quarta-feira, 26 de setembro de 2012
Eleitor ficha limpa
A decisão de uma eleição está nas mãos do eleitor. Apesar de toda a influência que candidatos exerçam, a palavra final é mesmo de quem, secretamente, exerce o voto. Portanto, não é tão determinante a situação moral dos concorrentes. O conceito de candidato ficha suja é algo relativo. Apesar dos critérios objetivos da legislação aplicável ao caso, a interpretação judicial ou administrativa que admite os futuros mandatários é subjetiva. Subjetiva porque é fruto do pensamento de alguma autoridade ou colegiado. Além disto, existem candidatos com a ficha limpa e a alma suja. Purificaram-se para pular os muros. Hoje, santinhos; amanhã, demônios da democracia. Quem sabe?
Para mim, a questão de uma eleição limpa se resolve mesmo na ponta maior dessa relação eleitoral, das pessoas que podem dizer sim ou não. Uma questão de proporcionalidade: é um contra centenas, milhares e até milhões. É claro que não podemos esquecer o item conscientização política. Pessoas menos instruídas, em tese, são mais manipuláveis. Quem está na linha da pobreza é mais vulnerável a vender o seu voto. Segundo estudiosos, isso explica alguns bolsões de miséria no Brasil, verdadeiros exércitos de reserva. Mas, se trabalharmos com a noção de um país como um todo, não é bem assim. Temos grandes avanços na área da educação. O Ideb, índice que mede nossa formação básica, está em alta. Então, vejamos algumas qualidades de um eleitor ficha limpa.
Eleitor ficha limpa não vota por causa de música. Samba, brega e carimbó identificam a cultura brasileira, mas não se trata de concurso musical agora. Todo eleitor ficha limpa é meio surdo para esse tipo de coisa. Nada de show no rádio e na TV. Eleição é coisa séria para ele. Por isso, se possível, o eleitor ficha limpa troca o áudio pela legenda. Ele quer saber de propostas. Propostas consistentes. Factíveis. O mesmo se aplica à dramatização, à comédia e qualquer outro gênero de arte que não trate a política com a objetividade que ela requer. Eleitor ficha limpa foge dessas emoções. Ele quer o olho no olho, o confronto com a forma de pensar de seu candidato. Nas últimas eleições, o Pará teve verdadeiros hits eleitorais. Sucesso na boca do povo. Triunfantes. Pareciam música de igreja, marchinha de clube. Pareciam música pátria, de causar inveja à Marselhesa. Depois, veio o réquiem.
Eleitor ficha limpa não vota porque outros votam. Ele vota porque pensa e reflete. O voto é dele, assim como é dele seu corpo e sua alma. Personalíssimo. Indivisível. Inalienável. Nada de levar outrem à cabine. Desça um anjo do Céu, e o eleitor ficha limpa o resiste. Não. Vota em seu voto. Vota em seu candidato. Vota em seu partido. Vota em quem decidiu votar, e ponto final. Eleitor ficha limpa é teimoso. Teima em ser limpo. Pode até fazer como Galileu Galilei - ao confessar perante a Inquisição que o Sol gira em torno da Terra - porém, quando se livrar da ameaça de morte, confessará seu heliocentrismo político. Quem gira é a Terra! - dirá a si mesmo. Eleitor ficha limpa tem sua bússola, seu norte.
Eleitor ficha limpa não vota por causa de pesquisa. Ele resiste a qualquer resultado antes das urnas. Vota porque tem consciência. Não tem essa de perder o voto. Sabe que ele próprio nunca perde. E mesmo se seu candidato estiver na frente dessas prévias, ele não se aquieta até que o veja eleito. E, se estiver no rodapé da opinião pública, não se envergonhará disso nem baixará a guarda. Seguirá firme até a vitória. A vitória de ser um eleitor ficha limpa, apesar dos resultados.
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RUI RAIOL é escritor
www.ruiraiol.com.br
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