No AMAZÔNIA:
O adolescente pernambucano que teve o primeiro caso comprovado de cura da raiva no Brasil deixou ontem a UTI (Unidade de Tratamento Intensivo), segundo o médico responsável pelo tratamento, Gustavo Trindade Filho, e foi para a enfermaria do Hospital Universitário Oswaldo Cruz, em Recife, onde vem sendo tratado há 116 dias.
Marciano Menezes da Silva, que agora tem 16 anos, está consciente, emite alguns sons, interage com as pessoas e não corre mais risco de morrer pela infecção contraída por uma mordida de morcego, em setembro de 2008. A transmissão aconteceu no município de Floresta (439 km de Recife, no sertão pernambucano), onde ele mora com a família em uma casa de taipa (de madeira e barro).
O sucesso aconteceu no Hospital Universitário Oswaldo Cruz, ligado à Universidade de Pernambuco, no Recife. O adolescente estava internado desde outubro do ano passado.
Para obter o sucesso, o grupo de médicos do qual Trindade faz parte seguiu os passos do americano Rodney Willoughby, dos CDC (Centros de Controle de Doenças), que, em 2004, conseguiu tratar uma paciente com sucesso.
Normalmente, os acometidos por raiva - doença de origem viral transmitida em geral por mordidas de animais - podem ser protegidos profilaticamente, quando tomam vacina e soro logo após o incidente que teria ocasionado a transmissão do vírus. Mas quando esse sistema não é bem aplicado (como foi o caso de Marciano Menezes), a doença se desenvolve, causando inflamações no cérebro e na medula. Quando isso acontece, a regra é o paciente morrer.
Com base em casos documentados em humanos e experimentos em animais, Willoughby desenvolveu um protocolo para tentar salvar os pacientes. Num primeiro momento, ele dava um sedativo forte e um medicamento antiviral. 'O sedativo tinha por objetivo, reduzir ao máximo a atividade do cérebro', conta Trindade. 'Já o antiviral servia para ajudar o corpo a combater o vírus no organismo.'
Na paciente tratada por Willoughby em 2004, a estratégia funcionou. O vírus foi eliminado do organismo, mas os testes revelaram que uma substância importante no sistema nervoso, a biopterina, aparecia em baixa quantidade no organismo. O americano então concluiu o tratamento injetando o composto, para que ela tivesse maior chance de recuperação.
Os médicos brasileiros fizeram basicamente a mesma coisa: deram antivirais e sedativos. Após o fim da infecção, despacharam uma amostra do líquido que envolve a medula e o cérebro de Menezes para os EUA, a fim de que se fizesse a medição da presença de biopterina e se decidisse pela dosagem ideal para o adolescente.
Feito isso, o tratamento de Menezes foi concluído. A combinação de medicamentos permitiu que o corpo de Menezes vivesse mais e ganhasse mais tempo para eliminar completamente o vírus da raiva do organismo.
Os testes confirmam o sumiço de todo traço do patógeno. Resta saber agora as sequelas que serão enfrentadas pelo menino. Como a doença afeta o sistema nervoso, é possível que ele tenha sofrido severos danos.
'No lado cognitivo, ele já está dando sinais de recuperação', diz Trindade, ao contar que ele já responde perguntas simples, que exijam 'sim' ou 'não'. Mas a preocupação maior é a de recuperação dos movimentos. Ele precisará fazer fisioterapia para ajudar a recuperar o controle dos braços e das pernas. De toda forma, ele agora está livre da doença e fora de perigo.
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