segunda-feira, 2 de abril de 2012

Há uma sintonia, submissão nunca

SERGIO BARRA

O real valorizado, o comércio global em queda e a avalanche de importados pressionam as companhias brasileiras. A presidente Dilma Rousseff chamou de "tsunami monetário" que, digamos assim, canibaliza os mercados dos emergentes. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, talvez por uma questão de semântica, voltou a usar o termo "guerra cambial". Após autoridades brasileiras demonstrarem novas preocupações com a enxurrada de dólares que inunda a economia, o governo ampliou o uso do Imposto sobre Operações financeiras (IOF), desta vez sobre os recursos que entram no País travestidos de investimentos produtivos para aproveitar os juros altos.
Neste mundo em transformação, demasiados analistas, planejadores e economistas brasileiros continuam presos a paradigmas e (falsos) problemas dos anos 1990. Foi preciso muito apego a agendas do passado (e ao rendimento fácil das aplicações financeiras) para se opor à redução das taxas de juro quando as evidências do agravamento da crise europeia e as consequências negativas do câmbio supervalorizado já estavam à vista.
Denunciar cautelosas medidas protecionistas como um escândalo nesta conjuntura é uma atitude do mesmo naipe. Já era mostra de apego a mesquinhos interesses setoriais ou estrangeiros em 2003, quando da Conferência de Cancún e da criação do G-20. Os EUA cancelaram sem hesitar a concorrência na qual a Embraer venceu dois fornecedores locais, Sierra Nevada Corporation e Hawker Beechcraft, para vender 20 aviões de treinamento e contrainsurgência (Supertucanos) ao seu exército. A própria Alemanha, cuja primeira-ministra Angela Merkel criticou o protecionismo brasileiro durante a visita de Dilma. Tanto os EUA quanto a Europa estão, sim, numa competição feroz para melhorar suas exportações. Ao tentar se proteger, o Brasil não faz nada de errado.
Deveria ser criticada não a política brasileira de tentar defender setores produtivos nacionais, mas a maneira pontual, improvisada e insuficiente com que o tem feito. Remendos pontuais e transitórios não resolverão o problema. É preciso uma política de planejamento industrial e de infraestrutura para capacitar o Brasil a competir como um dos BRIC e uma das principais potências econômicas deste admirável mundo novo, mas isso exige criar condições estáveis para o investimento e a concorrência internacional. Há uma sintonia para o equilíbrio financeiro, submissão nunca.
Isso significa também um câmbio ao menos tão competitivo e previsível como o têm outros países em desenvolvimento. Como só pode prever o futuro quem o constrói, isso significa um controle efetivo do câmbio e dos fluxos de capitais pelo Estado brasileiro de acordo com as necessidades do seu desenvolvimento econômico no longo prazo e não dos interesses momentâneos do capital financeiro.
Sair da mediocridade exige disciplinar rapidamente os fluxos financeiros, mas também clareza nos projetos de desenvolvimento a longo prazo. Corrigir desequilíbrios estruturais com desequilíbrios conjunturais, mesmo que temporários, é altamente temerário e toda a situação beira a insanidade. O que até poderia ser um remédio na Europa, EUA e Japão torna-se problema no resto do mundo, principalmente, por desestabilizar o câmbio, além de impor o protecionismo comercial como regra.
Alguns analistas partem da falsa premissa de que o governo Dilma "já fez o que tinha de fazer". O Banco Central está muito mais "antenado" com a realidade econômica mundial do que a maioria de seus críticos.

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SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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