segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Um estupro à memória. Uma atrocidade histórica.

Paulo Chaves, secretário de Estado de Cultura sobre o abandono do memorial: "Eu acho um
desrespeito ao patrimônio público" (foto de Roberto do Vale/O LIBERAL)

É quase inacreditável - verdadeiramente inacreditável - que se mantenham impunes todos os que, na administração municipal de Belém, contribuíram com ações ou omissões para que o Memorial Magalhães  Barata, em São Brás, chegasse ao ponto a que chegou.
O ponto a que chegou um patrimônio público concebido para imortalizar, na memória dos paraenses, um dos seus maiores expoentes históricos, o ex-governador Magalhães Barata, está perto do limite intangível da mais criminosa tolerância, numa terra que tolera, sem tugir nem mugir, desrespeitos impressionantes por sua própria memória.
Chegou-se a um ponto em que o memorial, destruído, arrasado, deteriorado, abandonado e desprezado, tornou-se devassável a vândalos, larápios e desocupados, como os que perambulam no entorno do memorial.
Até que um deles, arrombando a porta de entrada, acessou a cripta e violou nada mais, nada menos do que a urna funerária que guardavam os restos mortais do ex-governador, que ficaram, acreditem, espalhados pelo chão.
O que disse a Fumbel, o órgão municipal que se pronunciou sobre essa atrocidade histórica?
A Fumbel explicou que o invasor do memorial foi preso e responderá pelo crimes que cometeu.
Explicou que o que foi recuperado dos restos mortais que ficaram pelo chão deverá ser levado para o Cemitério de Santa Izabel, ouvindo-se familiares de Barata sobre o que fazer com seus despojos.
E, por último mas não menos importante, explicou o órgão municipal que, uma vez arrombada a porta, agora tenta-se remediar o abandono do memorial, recuperando-o sabe-se lá até quando, para que venha a ter condições de servir à destinação original para o qual foi projetado e construído, ainda no governo Hélio Gueiros.
Só?
Tudo vai ficar por isso mesmo?
Todos vamos nos conformar com esse estupro à memória de Belém, do Pará?
Todos vamos nos quedar, impassíveis e conformados, com essa vilania contra a memória de um homem que marcou época na história do Estado?
Todos vamos acreditar que os guardiães de elementos históricos dos mais relevantes não terão que responder, perante as instâncias apropriadas, pela desídia, pela negligência e inapetência em cuidar, pelo menos razoavelmente, de um patrimônio que foi legalmente afetado pelo Estado ao município de Belém, sem que o município de Belém tenha se dado conta, ao que parece, da relevância histórica daquilo que tem em mãos?
Não acreditemos nessas milongas, que, como boas e espertas milongas, não merecem crédito.
Não acreditemos nessas explicações burocráticas, que pretendem eximir o município de Belém, mais precisamente a Fumbel, de responsabilidades que são suas, exclusivamente.
Aliás, e por oportuno, o Espaço Aberto publica abaixo matéria que O LIBERAL publicou, em sua edição de ontem, repondo nos seus devidos, justos e justificados termos a informação de que a Secretaria de Estado de Cultura não tem nada, absolutamente nada a ver com essa atrocidade.
Reponham-se nos seus devidos termos a certeza de que, como ressaltou o titular da secretaria, Paulo Chaves, configura um imperdoável desrespeito ao patrimônio relegaram o Memorial Magalhães Barata a coisa excrementosa, a coisa menor que o lixo.
Abaixo, a matéria que O LIBERAL publicou com o secretário Paulo Chaves.

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“Eu acho um desrespeito ao patrimônio público, por parte de quem tem ou deveria ter a responsabilidade de cuidar dele, de mantê-lo”. As observações a respeito do atual estado de abandono do monumento Memorial Magalhães Barata, no bairro de São Braz - e que recentemente foi alvo de vandalismo - são do titular da Secretaria Estadual de Cultura (Secult) do Pará, Paulo Chaves. Em 2004, foi ele quem esteve à frente do processo de catalogação do acervo do ex-governador Magalhães Barata e da reforma do Memorial antes que o espaço fosse cedido para ser administrado pela Prefeitura de Belém. O contrato de cessão do Estado com o município termina em 2014, mas pode ser prorrogado por mais dez anos. Caso contrário, a prefeitura deverá comunicar por escrito ao governo a sua intenção de não renovar o contrato com pelo menos um ano de antecedência.
O secretário esclarece ainda que o termo de permissão de uso, firmado no dia 30 de março de 2004, entre o governador Simão Jatene com o então prefeito de Belém Edmilson Rodrigues, foi feito a pedido do próprio município por ocasião do projeto de revitalização da praça da Leitura, onde foi erguido o memorial.
A ideia era de que fosse implantado naquela área um espaço aberto à visitação pública, de acesso à cultura e à informação sobre o município de Belém, no qual fossem disponibilizados acervo bibliográfico, aúdiovisual e cartográfico em meio digital e acesso à tecnologia da informação.
Pelo acordo firmado, caberia ao município a responsabilidade pela limpeza do memorial, dos equipamentos utilizados, manutenção, segurança e conservação, bem como dos danos de qualquer natureza causados a terceiros em decorrência da utilização do bem.
O secretário ressalta que, antes de ceder o espaço, foi feita a reforma completa do prédio, inclusive, com a catalogação museológica do acervo, com identificação, higienização e tratamento das peças. Todo este trabalho resultou ainda na publicação do caderno do acervo do Sistema Integrado de Museus (SIM), intitulado “Magalhães Barata”, e que foi publicado pela Secult, em 1999. Dentre o material catalogado, estavam objetos pessoais do ex-governador, cartazes de campanha e insígnias.
Paulo Chaves também reforça que não é da Secult a responsabilidade sobre a conservação do espaço. “Isso é uma inverdade. Vejo isso como uma tentativa de linchamento, uma injustiça, quando a principal obra sobre a história e a vida de Magalhães Barata já publicada, foi encomendada por mim”, afirmou o secretário, referindo-se à biografia “Magalhães Barata - o homem, a lenda, o político”, do jornalista Carlos Rocque, publicada pela Secult, em dois volumes, nos anos de 1999 e 2006. “Não posso ser responsabilizado pelo que aconteceu agora. O que eu tinha que fazer, eu fiz, até a entrega do monumento. Pela condição contratual a responsabilidade de administrar o espaço é toda da prefeitura”, afirmou.
Ele reforça ainda que, desde que esteve à frente da Secult, sempre buscou manter viva esta parte da história do Pará. O legado de Magalhães Barata está presente, por exemplo, no livro “Parque da Residência”, publicado pela Secult, em 2000; nas fotos expostas no Restô do Parque; no documentário Magalhães Barata, dirigido pelo próprio Chaves, nos anos 90; na recuperação do Cadillac, modelo dos anos 50, que pertenceu ao político; no acervo que hoje está abrigado no Palácio Lauro Sodré; e mais recentemente, na aquisição de um medalhão, atribuído a Barata, e que foi doado ao Museu do Estado do Pará. O vagão que ele usava nas campanhas políticas e que fica exposto no Parque da Residência está em fase de restauração completa.
“Independente da posição ideológica, do que eu penso, fiz porque ele é um homem importante para história do Pará, num período importantíssimo que é a fase getulista, primeiro como intendente, interventor, depois como governador eleito pelo povo. Isso é profanar a história? Acredito que não”, afirmou.
Em nota encaminhada a O LIBERAL, a Prefeitura de Belém informa que os funcionários do cemitério municipal de Santa Izabel, localizado no bairro do Guamá, estiveram na tarde da última quinta-feira, 13, no Memorial Magalhães Barata, em São Braz, para realizar a retirada dos restos mortais do ex-governador do Estado. O procedimento teve que ser efetivado em função da violação do monumento por vândalos. Na ocasião, os servidores fizeram a substituição do caixão onde os despojos de Barata foram depositados.
A nota informa ainda que “a equipe composta por quatro pessoas, dentre eles um coveiro e o administrador do Santa Izabel, Orlando Trindade, aguarda agora liberação da família e do Governo do Estado para remoção e transferência do ossuário para o jazigo dos Barata na necrópole de Santa Izabel, na avenida José Bonifácio.Enquanto o traslado não é autorizado, o caixão permanecerá na urna do memorial, que recebeu os devidos reparos para garantia da conservação e da segurança do ossuário”, conclui a nota.

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