No blog Na Rede, da jornalista ANA DINIZ
Quem soube ver, viu, no domingo passado, ao vivo e em cores, os dois Brasis descritos por Roger Bastide há 50 anos. No Domingão do Faustão, a competição entre Bragança, no Pará, e Prudentópolis, no Paraná, revelou muito mais que a simples pluralidade brasileira, ou o marketing mexendo com as cidades, ou o poder de fogo da Globo.
Prudentópolis, limpíssima, arrumadíssima, pronta para a tevê. Uma cidade bem educada. Se ela é assim todos os dias, não sei; mas, se não é, a sua prefeitura providenciou para que se apresentasse impecável para o Brasil ver. A imagem era de um rico polo rural.
Bragança suja, precária, desordenada. Uma imagem do cortejo da pobreza: mercado a céu aberto, métodos de trabalho primários, cartazes com pinturas irregulares, barracas por toda parte. É assim todos os dias, não dá para fazer melhor, proclamava a cidade. Somos isso, e nada mais.
Os câmeras, em Prudentópolis, sucederam closes em lindas adolescentes louras. Ricos rostos bem tratados de olhos claros. Os câmeras, em Bragança, ignoraram solenemente os lindos rostos de traços índios que surgiam fugazmente nas imagens. As morenas de olhos amendoados e pele de cobre, longos e lisos cabelos negros, foram trocadas por barrigudos peixeiros de camisa aberta. O contraste revela claramente que o estereótipo continua a ser a lourice europeia: os profissionais da imagem não encontraram beleza alguma naqueles rostos de Ceci.
As tomadas feitas em Bragança não fizeram justiça ao município: nem mar, nem os canais do mangue mereceram referência. As tomadas de Prudentópolis aproveitaram ao máximo a paisagem serrana. Lá, quem fez o documentário pensava em turismo. Aqui, aparentemente nem passou perto a ideia de aproveitar um programa campeão de audiência, em rede nacional, para atrair visitantes.
Os dois Brasis mostraram-se inteiros.
Em Prudentópolis, o Brasil desenvolvido mostrou-se disciplinado, organizado e discreto. Em Bragança, bagunçado e ansioso. Em Prudentópolis, um Brasil bem vestido e bem tratado. Em Bragança, um Brasil em roupinhas de 1,99, gastas sandálias de dedo e poucos dentes, ansioso para dizer “estou aqui”.
Em Prudentópolis, delicadas sombrinhas; em Bragança, palhas de açaí, quase de graça.
À vontade, a apresentadora de Prudentópolis mostrou facilmente a cidade e seu povo. Constrangido, o apresentador de Bragança não conseguiu sequer se informar direito: se tivesse perguntado, saberia que Bragança faz a melhor farinha de mandioca do país - farinha que ele disse ser de milho. A apresentadora levou o filho para Prudentópolis: valia a viagem. O apresentador de Bragança demonstrou que aquilo era só um trabalho. Ele traduzia, simplesmente, a leitura que o Brasil desenvolvido faz do outro Brasil: uma terra estranha, pobre e feia, onde se tem que fazer cara boa para a câmera, por obrigação.
A rica Prudentópolis levou o prêmio maior, resultado correto pelas regras da competição. A pobre Bragança ficou com o menor. No mesmo dia, o poderio de Minas Gerais fez-se sentir, obrigando a Globo a dar para Diamantina premio igual ao que deu para a cearense Aracati, que vencera seu duelo.
O Brasil rico apresenta-se melhor, lógico. Quanto ao Brasil pobre, um prêmio de consolação lhe basta.
6 comentários:
Beleza de postagem. Mais faltou a produção (tão propalada da Rede Globo), consultar a produção da Tv Liberal. Não foi mostrado a bela praia de Ajuruteua, com a imensidão de suas areias. Não foi mostrado os balneários de igarapés, que rodeiam a cidade. O evento poderia ser feito nas areais de Ajuruteua ou em frente a Igreja de São Benedito. O barulho de percussão poderia ser feito com os tambores da Marujada (faltou um Carlinhos Broaw). Recriar a figura simbólica da Maruja capitã. A única dança no mundo que tem o comando de uma mulher. Faltou produção. O retrato daquela produção foi de uma pobreza de dar dó. Bragança não é isso, apesar de seus podres poderes políticos. Bragança merecia algo maior. Faltou produção. Faltou um olhar mais bragantino, que com certeza a afiliada da Rede Globo no Pará teria.
Ana, sou de Prudentópolis, ao ler o seu post, fiquei mto lisongeada com as palavras em relação a minha cidade, porém, queria fazer uma ressalva, Prudentópolis nunca foi uma cidade bem explorada por seus atrativos turisticos, tão pouco uma cidade reconhecida pela sua cultura e pelo seu povo. A cidade, sempre foi vitima de chacota e discriminação pela peculariedade do seu povo, na maioria descendentes de ucranianos. Como boa prudentopolina, fiquei mto feliz de ver minha cidade sendo reconhecida por seus valores e costumes a nível nacional, sem interferência política.
Paula
Não é riqueza, é jeito de administrar. Conheco um estado pobre em que a populacão vive com mais dignidade que no Pará. E vivo em outro estado pobre, em que ocorre exatamente o mesmo. Ambos tem problemas, mas a pobreza é bem diferente. O pior éque ascoisas vão continuar do mesmo jeito...
Não vejo dessa forma... sou de Prudentópolis, assistente social, e aqui está muito longe de ser a parte rica do Brasil... talvez vc que expressou seu comentário assim, como a atriz que apresentou Prudentópolis para o Brasil, deveriam se informar melhor sobre o nosso município,assim descobrirão até Prudentópolis foi uma das escolhidas para participar desse quadro... faltam informações... e ficam com o pensamento de sempre:que o sul é rico, que todos povo é descendente de europeus, que tem fartura de alimentos e o que o norte e nordeste é formado somente por pobres pessoas, que não tem alimentos, que tem a seca...por favor vamos evoluir na discussão... vamos pensar nos municípios como um território singular, povoado por várias pessoas, com várias culturas, não minimizando-os aos nossos pobres conceitos... conheçam as peculiaridades de cada local e aí sim expressem sua opinião... não consigo aceitar a sua critica, ela é somente embasada no que a globo lhe passou... evolua, aprofunde-se no tema para então expressar a sua opinião... vc não sabe nada sobre aqueles rostos bonitos de prudentópolis, vc não sabe de onde eles vem, quanto km andam para chegar as escolas, não sabe das histórias de vida deles... então aprofunde-se não fique com somente com teu conhecimento de tv globo e revista veja.
Boa tarde, caro Paulo:
ai que esta Ana Diniz nos dói na carne!
Abração
Vanderléia, como disse a jornalista... É a imagem que a Globo passou. "Se ela é assim todos os dias, não sei; mas, se não é, a sua prefeitura providenciou para que se apresentasse impecável para o Brasil ver". Só acho que ela peca quando ela utiliza a expressão Rica Prudentópolis e Brasil Rico. Realmente, em todos os cantos deste país, podemos observar contrastes e desigualdades.
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