domingo, 21 de junho de 2009

Será o fim da classe média?


Um mundo em ebulição foi o que nos ofereceu 1968, o ano zero de uma nova era: os estudantes tomam as ruas de Paris; a luta pela liberdade na Primavera de Praga; contracultura e movimento negro nos Estados Unidos e o combate à ditadura no Brasil. Em um planeta dividido em dois lados pela Guerra Fria, mas unido pelo medo do apocalipse nuclear e conectado pela televisão que o transformava em aldeia global, o ritmo da vida se acelerava entre protestos e assassinatos surpreendentes.
O ano I da globalização? Nos Estados Unidos, manifestações contra a guerra do Vietnã e o racismo dividiram o país, que elegeu o conservador Richard Nixon para a Casa Branca. No México, dois meses de conflitos entre o exército e estudantes quase impediram a realização das Olimpíadas no país. No Reino Unido, a Swinging London era a capital do rock e da psicodelia. A cidade dos Rolling Stones, dos Beatles e da modelo Twiggy, também teve protestos contra a guerra e a ocupação de Oxford e da London School of Economics. Na França, Paris foi o centro de protestos europeus de 1968. O movimento que uniu estudantes e trabalhadores quase derrubou o governo. No Vietnã, o conflito entre o norte do país, comunista, e as tropas dos Estados Unidos no sul chegava a um impasse. Em 1968, ficava claro que a superpotência não poderia vencer o conflito. No Brasil, o último ano antes da decretação do AI-5 e do endurecimento do conflito entre ditadura e luta armada foi marcado por manifestações civis e ocupação de universidades em São Paulo, Rio, Brasilia, Curitiba, Pará etc.
Apesar da interpretação mágica de todos esses momentos, das dificuldades que essa geração enfrentou e passou para essa nova turma de novos jovens tantos ensinamentos, eles parecem infelizes, sofredores, menos capazes, improdutivos e os que racionam com outra lógica.
Um estudo divulgado no mês passado pela Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, mostrou que, embora o patamar de felicidade de homens e mulheres tenha despencado nas últimas décadas, "o bem-estar subjetivo" feminino foi o que mais caiu. O resultado surpreende, pois a mesma pesquisa, quando feita nos anos 1970, apresentava as mulheres com níveis de felicidade bem maiores. O que aconteceu de lá para cá?

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“Caçada pela crise, atacada por baixas remunerações, cercada por dívidas, a classe média estaria em vias de extinção?”
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Ninguém sabe com certeza. Mas sempre podemos especular. E muitos ofereceram um punhado de teorias. Será que as conquistas do feminismo podem ter levado a uma maior infelicidade? Talvez, quem sabe apontar para a desestigmatização da mãe solteira, que "ameaça os interesses e a felicidade das mulheres".
Com os homens não foi tão diferente. Surgiu a chamada geração rebelde, irreverente, que com a liberação da camisinha, o sexo casual e o consumo de drogas (principalmente o LSD e a heroína), o namoro considerado "sério" que sempre levava ao casamento, deixou aquele glamour dos anos 1940-50 e faz se sentirem perdidos. Em consequência, infelizes.
Mas, como todas as outras explicações, essa também é muito fácil, ligeira demais, embora possa ter sua parcela de verdade. E como muitas pessoas destacaram, "felicidade" é uma abstração e pode simplesmente desafiar a medida quantitativa. Então por que é tão difícil resistir a tentar adivinhar por que somos tão infelizes? Talvez porque essa postura seja um esporte internacional.
Será o fim da classe média? Com diploma, mas salários baixos, jovens empobrecem. Caçada pela crise, atacada por baixas remunerações, cercada por dívidas, a classe média estaria em vias de extinção? É o que acreditam sociólogos, economistas e, mais do que isso, é o que confirmam as estatísticas. Em artigo no Jornal El Pais, Ramon Muñoz afirma: "A classe média está em perigo ou, no mínimo, em queda livre. Como os dinossauros, esta classe social ainda domina, mas a atual recessão poderia varrê-la da face da Terra".
Seus atuais integrantes estariam se transformando em "mileuristas", termo forjado pela estudante Carolina Alguacil em carta ao jornal espanhol em 2005. Nela definia seu estado, semelhante ao de muitos outros: jovem com diploma universitário, pós-graduação, domínio de idiomas estrangeiros... que não ganha mais do que mil euros por mês. E que gasta um terço do salário em aluguel, não economiza, não tem casa, carro ou filhos. Atualmente, o fenômeno mileurista não afeta somente os jovens. Inclui trabalhadores manuais qualificados, imigrantes, empregados e profissionais de meia idade que foram expulsos do mercado de trabalho. No Brasil, não é diferente.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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