terça-feira, 29 de março de 2016

A "República de Curitiba"



O governo está em crise, a situação é insustentável, o terreno movediço da corrupção e da crise política que envolve o ex-presidente o faz desabar em queda livre. Lula é investigado como provável chefe de usurpação da coisa pública pela delação premiada. E pasmem, há uma coação velada que tenta inibir qualquer contraponto que venha trazer mais lucidez a fatos que são notórios diante dos malfeitos. É a imagem do ocaso, na perspectiva de reviver uma vida anterior e que representa bem nesse momento. Hoje, é mais um exemplo a constar nas galerias do País: as das malversações e de perfis solúveis, que se dissolvem quando imersos nas águas impuras da desmoralização.
Contudo, é bom lembrar que Lula ainda continua em fase de investigação, aguardando-se, portanto, o seu término, para as explicações quanto às suspeições que recaem sobre ele, com base nos flagrantes captados pela Polícia Federal em telefonemas e em fatos já demonstrados pela mídia. Feita a ressalva, pode-se entender que o caso abre desde já um leque de hipóteses. Poderosas lentes de aumento estão enxergando desvios e ilícitos cometidos por políticos e empresários. Um passo avançado em nossa régua civilizatória. No mesmo compasso de vigilância cívica, os próprios organismos de controle ético das casas congressuais, agora sob o olhar atento da sociedade organizada, começaram a acolher com mais vontade os casos conflituosos que lá chegam.
Por outro viés, os conflitos explodem e a irresponsabilidade generalizada fez o Brasil mergulhar em uma espiral de intolerância e irracionalidade. Em sua delação premiada, o senador Delcídio do Amaral, ex-lÍder do governo, diz que tanto Lula quanto Dilma tinham pleno conhecimento da corrupção na Petrobras - e, juntos, tramaram para sabotar as investigações, inclusive vazando informações sigilosas para os investigados. Destacou o papel de Lula no petrolão, o de Dilma como herdeira e beneficiária do esquema e a trama do governo para tentar obstruir a inquirição da Operação Lava Jato.
O juiz Sergio Moro virou desafeto e alvo da ira e, também dos pesadelos de Lula e dos petistas envolvidos no petrolão. As escutas telefônicas divulgadas por Moro provocam divergências quanto à legalidade - ele comentou que a escuta é do investigado e foi a presidente que ligou para ele e aparece na ligação, fortuitamente -, mas o conteúdo dos diálogos revela que o ex-presidente tinha três obsessões: atrapalhar o trabalho da PF, da Justiça e de Moro. Os diálogos estão em diversas conversas e são do conhecimento de todos. Em outro diálogo com Dilma, Lula critica os Tribunais e a cúpula do Congresso, que estariam subjugados pelo que chama de "República de Curitiba", em referência ao comando da Lava Jato. Que não hesita em cobrar favores, interferir no processo, assediar autoridades, constranger e "provocar medo" em adversários. Entre os alvos até ministros do STF.
Nas gravações feitas pela PF, Lula conversa com diversos interlocutores, mas há sempre um ponto em comum: seu empenho constante em minar o trabalho dos investigadores e proteger-se da ameaça de prisão. Em conversa com Dilma ele diz: "Eu estou, sinceramente, estou assustado é com a República de Curitiba, porque a partir de um juiz de primeira instância tudo pode acontecer neste País, tudo pode acontecer". Lula acha que Curitiba, é o epicentro do complô de onde partem as diretrizes e as motivações da operação que chama de golpista.
A semana que se inicia, poderá ser de muitas revelações com o listão da Odebrecht - mais de 200 políticos de 24 partidos. O povo brasileiro acredita na solidez das instituições. Abona a Lava Jato que demonstra a força dos nossos estabelecimentos fundamentais, o que está sendo impulsionado pelas novas crenças da sociedade, pela imprensa livre e pelo funcionamento dos mercados. Há um evidente desejo de mudança, uma renovação de liderança capaz de estabelecer a responsabilidade e a eficiência das políticas públicas, a qualidade do governo e o desenvolvimento do Brasil. Na verdade, não será fácil reverter a degradação a que o País foi submetido.

-------------------------------------------------------------

SERGIO BARRA é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

Um comentário:

Anônimo disse...

Dr. Sergio, da forma como escrita a frase iniciada por "Que não hesita..." denota que é a lava jato e não o político investigar.