terça-feira, 11 de setembro de 2012

Sobre a guerra de torcidas no julgamento do mensalão


Por CHICO BICUDO

O julgamento do "mensalão" no Supremo Tribunal Federal (STF) transformou-se definitivamente em mais um capítulo da acirrada disputa de torcidas que marca o atual empobrecido cenário político brasileiro. As arquibancadas foram ocupadas e tomadas de assalto pelas duas organizadas, a pular freneticamente, a agitar bandeiras e a entoar gritos de guerra.

No final da semana passada, um lado estourava rojões e comemorava efusivamente o voto do ministro Ricardo Lewandowski (uma espécie de capitão de uma das alas), que isentou de culpa o deputado federal João Paulo Cunha (PT/SP); vindos desse espaço no estádio, só se ouviam elogios incontidos à Corte máxima brasileira e salvas de palmas ao "amadurecimento da democracia nacional".

Enquanto isso, a outra metade do estádio não escondia expressões raivosas, chutava cadeiras e se apressava a denunciar "o STF como a vergonha do Brasil", entendendo que Justiça só seria feita com julgamento sumário, tribunal de exceção, quase a exigir prisão perpétua (quiçá pena de morte) em presídio em uma ilha distante e perdida para todos os envolvidos no escândalo. Qualquer veredito que escapasse dessa demanda seria entendido como "frustrante, tudo terminou mesmo em pizza".

Pois o jogo é dinâmico, o curso da disputa mudou – e, com ele, o rumo da prosa foi também drasticamente alterado. Hoje, depois dos votos dos ministros Carmen Lúcia, Rosa Weber e Luiz Fux (a primeira, indicada pelo ex-presidente Lula; os outros dois, indicados pela presidenta Dilma Rousseff), que acompanharam o relator Joaquim Barbosa (o capitão da outra equipe), a metade do estádio que se derretia em elogios acusa duramente o STF de "fazer o jogo da mídia grande", de "ceder às pressões da opinião pública", de "não julgar de acordo com as provas e de criar precedentes perigosos". Em comportamento às avessas, para esses torcedores, é como se Justiça só pudesse ser alcançada com a absolvição incondicional de todos os réus, como se ao STF só coubesse a tarefa de oferecer a todos os denunciados atestados incontestes de inocência.

A festa agora move a outra metade do campo, os que passaram o final de semana de péssimo humor, que abrem largos sorrisos para, sem pudor ou constrangimentos, jogando para debaixo do tapete as críticas que faziam até então, derreterem-se em palavras graciosas e adjetivos para ressaltar a atuação "sublime, perfeita, independente e republicana" do Supremo.

Ao que tudo indica, assim seguiremos até o final do julgamento. Cada voto será comemorado como um gol – e o outro lado vai se apressar a indicar alguma irregularidade no tento, um impedimento de um jogador, uma falta cometida no meio do campo, algum objeto atirado no gramado pela torcida adversária...

Como anunciaria o genial e saudoso locutor Fiori Gigliotti, "abrem-se as cortinas"... E "o show deve continuar", completaria o também genial e saudoso Freddie Mercury.

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Francisco Bicudo é jornalista e professor de Comunicação Social.
Artigo disponível no Correio da Cidadania

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