O Lago da transparência

FRANCISCO SIDOU

Confirmando todas as previsões, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou o governador do Maranhão, Jackson Lago, acusado da prática de crime eleitoral, mais precisamente de abuso do poder econômico na compra de votos, nas eleições de 2006. No pleito, ele derrotou a candidata Roseana Sarney, interrompendo mais de 40 anos de dominação política do Maranhão pela dinastia Sarney.
Não se discute o mérito da decisão do egrégio tribunal eleitoral. Afinal, decisão judicial não se discute. Cumpre-se para depois recorrer. Data venia, é este o ensinamentos dos nobres causídicos e operadores do direito. O que soa meio insólito é que a cassação de Lago mais se assemelha a certa "crônica de uma morte (política) anunciada", tal a certeza que todos tinham de que ele seria "abatido". A dinastia Sarney acaba de fazer cabelo, barba e bigode, principalmente este último... Mesmo tendo perdido a eleição, Roseana assume o governo do Maranhão, vai tratar da saúde abalada, mas deixa no cargo o vice João Alberto, um fiel e disciplinado escudeiro, que vai apenas guardar o lugar para quando ela voltar.

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“Se o governador Lago foi cassado ‘por abuso de poder econômico’ e compra de votos, não seria o caso de se aplicar o mesmo remédio legal a todos os outros governantes eleitos ou reeleitos pelo Brasil afora usando e abusando da "máquina"?
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A influência (para o bem ou para o mal) da dinastia Sarney naquele Estado está sendo traduzida em bem humorado "roteiro turístico" para o visitante de primeira viagem ao Maranhão, que circula na internet, com a seguinte apresentação:

"- Para nascer - Maternidade Marly Sarney!
- Para morar, há opções para os mais humildes, como a Vila Sarney Filho, Sarney Neto ou Kiola Sarney e, para os mais abonados, os condomínios José Sarney ou Roseana Sarney;
- Para pesquisar, apanhe um táxi no Posto de Saúde Marly Sarney para ir até a Biblioteca José Sarney, que fica na maior universidade particular do Estado do Maranhão, que o povo jura pertencer a um certo José Sarney;
- Para se informar , leia o "Estado do Maranhão", ouça as Rádios Mirante AM e FM ou então ligue na TV Mirante na capital; caso visite o interior, poderá sintonizar uma das 35 emissoras de rádio ou alguma das 13 repetidoras da TV Mirante, todos veículos de comunicação pertencentes a um só dono, ele mesmo, o todo-poderoso senador José Sarney;
Tem mais: as contas públicas são analisadas (com o rigor que merecem) pelo Tribunal de Contas "Roseana Murad Sarney".
Ao sair da cidade de São Luís, atravesse a "Ponte José Sarney", que vai dar na Avenida José Sarney, que passa na Rodoviária Kiola Sarney.
Mas, o povo pode fazer reclamações na "Sala de Defensoria Pública Kiola Sarney", que fica no mesmo prédio do "Fórum José Sarney".
Caso tenha gostado do roteiro turístico e queira dar suas impressões de viagem, o visitante pode falar com jornalistas do maior jornal maranhense - O Estado Maranhão"- na "Sala de Imprensa Marly Sarney"...
Caso não tenha gostado, é melhor sair de mansinho, pois o único jornal que fazia oposição à dinastia Sarney - "O Jornal Pequeno" - apequenou-se de tal maneira, pela falta de anunciantes e de verbas públicas, que acabou morrendo de inanição. "

O roteiro para turistas de primeira viagem ao Maranhão é de autor anônimo, mas está fazendo o maior sucesso entre os internautas. Realmente, ele impressiona e dá uma idéia da cultura do atraso que impede o Maranhão de crescer.
Uma pergunta não quer calar: se o governador Lago foi cassado "por abuso de poder econômico" e compra de votos, não seria o caso de se aplicar o mesmo remédio legal a todos os outros governantes eleitos ou reeleitos pelo Brasil afora usando e abusando da "máquina"? E os que governam utilizando recursos públicos para promoção pessoal visando sua reeleição ou eleição de futuros candidatos?
A propósito, parlamentares do PSOL estão propondo uma Frente Ampla de Combate à Corrupção, em todas as esferas do poder público, para fiscalizar as ações de gestores municipais, estaduais e federais. Eles desejam sensibilizar a sociedade civil para cobrar
de seus representantes e do Ministério Público ações concretas que possam conter o escandaloso roubo de recursos públicos, que tanta falta estão fazendo em setores vitais como a saúde, saneamento básico, educação e transportes.
Reagir é preciso. Do contrário, por omissão ou conivência, corremos todos o risco de acabar assistindo ao Brasil transformar-se em um imenso Maranhão.

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FRANCISCO SIDOU é jornalista
chicosidou@bol.com.br