No Flanar, sob o título acima, postado pelo médico especialista em clínica médica e mestre em Ciências da Saúde Itajaí de Albuquerque:
Quase a caminho de dormir, antes de ordenar ao computador o desligar, leio uma matéria sobre a situação de iniquidade em que se encontra o povo indígena Guarani-Kaiowá, no Mato-Grosso do Sul. Quando trabalhei há cinco anos na Secretaria de Gestão daInformação do Ministério do Desenvolvimento Social tive pela primeira vez contato com essa tragédia brasileira. Na ocasião me foi solicitado que integrasse equipe com o objetivo de avaliar em campo aquele drama social.
Preferi elaborar um levantamento bibliográfico que contribuísse para a tomada de decisão governamental frente àquela tragédia. Isto significava esclarecer, ou melhor, trazer ao primeiro plano do discurso, a síntese causal relacionada ao problema vital desses indígenas, que estavam organizados em território contido na interseção das fronteiras brasileira e paraguaia. Sim, os Guarani-Kaiowá ocupam um território binacional, porque os povos indígenas organizam-se culturalmente a partir de razões históricas que antecedem e são superiores à consolidação das fronteiras dos estados nacionais latino-americanos derivados da conquista portuguesa e espanhola.
Mas os maiores males a eles impostos estão relacionados à tomada suas terras desde a década de 90 a favor do chamado agronegócio da soja, o que levou a uma agressiva e ilegal redução territorial, a destruição de seus valores culturais e a inevitável decadência dos costumes por meio da prostituição, do banditismo e do alcoolismo. Na esteira desses males estão associados outros que traduzem o desencanto desse povo com o futuro, conforme expressam o abandono, a desnutrição e a elevada mortalidade infantil e o suicídio entre adultos-jovens ali contados.
Sei o quanto é difícil para nós, não índios, superar os preconceitos herdados e compreender a profundidade dessa tragédia humanitária, autóctone, ainda que sejamos sensíveis a outras como a exemplo as dos povos africanos, das vítimas do conflito árabe-israelense, ou dos ataques terroristas de 11 de setembro. Mas aí está: os Guaranis-Kaiowás representam nesse momento a maior tragédia nacional de uma minoria brasileira, que ecoa no século XXI a barbárie da colonização iniciada com o achamento do Brasil em 1500.
Para que não tenhamos dúvida do quanto é urgente a tomada de posição do governo brasileiro sobre o assunto, basta sabermos que os Guarani-Kaiowá registram hoje a taxa de um suicídio a cada 10 dias, o que em breve os levará à extinção. Logo, chega de ninguém se incomodar, de não garantirmos para esse povo a retomada de suas terras sem prejuízo de outras ações que integram o conjunto de medidas humanitárias de que eles necessitam.
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