quinta-feira, 16 de junho de 2011

Divisão da escassez



Em votação apressada e simbólica de lideranças, aprovou-se no Senado e na Câmara Federal a realização do plebiscito para a criação dos Estados do Tapajós e de Carajás. Um detalhe chama a atenção nesse "esforço concentrado": o projeto original do desmembramento do Pará foi de autoria de um senador de Roraima, enquanto seus principais defensores, afora os "deputados paraense s diretamente interessados", são de outros Estados da Federação, incluindo poderosos empresários do agronegócio do Sul do Pará e Tocantins, além de influentes políticos maranhenses da "bancada do Sarney". Não por acaso, a campanha pró-divisão será milionária, sob a batuta do famoso Duda Mendonça. Outro detalhe curioso: pelo menos três líderes separatistas paraenses estão envolvidos até o pescoço em processos na Justiça pela prática de variados delitos tendo como "fato gerador" a má aplicação do dinheiro público. Como acreditar na sinceridade de seus propósitos? Será que lhes move o sincero desejo de promover desenvolvimento e paz social às populações dos novos Estados? Ou será que não estão somente de “olho gordo” em novos cargos de governadores, senadores, deputados federais e estaduais, novos Tribunais de Justiça e de Contas, novas Assembléias Legislativas, mais DAS par a abrigar parentes e afilhados e muitas obras a serem executadas e superfaturadas?
Os recentes escândalos descobertos na Assembléia Legislativa do Pará servem de exemplo didático do "modus operandi" desses “profissionais”, insaciáveis na busca pelo poder e pelo enriquecimento fácil com o dinheiro do povo, lesado duplamente, como eleitor e como contribuinte compulsório. Os separatistas não estão nada preocupados com os custos dos novos estados, estimados em R$ 3,5 bilhões só para obras de infraestrutura, afora os custos de manutenção, em torno de R$ 2,5 bilhões anuais para cada novo Estado. Nesse caso, quem vai pagar a conta é o contribuinte brasileiro. Por isso, Roberto Pompeu de Toledo, articulista de Veja, sugeriu que o plebiscito sobre a divisão do Pará deveria ser de âmbito nacional e não apenas restrito aos paraenses.
Outro aspecto que deve acender a luz de advertência para a população paraense é a tentativa meio solerte dos líderes separatistas em obstar a consulta a todo o povo paraense e restringir o plebiscito apenas "à população diretamente interessada", que eles entendem sendo apenas os atuais habitantes das áreas a serem emancipadas. Chegam ao cúmulo de tentar trapacear na interpretação da própria Constituição. Os que defendem a consulta somente na área a ser emancipada alegam que assim "reza" a Constituição Federal ao asseverar, no terceiro parágrafo do artigo 18 que, sobre a divisão, deve ser consultada “a população diretamente interessada”. A definição, todavia, do que é “a população diretamente interessada” está na lei 9.709, de 1998, que remete à Carta Magna e coloca fim à quizília ao declarar que população diretamente interessada é “tanto a do território que se pretende desmembrar quanto a do que sofrerá desmembramento”.
De forma cristalina, smj (salvo melhor juízo), será esse o entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre a extensão da cobertura geográfica do plebiscito para criação dos Estados de Carajás e Tapajós, caso chegue até lá essa questiúncula provocada por interesses menores dos que querem ganhar o plebiscito na "marra". Não passarão. O que deveriam fazer era expor seus argumentos em debates com a participação de técnicos e estudiosos, de forma a esclarecer a população paraense sobre a extensão da medida separatista, sua viabilidade econômica, além de suas implicações de ordem administrativa, social e cultural.
Esse deve ser o objetivo maior do Comitê em Defesa do Pará, criado pela Associação Comercial do Pará, cuja instalação contou com grande afluência de público, onde se misturavam, democraticamente, políticos de expressão, empresários vitoriosos, artistas consagrados, líderes comunitários e sindicais, representando as diversas camadas da sociedade paraense. É disso que precisamos. Um amplo movimento que possa despertar o sentimento cabano do povo paraense. E de um debate que possa esclarecer e não confundir. É falacioso, por exemplo, esse argumento de que o Pará é quase ingovernável devido suas distâncias continentais e que só a divisão territorial trará o desenvolvimento para as duas regiões desmembradas. Ora, se tamanho pequeno fosse condição favorável a boas práticas de gestão pública, Alagoas e Sergipe seriam os Estados mais desenvolvidos do Brasil. Por outro lado, não se promove desenvolvimento com a divisão da escassez.

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FRANCISCO SIDOU é jornalista

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