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Lula, no momomento da declaração sobre a "armação" de Moro: a primeira consequência é desacreditar o trabalho da PF, elogiado inclusive por um ministro do governo Lula. |
O presidente Lula tem todos os motivos, tem todas as razões do mundo para alimentar profundas e, talvez, insuperáveis rejeições pessoais a Sergio Moro, ex-juiz e atualmente senador.
O presidente Lula precisa, no entanto, discernir até que ponto suas reações ou suas demonstrações inequívocas de repulsa ao ex-juiz que o condenou poderão chegar a um ponto de desacreditar o próprio governo Lula.
Durante a era fascista de Bolsonaro, aqui se escreveu em várias oportunidades que o maior inimigo do governo Bolsonaro era o próprio Bolsonaro, um maluco mal diagnosticado, que comandou um dos governos mais corruptos e desumanos da história do Brasil.
Deploravelmente, convém reconhecer que Lula está sendo o maior inimigo do governo Lula.
Há uns dez dias, o presidente, acertadamente, reuniu se ministério e deu, publicamente, um puxão de orelha em todos os seus ministros. Basicamente, proibiu-lhes de ter protagonismo individual e exigiu que as iniciativas de cada um sejam, obrigatoriamente, combinadas com o próprio governo, por meio da Casa Civil, antes que sejam divulgadas.
Ou seja: Lula estava exigindo que o governo esteja em sintonia com o próprio governo. Do contrário, é o desgoverno. Mas, ao que tudo indica, o presidente não está seguindo o que ele mesmo cobrou.
Nesta quinta-feira (23), Lula deu a seguinte declaração, ao comentar uma operação da Polícia Federal que desbaratou um esquema para matar várias autoridades, inclusive Moro:
"Eu não vou falar porque eu acho que [a ameaça da organização criminosa] é mais uma armação do Moro. Mas eu quero ser cauteloso, eu vou descobrir o que aconteceu. É visível que é uma armação do Moro. Mas eu vou pesquisar, eu vou saber o porquê da sentença".
Um dia antes, portanto na quarta-feira (22), o governo Lula, pela voz do ministro da Justiça, Flávio Dino, disse o seguinte sobre a mesma operação:
"Fico espantado com o nível de mau-caratismo de quem tenta politizar uma investigação séria, que é tão séria que foi feita em defesa da vida e da integridade de um senador que é oposição ao nosso governo".
Ao fulanizar a operação da PF, centrando-a apenas na figura de Moro, Lula prestou quatro grandes desserviços ao seu próprio governo:
Primeiro, levantou a bola para os lavajatistas matarem no peito, arriarem no terreno e fazerem um gol de placa, resgatando o ex-juiz Sergio Moro para o patamar dos heróis.
Segundo, desacreditou o trabalho da Polícia Federal, cujas investigações, juntamente com o Ministério Público, carrearam para os autos do processo toneladas de provas - vídeos, fotos, interceptação de conversas e outros documentos.
Terceiro, descredenciou seu próprio ministro da Justiça, que classificou de "investigação séria" o trabalho da PF.
Quarto, levantou uma suspeita gravíssima sem dispor de qualquer prova, a mesma postura de Bolsonaro, o mentiroso, o debochado e o despeitado compulsivo. Quem disse que Lula levantou uma suspeita sem prova? O próprio Lula, nesta declaração: "Mas isso, a gente vai esperar. Eu não vou ficar atacando ninguém sem ter prova. Eu acho que é mais uma armação, e se for mais uma armação ele vai ficar mais desmascarado ainda".
Eis aí, configurado, um caso emblemático de uma situação em que os rancores pessoais de Lula não podem contaminar e muito menos desacreditar seu próprio governo.