segunda-feira, 19 de março de 2012

De Nova Deli a Angola

ISMAEL MORAES

O saudoso Juvêncio Arruda nos legou, entre as várias perólas metafóricas, o rebatismo de Belém: seu humor cáustico fustigava diariamente o arteiro Duciomar Costa, referindo-se a Belém com a cidade que ele transformou em Nova Deli, retratando o efeito do agente; neste Espaço Aberto, Paulo Bemerguy define o responsável pela causa: chama-o de huno, pela devastação da coisa pública.
A OAB requisitou - sua condição de autarquia federal especial com poderes oriundos da Constituição conferem-lhe esse poder - à Sema informações sobre o uso da água (recursos hídricos) no mineroduto de 244 km de extensão que vai de Paragominas a Barcarena. Na condição de presidente da Comissão de Meio Ambiente da OAB, encaminhei o ofício, para poder trabalhar com dados precisos, mas já sabia a resposta para uma das indagações: as mineradoras, multinacionais que lucram centenas de bilhões de dólares com a exploração dos minérios no Pará, nada pagam pelo uso da água, somando-se à gratuidade tributária total e à inexpressiva quantidade de postos de trabalho que oferecem se comparado se produzissem aqui componentes e manufaturas. O resultado é que somos exauridos e sem quaisquer perspectivas de algum dia fazer parte da festa com motivos para comemorar os resultados do Anuário Mineral.
Quando descobrimos que os responsáveis por cobrar cerca de R$ 5 bilhões ao ano dos grandes grupos econômicos pelo uso dos bens públicos em favor da sociedade não o fazem, e ainda mais sequer se constrangem em aparecer em público festejando o enriquecimento deles em contraste com a galopante miserabilização da grande maioria do povo que vive por onde passam as riquezas, temos todos os motivos para nos sentirmos numa reles república africana, com os típicos deslumbrados aqui e ali.
Já há muito, pela atuação dos diversos governos, deveríamos ter resultados sociais dos direitos ora exigidos pela OAB: que as autoridades estaduais cobrem e arrecadem das mineradoras pelo uso dos recursos hídricos - dos corpos subterrâneos e dos mananciais superficiais - e invistam como possam para reduzir as grandes carências das regiões onde estão as bacias hidrográficas exploradas, algumas delas mazelas das instalações dos empreendimentos minerais.
A extensão do prejuízo do Estado pode ser maior do que possa pensar e atinge outras pessoas públicas: os municípios cortados pelos projetos minerais e em cujos territórios são extraídas as águas tem direitos vários; entre eles há direitos a royalties pelo uso da água, assim como tem e recebem da Eletronorte aqueles do entorno do lago da UH de Tucuruí. Assim, o Estado, por não estar recolhendo e repassando a parte dos municípios pode ser demandado em juízo por sua incúria em fazer o que lhe cabia. Quantos bilhões?
Quais as perspectivas que temos de receber alguma compensação das mineradoras? Ainda que seja dedicado à advocacia publicista, mas sem ser tributarista, uma coisa me é clara e simples: a total impossibilidade de a produção ou a renda serem tributadas por meio de taxa. Esta é tributo próprio pela contraprestação funcional da Administração a serviço específico; nunca fonte de receita para sustentação do Estado. A Constituição Federal reservou aos impostos por ela definidos como os meios de gerar receitas incidindo naqueles produtos econômicos, produção e renda. Como uma taxa poderia assumir a feição e a função de imposto, mormente quando outra figura contributivo-compensatória de esfera própria já recai sobre a mesma hipótese de incidência? Torço em estar errado e alvitro por um bom resultado ao Pará.
Face à força do setor primário que aqui prevalece, toda a estruturação do Estado do Pará para obter novas receitas das atividades produtivas em seu território, regulando-as e transformando-as de poluidoras a sustentáveis, deve ter em mira as figuras do poluidor pagador e do usuário pagador, previstas na Política Nacional de Meio Ambiente (Lei Federal nº6839/81), sendo que, quanto aos recursos hídricos, precisa haver mera organização administrativa para tornar efetiva a cobrança pelo seu uso.
Temos muitos direitos. Faltam vontade política e competência de quem esperávamos ter. Caso permaneçam omissos ou colaboracionistas, semelhantes ao do atual prefeito de Belém - hipótese que não acredito ocorrer de agora em diante - teremos que fustigar os impatrióticos. Chamaremos o Pará de Angola ou vamos apelidar os figurões do Estado?

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ISMAEL MORAES, advogado, é presidente da Comissão de Meio Ambiente da OAB-PA

Um comentário:

Davi Batalha disse...

Caro Ismael, vosso ódio destilado para com o prefeito de Belém apenas contamina suas opiniões. Duciomar nada tem a ver com a negligência governamental em relação ao uso da água em mineroduto que vai de Paragominas Barcarena. A não ser que o advogado tenha faltado as aulas de geografia, pois Belém fica um pouco distante de Barcarena e mais ainda de Paragominas. Ademais, Átila, o huno, era temido pelas suas vitoriosas investidas militares, caracterizadas pela falta de piedade com seus inimigos. Duciomar tem adversários de duas ordens: os que não querem ver os avanços proporcionados a Belém e os que não aceitam um homem público que não vem das elites dominantes de Belém e do Pará. Importante seu pedido de requisição ao órgão responsável pelo meio-ambiente estadual - porém, sua agressão gratuita ao Prefeito de Belém exprime a contaminação de suas opiniões, o que dinamita sua credibilidade. Paciência - é o que sugiro a Duciomar - pois Ismael não sabe o que diz.