No AMAZÔNIA:
A partir de escutas telefônicas e investigações feitas pela Polícia Federal, o Ministério Público Federal concluiu que o Tribunal de Justiça do Espírito Santo foi transformado em um "balcão de negócios" pelos desembargadores presos anteontem na Operação Naufrágio.
Entre abril e novembro deste ano, a PF identificou 11 situações em que os acusados supostamente cometeram crimes de corrupção, advocacia administrativa e exploração de prestígio. Segundo a transcrição de um dos grampos autorizados pela Justiça, o desembargador Josenider Varejão Tavares, detido anteontem, diz, após supostamente ter realizado uma negociata: "Sem falsa modéstia, isso aí, abaixo de Deus, nós é que botamos para quebrar".
Para a Procuradoria, os delitos não seriam possíveis sem a participação do presidente do TJ, Frederico Guilherme Pimentel, e dos seus parentes: duas filhas e a cunhada do filho, que trabalham no tribunal, e o filho e nora dele, que são juízes de primeira instância.
Um dos delitos que impressionaram os investigadores é a venda da concessão de uma liminar para reconduzir ao poder o prefeito de Pedro Canário (norte do Estado), Francisco José Prates de Matos (PMDB), afastado em 2007 sob acusação de ter fraudado licitações.
Para a PF, interceptações telefônicas permitiram concluir que o dinheiro da propina seria obtido a partir de desvios de recursos públicos, pois Matos pretendia voltar ao cargo para "abrir o cofre" do município.
A liminar foi concedida pelo desembargador Tavares, e o prefeito reassumiu o cargo em outubro passado. Tavares já teria recebido R$ 20 mil do valor total do suborno, que seria de R$ 43 mil, de acordo com a PF.
A suposta propina teria levado o desembargador a prometer um presente para a mulher. Segundo uma transcrição, Tavares disse a ela: "O carro, você sabe que vai ganhar (...) Então com isso aí não precisa se preocupar, inclusive eu não ia te falar, recebi mais 20 mil hoje". Conforme a PF, o intermediário da venda da decisão foi o advogado Paulo Guerra Duque, filho do desembargador Elpídio José Duque. Ambos foram presos anteontem sob a acusação de participar da quadrilha.
"Negócio da família"
Para a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, o "clã judiciário Pimentel" tratou a criação de um cartório cível em Cariacica (ES) como um "negócio da família". A exploração dos serviços de cartórios é concedida a particulares por meio de concursos públicos e, em geral, resulta em lucros significativos para os vencedores.
O presidente do TJ criou o cartório a partir de uma resolução em 21 de julho deste ano e nomeou, em caráter provisório, um "laranja" da família Pimentel, segundo a PF. Os grampos das investigações mostram que a família Pimentel passou a brigar entre si pela divisão do lucro. O juiz Frederico Luís Pimentel, filho do desembargador, também preso, teria dito: "Ou vai ser coisa de irmão ou vai ser coisa de inimigo".
Bárbara Sarcinelli, cunhada do juiz e chefe do setor de distribuição de processos do TJ, teria falado com o magistrado de forma cifrada sobre a cota dela nos lucros: "Oh, no meu bolo tá descompleto [sic], tá?
Meu bolo de chocolate." O juiz teria respondido que para ela haveria "89 pedaços de bolo". A servidora teria então indagado: "E por quê? Não pode ser cem, não?". O juiz respondeu: "Não, não, é sempre o mesmo número para cada irmão", segundo transcrições das escutas.
O Ministério Público Federal pediu ao Superior Tribunal de Justiça o envio do inquérito ao Conselho Nacional de Justiça, por entender que foi criada uma "máquina de nepotismo" no TJ capixaba, que pode ter fraudado concursos no Judiciário local para o ingresso de parentes de membros da quadrilha em cargos importantes.
Os magistrados e advogados presos em Vitória chegaram anteontem a Brasília por volta de 21h e foram distribuídos entre o alojamento da Secretaria da Segurança Pública do Distrito Federal, na qual ficaram os três desembargadores, o juiz e a diretora de distribuição do TJ, e o Departamento de Polícia Especializada da Polícia Civil do Distrito Federal, onde ficaram os dois advogados.
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