quarta-feira, 7 de outubro de 2020

Unidade técnica do TCE listou 13 "irregularidades graves" em contratos suspeitos da Sespa. E disse que Beltrame ignorou pedido de inspeção.

A 6ª Controladoria de Contas de Gestão (CCG), unidade técnica do Tribunal de Contas do Estado (TCE), encontrou nada menos do que 13 "irregularidades graves" em quatro contratos celebrados pela Secretaria de Estado de Saúde do Pará (Sespa) com organizações sociais, para a construção de hospitais de campanha destinados ao combate à pandemia do coronavírus Covid-19.

As irregularidades são enumeradas, uma por uma, em representação formulada no mês de agosto deste ano, pela Secretaria de Controle Externo do Tribunal, pedindo a suspensão dos pagamentos às organizações sociais selecionadas pela Sespa.

No dia 11 de agosto passado, a Corte, por unanimidade, aprovou o deferimento da cautelar inaudita altera pars (ou seja, quando é concedida sem ouvir-se a parte demandada ou requerida), numa sessão que está integralmente gravada e disponível no canal do TCE no YouTube.

Depois que os pagamentos foram suspensos, a Sespa ingressou no TCE com um pedido de desbloqueio dos contratos, aprovado sem julgamento de mérito no último dia 29 de setembro, mesmo dia em que a PF, com o auxílio da Controladoria Geral da União e autorização do Superior Tribunal de Justiça (STJ), deflagrou a Operação SOS, justamente para apurar fraudes relativas aos contratos.

Julgamento na íntegra - A sessão do dia 11 de agosto apreciou vários outros processos e teve a duração de mais de quatro horas. No vídeo acima, você já pode assisti-la a partir do momento em que a relatora do processo, conselheira Rosa Egídia Lopes, de forma objetiva e clara, passa a expor durante cerca de 20 minutos seu voto, favorável à suspensão do pagamento dos contratos, para preservar o erário do estado de graves e o interesse público, de graves prejuízos. O posicionamento da relatora foi acompanhado à unanimidade pelos demais conselheiros.

Rosa Egídia ressalta que, mesmo diante de urgências deflagradas pela pandemia, a adoção de medidas para combater seus duros efeitos, como a construção de hospitais de campanha, não isentaram o gestor público de "justificar de maneira específica a necessidade do emprego dos recursos utilizados, ônus do qual os interessados não se desvencilharam".

Irregularidades - O voto da conselheira foi consubstanciado em relatório de inspeção ordinária que a 6ª Controladoria de Gestão de Contas fez no segundo trimestre deste ano. Os "achados" (termo empregado na manifestação de Rosa Egídia) que a inspeção da CCG evidenciou são 13: irregularidades na formalização dos processos, divergência na publicação; ausência de documentos que comprovem regularidade fiscal e trabalhista e a qualificação técnica, econômica e financeira; ausência da razão da escolha das contratadas e indícios de direcionamento ilícito nas contratações; possível ocorrência de pejotização na execução dos contratos; ausência de critérios objetivos para a estimativa do custo das contratações; indícios de que não houve estudo técnico-base para estabelecer os quantitativos de leitos das contratações; ausência dos inventários dos bens patrimoniais e termos de cessão de uso; ausência dos regulamentos de compras, contratação de serviços e obras e regulamentos de seleção de pessoal; ausência de designação de comissão fiscalizatória; compromisso de despesa sem prévio empenho; descumprimento da transparência prevista na Lei 13979/2020; sobrepreço na montagem dos hospitais de campanha e desproporcionalidade na aquisição dos bens.

Acusações a Beltrame - A 6ª CCG, conforme mencionado pela relatora em seu voto, descreveu as enormes dificuldades com que se defrontou para fazer a inspeção, solicitada por ofício enviado à Sespa no dia 13 de maio, quando ainda era secretário Alberto Beltrame, que em junho viria a ser alvo de buscas e apreensões (inclusive de seu grande acervo de obras de arte) durante a Operação Para Bellum, do que resultou seu pedido de afastamento do governo.

O então secretário, segundo a unidade técnica do TCE, ignorou solenemente os pedidos de informações e cessão de documentos que permitiriam uma análise preliminar sobre a regularidade, legalidade, economicidade e legitimidade dos contratos, obrigando a 6ª Controladoria de Contas de Gestão a valer-se de documentos que haviam sido colhidos por uma comissão integrada por várias órgãos de controle e criada por decreto estadual, para acompanhar medidas adotadas pelo governo do estado referentes ao enfrentamento da pandemia.

Aliás, em relação a essa comissão, a 6ª CCG lembra na representação que o MP do Pará e o MP Federal decidiram se retirar, por entenderem que iniciativas de natureza fiscalizatória não poderiam ser feitas plenamente, já que não estava sendo possível o "acesso tempestivo a documentos essenciais".

A CGC, segundo mencionou a relatora em seu voto, avaliou que a conduta da Sespa, ao negar-se a prestar informações e ceder documentos capazes de viabilizar ações fiscalizatórias, "compromete o papel fiscalizador do TCE, afetando a presteza e celeridade com que deve se dar a fiscalização das contas públicas", sobretudo durante a pandemia.

Na representação que formulou à Corte, a 6ª CCG sugeriu várias providências, inclusive o encaminhamento dos processos relativos aos quatro contratos ao MP do Pará, ao MP do Trabalho, à Receita Federal e à Secretaria de Fazenda do Pará.

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