tupinambá
e longa noite desaba
sobre Belém do Pará.
Cai por terra Guaymiaba
mas a luta não acaba
naquele triste janeiro.
Em cada peito guerreiro
as sementes da igualdade,
da justiça e liberdade
germinam feito capim
à espera de um dia, além,
que a rosa rubra do povo
desabrochasse de novo
nos canteiros de Belém.
VÔO ENTRE ARMAS II
Manhã sem luz, sem cor, sem poesia...
De quando em vez do matagal se ouvia
o agourento cantar de um chincoã.
Era o sétimo dia de janeiro.
Na muralha o marulho do banzeiro
embalava Belém que ainda dormia.
A história se repete. Nada é novo.
Mesmo palco de luta, mesmo povo
mesmos tiranos, mesmos ideais.
E Guymiaba após duzentos anos
renasce e luta ao lado dos cabanos
fundido ao lema vencer ou vencer!
A luta é desigual: artilharias
contra espingardas, ódio e tirania
contra o ideal e a fome de justiça!
A história desta vez não se repete:
Belém, cansada, nesse dia sete,
adormece nos braços do seu povo.
Com um abraço caboclo do
Antonio Juraci Siqueira
È Murutucu.
Pois é, poster... A Cabanagem foi o que foi e o nosso neoLandi destruiu um muro construído pelos cabanos porque achou que ele tapava a visão de sua obra-prima - que ele, aliás, sequer construiu...
E querem que o PSDB volte ao poder. Com Jatene, lembrem-se, volta Paulo Chaves. Argh!
Caro Juraci,
Lindo poema.
Vou divulgar na ribalta, amanhã.
Abs.
Amigos das 12h40 e das 12h56,
Pois é...
Metade fala Murucutu, a outra metade Murutucu. Como veem, de comum, mesmo, só o "cu" (hehehehe). Tenho que optar.
Optei pelo saudoso, pelo meu grande amigo Carlos Rocque, que na ótima obra dele sobre a Cabanagem sempre escreve Murucutu.
Grande abraço.
Zeca,
Omissão imperdoável, a minha.
Mas já está acrescentado na postagem.
Abs.
Mary,
Ótima ideia.
Abs.
o blog da prof.edilza já está fazendo isto,vai lá
tá excelente
Caro Amigo. Os parauaras estão a precisar de um D.Quixote, a fim de exigir das autoridades ditas "competentes" (talvez porque competem entre si)que se passe a ensinar nas escolas, pelo menos as daqui, do Norte, a História do Grão-Pará, a nossa história, pois que o que se ensina (ensina?) é a do Brasil, ou seja, a do resto do País. Nada se fala sobre a conquista da Amazônia por Pedro Teixeira, sobre a fundação de Belém (e de outras cidades nortistas)- fala-se sim, e a basto, do Rio de Janeiro, de Sam Paulo "a cidade mais importante do Brasil", a redizê-los - enfim a Província do Grão-Pará inexistiu para eles. Aliás, dizem os paulistas que quem conquistou a Amazônia foram "os bandeirantes". E nós nos calamos (quem cala consente). Nosso riquíssimo patrimônio está levando a breca. Isso inclui as ruínas do Murutucu (ambas formas são corretas e até uma terceira, Murucututu)que são, na verdade, da capeka de N.Sra. da Conceição, da lavra do bolonhês. Todo o engenho, onde viveu e morreu Landi, já se foi...É uma lástima.Quanto à Cabanagem, os "fessores" dizem apenas ter sido um "levante de vadios,pobres, pretos e da indiada".Temos que mudar isso! e logo! antes que tudo se acabe. Sérgio Pandolfo
se vcs se indignaram por muitas pessoas nao saberem o q é as ruinas do murutucu ou murucutu(como queiram),imaginem eu q faço faculdade de arquitetura e meu professor disse nunca ouviu falar sobre elas.É triste:(
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