Por Ruy Samuel Espíndola, é advogado, Professor de Direito Constitucional da Escola Superior de Magistratura de Santa Catarina e Mestre em Direito Público pela Universidade Federal de SC, sócio da Espíndola & Valgas, Advogados Associados, com sede em Florianópolis/SC
O julgamento ocorrido (5 x 5) nos dias 22 e 23 de setembro de 2010 em torno da aplicação ou não da “Lei Ficha Limpa”, no caso do recurso do então candidato Joaquim Roriz ao governo do DF, na mais Alta Corte do País, o Supremo Tribunal Federal, está se dando entre moralistas e constitucionalistas.
Os moralistas seriam aqueles magistrados que olhando para a nossa Constituição e para a cena política brasileira, encontram no princípio da moralidade administrativa, no princípio da probidade, na idéia de vida pregressa ilibada para candidatos, o maior valor a ser perseguido em uma eleição. Para esses ministros, tais princípios, somados ao cânone de proporcionalidade entre bens em conflito (direitos individuais x moralidade), são os principais critérios que devem balizar toda a produção das leis, especialmente uma lei que defina o processo de escolha dos candidatos, através da fixação de hipóteses de inelegibilidades.
Tais posturas jurídicas são alimentadas pelo sentimento geral da população (e o alimentam em retorno) de descontentamento com a classe política, que é tratada e avaliada não pela média ou excelência de seus representantes, mas sim pelos piores exemplos conhecidos midiaticamente (Paulo Maluf, Eurico Miranda, Jader Barbalho, Joaquim Roriz, etc). Os raciocínios moralistas partem de particularidades para chegarem a generalizações nada animadoras: se alguns são tão vis e indignos, é preciso todos cuidarem de todos, pois muito mais o serão! O homem é o lobo do homem (Hobbes)! A lei eleitoral deve ser preventiva de improbidades! A presunção reinante é a de desconfiança do candidato e da não confiança na capacidade de escolha do eleitor... Por tais razões, que a Justiça Eleitoral, que juízes filósofos (Platão), decidam quem deve dirigir as cidades e seus governos! A vontade popular deve ser tutelada pela vontade judicial, essa última orientada pela vontade do legislador.
Os constitucionalistas, por sua vez, são aqueles ministros que veem na Constituição um limite ao exercício arbitrário de poderes públicos ou privados. Para esses a Constituição tem um sistema de direitos fundamentais que deve ser observado na feitura de leis, sem qualquer exceção para as leis eleitorais. A vontade de Constituição é o fiel da balança a regrar a vontade popular, a vontade do legislador e a vontade judicial. Para esses magistrados, entre os direitos fundamentais respeitáveis em qualquer produção do Legislativo ou do Judiciário está a segurança jurídica, a não retroatividade das leis, a presunção de inocência, a razoabilidade da ação legislativa punitiva, o limite anual para incidência de leis novas que alterem o processo eleitoral. E mais: o sagrado direito de receber votos, de candidatar-se, de disputar um mandato público é tão importante quanto qualquer direito fundamental como é o de votar; é tão relevante para o regime democrático como a liberdade de ir, vir e ficar é para qualquer regime afastado da barbárie e que caminha rumo ao avanço civilizatório.
Esses ministros constitucionalistas se sustentam na razão (Voltaire), expressa na razão jurídico-constitucional, para ditarem seus comportamentos e suas decisões judiciais. Para eles uma Constituição é importante também para as minorias e para conter a fúria e a paixão das maiorias, que, em dados momentos históricos, podem, sem freios constitucionais, desencadear involuções ao argumento de estatuírem progressos.
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