sexta-feira, 24 de junho de 2011

CNJ repetiu vícios que deve combater

Do Consultor Jurídico

A Ordem dos Advogados do Brasil do Rio de Janeiro viu-se obrigada a propor um procedimento de controle administrativo no Conselho Nacional de Justiça contra o comportamento absolutamente anacrônico de uma magistrada do Trabalho, que impediu um advogado de realizar  audiência porque não estava vestindo paletó.
Esse fato, por si só, revela muito sobre parte do Judiciário brasileiro, que ainda dá importância a títulos nobiliárquicos e ritos ultrapassados, em vez de se preocupar em prestar a contento jurisdição. Na maioria dos países civilizados, os magistrados são apenas juízes: juízes de primeira instância, juízes de apelação, juízes da Suprema Corte. No Brasil, remanesce a previsão legal de títulos diferenciados para magistrados de segundo grau e dos Tribunais Superiores. E mais: mesmo aqueles que carecem dessa prerrogativa constitucional exigem que o tratamento lhes seja dirigido dessa forma, como no notório caso dos integrantes dos tribunais regionais brasileiros, que fazem questão de ser tratados por desembargadores, ao arrepio da Constituição da República.
Exemplo significativo desse atavismo é a exigência de paletó e gravata para o advogado praticar atos judiciais, como audiências, despachos com o juiz e sessões de julgamento nos tribunais. Mesmo em dias de calor insuportável, do cada mais inclemente verão brasileiro,  o advogado vê-se obrigado a vestir esse traje herdado do inverno europeu, que, efetivamente, não condiz com o clima da maioria das regiões de nosso país. As consequências dessa exigência ultrapassada acabam afetando até mesmo a saúde dos advogados, especialmente os de idade mais avançada.
Não são o paletó e a gravata que dignificam o advogado, tampouco a toga distingue o juiz, mas sim o saber jurídico, a observância à ética, entre outros requisitos. Como diz o ditado, o hábito não faz o monge.
O anacronismo do Judiciário brasileiro é conhecido e objeto de atenção constante da OAB. Mas os eventos que se sucederam no julgamento do procedimento de controle administrativo acima citado nem o mais pessimista dos advogados poderia prever.
Mesmo se tratando de questão inédita no Plenário do CNJ, e já contando com um precedente monocrático favorável à OAB-RJ, o relator Nelson Tomaz Braga extinguiu liminarmente o procedimento. A OAB-RJ recorreu, e o feito foi incluído na pauta do dia 21 de junho de 2011.
A OAB-RJ despachou memoriais com os conselheiros, e, no dia do julgamento, estive presente à sessão. Por volta das 18 horas, o presidente do CNJ, ministro Cezar Peluso, informou ao presidente em exercício do Conselho Federal da OAB, Dr. Miguel Cançado (que faria uso da palavra no julgamento), que o processo não seria julgado, por conta do adiantado da hora. Por esse motivo, todos os representantes da OAB retiraram-se da sessão.
Qual não foi a surpresa quando soube, pouco depois do encerramento da sessão, que o recurso havia sido julgado em conjunto com outros casos repetitivos – o que não era o caso do nosso recurso –, por meio do eufemisticamente chamado ”julgamento célere”. Reitere-se que saí da sessão de julgamento já próximo do seu final, junto com o Dr. Miguel Cançado, após a garantia do ministro Cezar Peluso de que o caso não seria julgado. Mas, apesar de sua palavra, o recurso foi apreciado no apagar das luzes.

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Um comentário:

Anônimo disse...

Ótimo artigo, sou magistrado e comungo do mesmo entendimento do autor da matéria. Parte da Justiça brasileira sofre de uma mentalidade derivada de um resquício colonialista, e até mesmo monárquico. Pode-se dizer que se trata até de um trastorno bipolar, pois tenta-se incorporar valores monáquicos, como são os títulos de nobresa (barão, conde, visconde, duque, etc..), transportando-os para o sistema republicano, e daí vem os títulos: desembargador, ministro, juiz federal do trabalho, desembargador federal do trabalho, procurador da república, procurador do trabaho, promotor de justiça, etc... dando-se um nó na cabeça do povo. Por que não apenas juiz disso e daquilo? Afinal, a Justiça serve a quem? Ou será que pensa que os cidadãos é quem deve servi-la como um vassalo serve ao suserano? Sobre a vestimenta acontece a mesma coisa; como é, meu Deus, que eu vou obrigar um advogado a usar terno e gravata num calor de mais de 30o? Basta usar uma roupa adequada ao ambiante (calça e camisa), sem necessidade de se copiar a metrópole. A Justiça do século XXI deve ser sóbria e manter somente os ritos necessários e deixar um pouco de lado as anágas e os babados.