No Blog do Nassif, sob o título acima. Depois, o comentário do blog.
-------------------------------------------
Por Andre Araujo
A registrar, o Equador contratou o escritório de advocacia americano Foley Hoag, de Boston, para defender seus interesses na questão da divida externa com o Brasil, de US554 milhões, sendo que US$462 milhões são devidos ao BNDES. Esse mesmo escritório defende a Venezuela e a Bolívia em demandas contra credores.
Há sinais de que o eixo bolivariano quer dar um beiço no Brasil, no que estão sendo tecnicamente assessorados pela auditora fiscal do Ministério da Fazenda do Brasil, Maria Lucia Fatorelli Carneiro sindicalista e com forte ligações com o PT e PSOL, cedida a esses países para ajudá-los a montar a tese do calote. O Brasil é o maior credor governamental do Equador, com 40% da divida total de US$ 1,3 bilhão,
Chegamos assim à curiosa situação pela qual assessoramos um país devedor a nos dar calote, com o apoio de uma funcionária pública paga pelo Tesouro brasileiro.
O fato é tão surrealista quanto a política externa da chancelaria paralela para a America do Sul, cujo plano de liderança continental vai acabar nos tribunais, com o Brasil processado por advogados americanos. Nelson Rodrigues não bolaria coisa melhor.
A portaria
Publicado no DOU em 10 de abril de 2008
DESPACHO
Em 9 de abril de 2008
O SECRETÁRIO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL, no uso da competência prevista no art. 2º do Decreto no 1.387, de 7 de fevereiro de 1995, que lhe foi delegada na Portaria GMF no 324, de 19 de dezembro de 2007, autoriza o afastamento do País de MARIA LÚCIA FATORELLI CARNEIRO, Auditora-Fiscal da Receita Federal do Brasil, em exercício na Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento, em Brasília,/DF, no período de 14 de abril a 01 de agosto de 2008, com ônus limitado, na forma do disposto no inciso IV do art. 1º do citado Decreto, para integrar, na condição de representante de entidade internacional, a Comissão de Auditoria Integral de Crédito Público, do Governo do Equador, em Quito, Equador. As despesas decorrentes do afastamento, serão custeadas pelo Ministério de las Finanzas do Equador. (Processo nº 10168.001370/2008-71).
JORGE ANTONIO DEHER RACHID
Publicado no DOU em 25 de julho de 2008
DESPACHO
Em 23 de julho de 2008.
O SECRETÁRIO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL, no uso da competência prevista no art. 2º do Decreto nº 1.387, de 7 de fevereiro de 1995, que lhe foi delegada na Portaria GMF nº 324, de 19 de dezembro de 2007, autoriza a prorrogação do afastamento do País até 30 de setembro de 2008, da servidora MARIA LÚCIA FATORELLI CARNEIRO, ocupante do cargo de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, lotada na Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento, em Brasília (DF), com ônus limitado, na forma do disposto no inciso IV do art. 1º do citado Decreto, como integrante, na condição de representante de entidade internacional, da Comissão de Auditoria Integral de Crédito Público, do Governo do Equador, em Quito. As despesas decorrentes do afastamento, serão custeadas pelo Ministerio de Finanzas del Ecuador. (processo nº 10168.001370/2008-71).
JORGE ANTONIO DEHER RACHID
-------------------------------------------
Do Espaço Aberto:
Não faz muito tempo, o blog disse o seguinte, ao comentar uma nota publicada em jornal: se Kafka (que aparece na foto acima) voltasse à vida para residir em Belém, teria assunto, em um mês, para produzir nova obra.
É verdade.
Se Kafka voltasse a Belém, produziria nova obra em um mês.
Mas se o seu olhar, digamos assim, se estendesse sobre todo o Brasil, Kafka teria elementos e encontraria inspiração para produzir uma obra de dezenas e dezenas de volumes a cada dia, se quisesse e se isso fosse possível.
Ontem, um leitor do Espaço Aberto, em passeio pelo Blog do Nassif, deu com a postagem acima, pinçada de lá.
É um escândalo.
O Brasil autoriza uma servidora pública a afastar-se para ajudar outros países a passarem calote no Brasil.
Leia novamente o que acabou de ser escrito.
Se leu, acredite que leu certo. Creia que entendeu perfeitamente o que leu.
Se o Brasil não fosse o Brasil, alguém deveria ser chamado a oferecer explicações à Nação, alguém deveria cogitar o cometimento de um crime de lesa-pátria, configurado nos atos publicados no Diário Oficial.
Mas que nada.
Vai ver que a assessora, um dia, ainda receberá condecorações dos condestáveis do Itamaraty, entre eles os ideólogos dessas concepções estranhas que tendem a ver num Hugo Chávez, por exemplo, não um ditador – dos mais histriônicos, dos mais caricatos, mas sempre ditador -, e sim o repositório único das aspirações libertárias de um continente eternamente à espera de um Libertador – ele mesmo, Chávez.
Céus!
Para onde caminharemos?
Aliás, e como se mencionou Kafka, uma de suas obras mais fantásticas, e menos conhecidas, é O Castelo. No livro, o principal protagonista, o agrimensor K., anda, anda, anda e anda, mas não chega ao castelo. Às vezes, é induzido a pensar que está bem pertinho. Mas não chega lá. Isso tudo cria (inclusive no leitor) uma situação angustiante, de desnorteio, de desorientação, de incapacidade de lutar contra poderes irremovíveis e inalcançáveis pelas forças naturalmente humanas.
É assim por aqui.
Às vezes, a situação é de angústia, de desnorteio, de desorientação. Não se consegue alcançar aonde o País quer chegar.
Não se consegue, afinal, atingir o castelo.
Ninguém consegue.
É assim.
3 comentários:
Caro Paulo,
Este é mesmo um tema palpitante. Proponho que você abra espaço para o "outro lado" da polêmica.
Transcrevo, a seguir, um importante manifesto de entidades e personalidades, do Brasil e do exterior, sobre a postura soberana do Equador em questionar a ilegitimidade de parte de sua dívida externa.
Aproveito para parabenizar o Espaço Aberto por seu primeiro aniversário. Seu Blog é,a cada dia, leitura necessária e indispensável.
Aldenor Jr
Jornalista
Manifesto pelo Equador e pela constituição de uma rede mundial contra a dívida ilegítima
A América latina e o Caribe continuam pagando tributos coloniais. As dívidas externas, contraídas em condições ilegítimas, enganosas, ilegais ou corruptas minam a soberania dos povos e os obrigam a entregar todas as suas riquezas. Dívidas odiosas contraídas pelas ditaduras, feitas para subjugar e reprimir, se combinam com dívidas expansivas que paradoxalmente quanto mais se pagam, mais crescem. As dívidas não foram contraídas pelos povos, mas sim contra eles.
Os barcos armados dos poderosos que impunham os empréstimos, ávidos por se tornarem credores para poder manter as condições de controle e saqueio sobre os territórios da América Latina e do Caribe depois das guerras de Independência, reaparecem hoje sob as figuras da IV Frota, o Plano Colômbia, a Iniciativa Mérida e os comandos Sul e Norte, embora encobertos por sutis mecanismos financeiros.
Dívidas contraídas desta maneira são ilegítimas e já foram pagas várias vezes. Obrigam a privilegiar a obtenção de divisas e a adiar eternamente a busca do bem-estar dos povos. Justificam e propiciam a impunidade e a corrupção.
Em 20 de novembro de 2008, o Equador, depois de realizar uma exaustiva auditoria do caso, desconheceu seu compromisso com uma volumosa e lesiva dívida ilegítima, exercendo sua soberania e seu direito a autogovernar-se. Em um ato de maior transcendência histórica, se propôs a julgar os responsáveis por contraí-la e usá-la em nome do povo.
Diante da crise financeira e da recessão econômica provocada pela voracidade das corporações transnacionais, que agora querem exigir de nossos povos que a paguem, é indispensável estender a nível mundial a recusa definitiva de pagamento da dívida ilegítima.
Nós, intelectuais, artistas e lutadores sociais, comprometidos com a democracia, a liberdade e os processos de emancipação dos povos do mundo, apoiamos a decisão do governo equatoriano de não honrar uma dívida que não lhe corresponde e acordamos em sermos promotores da criação de uma rede mundial contra a dívida ilegítima e os tributos coloniais, em coordenação com todas as iniciativas existentes contra o pagamento da dívida.
Basta de tributos coloniais. Queremos e lutaremos por um Equador e uma América Latina livres e soberanos.
Alemanha
Ulrich Brand, Dario Azzelini,
Argentina
Atilio Boron, Telma Luzzani,Carola Iñiguez, Víctor Ego Ducrot, Susana Moreira, Miguel Mirra, Guillermo Almeyra, Silvia Maldonado, Juan Wahren, Cristina Castello, Jorge Beinstein, José Seoane, Clara Algranatti, Emilio Taddei, José Luis Coraggio, Julio C. Gambina, Patricio País Garay, Claudio Katz, Red Nacional de Medios Alternativos (RNMA), Carlos D. Pérez, José Pedro LopardoTellechea, Luciana García Guerreiro
Bélgica
Eric Toussaint (presidente Comité por la Abolición de la Deuda del Tercer Mundo), Bernard Duterme (CETRI),Francine Mestrum
Bolivia
Francisco Mollo Calle (Presidente Asociación de Organizaciones de Productores Ecológicos de Bolivia), Alex Contreras Baspineiro, Escuela del Pueblo "Bolivia Digna",
Brasil
Frei Betto,Joao Pedro Stédile (Vía Campesina), Theotonio Dos Santos, Carlos Walter Porto Gonçalves, Carlos Eduardo Martins, Marilia Guimarães, Sergio Lessa, Gustavo Erwin Kuss (Coordenação dos Movimentos Sociais-CMS-PR), Marise Ramos, Roberto Leher, Gaudencio Frigotto, Maria Luisa Mendonça (Rede Social de Justiça e Direitos Humanos), Plinio S. de Arruda Sampaio, Bernardo Mançano Fernandes, Ivete Caribé da Rocha, João Alexandre Peschanski,
Canadá
PaulCliche, Pierre Mouterde, Michael Lebowitz,
Chile
Manuel Cabieses,Marta Harnecker,
Colômbia
Francisco Beltrán,Gilberto Herrera Stella, Cecilia Ibagos Trujillo, Tarcisio Agramonte Ordóñez,Catalina Toro
Costa Rica
Gerardo Cerdas, Grito de los Excluidos/as,
Cuba
Rev. Raúl Suárez Ramos (Director del Centro DrMartin Luther King, y Diputado Nacional), Isabel Monal, Gilberto Valdés, Georgina Alfonso, YohankaLeon, Alberto Perez, Humberto Miranda, Carlos Tablada, Joel Suarez, AdalysVazquez, Ariel Dacla, Daysi Rojas, Centro Memorial Dr.Martin Luther King,Jr.
El Salvador
Álvaro Darío Lara
Espanha
Francisco Fernández Buey, Juan Carlos Monedero, Pascual Serrano,Asamblea Local De Izquierda Unida - Alternativa Ciudadana De El Boalo,
Estados Unidos
Rev. Roy Bourgeois (SchoolofAmericasWatch),Karen Lee Wald,
França
Pierre Salama, Michael Lowy, Armand Mattelart, Christophe Grigri, Michelle Aslanides, Michele Mattelart, Hernando Calvo,
Guatemala
Mildred López, Percy Alvarado
Haiti
Lise-Marie Dejean,
Honduras
Wendy Cruz, Juan Almendares(Presidente del Movimiento Madre Tierra), Lorena Zelaya,
Itália
Marco Consolo (Partido de la Refundacion Comunista - Izquierda Europea), Antonio Melis,
México
Pablo González Casanova, José Luis Ceceña, Miguel Concha, Víctor Flores Olea, Raúl Álvarez Garín, Felix Hernández Gamundi, Ana Esther Ceceña, Gilberto López y Rivas, Carlos Lenkersdorf, Carlos Fazio, Héctor Díaz Polanco, Magdalena Gómez, Enrique Leff, José Francisco Gallardo, Jorge Turner, Federico Alvarez, Gudrun Lenkersdorf, Angel Guerra, Maricarmen Montes, Darío Salinas, Beatriz Stolowicz, John Saxe-Fernández, Edur Velasco, María del Rayo Ramírez, Miguel Álvarez, Comité Ejecutivo Nacional Democrático del SNTE, María Guerra, Daniel Inclán, Jose Steinsleger, Ricardo Melgar Bao, Nayar López, Rebeca Peralta, Walter Martínez, Israel Sampedro Morales (Red de Defensa de los Derechos Humanos), John Holloway, Amarela Varela, David Barkin, Aldo Rabiela, David Barrios, Rodrigo Yedra, Carolina Oropeza, Marco Velázquez, Ana Marìa Vera Smith, Aldo Díaz Lacayo, Jxel Rajchenberg, Fernando Buen Abad, Yanna Hadatty Mora, Manuel Talens, Juan Brom, Luciano Concheiro, Carlos Beas, Eduardo Andrés Sandoval,Víctor García Zapata, Catalina Eibenschutz, Pablo Romo, Marco Antonio Velázquez Navarrete, Manuel Talens, Beatriz Aurora, Camilo Pérez Bustillo, Tlaxcala (red de traductores por la diversidad lingüística), Ana María Rivadeo, Frida Modak,
Panamá
Marco A. Gandásegui, Julio Yao, Guillermo C. Cohen-DeGovia,
Peru
Anibal Quijano, Carlos Bedoya, Javier Diez Canseco, Partido Socialista, Diana Miloslavich, Carlos Torres Arguedas, Confederación General de Trabajadores del Perú (CGTP), Pedro Córdova Del campo (CEDAL), Hernán Luis Carrasco, Augusto Malpartida, Jaime Vargas Luna, Segundo G. Guerrero Díaz, Juan Zenón Gutiérrez, Dante Lecca Lozano, Jose Coronado Cobeñas,
Portugal
Miguel Urbano
Uruguai
Eduardo Galeano, Ana Juanche, Raúl Zibechi, AnahitAharonian,Gabriela Rodriguez, Fernando Willat, Ruben Elías, SERPAJ América Latina, Ignacio Martínez, Joaquín Ernesto EtcheversVianna, Beatriz Rosenblum, María M. Delgado, REDH - Red Solidaria por los DDHH,
Venezuela
Aram Aharonian, Lisa Sullivan (SchoolofAmericasWatch), Pablo Kunich, Raúl Cazal, Joel Sangronis Padrón
Excelente, Aldenor.
Vou sim, ainda hoje, publica o "outro lado".
Obrigado pelos parabéns.
E espero que, igualmente, o Página Crítica tenha vida longa. Longuíssima.
Abs.
ESCLARECIMENTOS AOS SENHORES PARLAMENTARES
Sobre a participação de Maria Lucia Fattorelli Carneiro na Comissão de Auditoria Oficial da Dívida Equatoriana (CAIC)
A propósito da matéria “Uma ameaça de US$ 5 bilhões”, veiculada pelo Jornal “O Globo” de domingo, dia 30 de novembro de 2008, que tratou de forma incorreta e difamatória minha participação na Comissão de Auditoria Integral da Dívida Equatoriana (CAIC), gerando polêmica manifestada em diversos pronunciamentos no Congresso Nacional, encaminho os seguintes esclarecimentos aos parlamentares brasileiros:
1. A matéria em questão contém graves ofensas e falsas acusações pessoais diretas a esta servidora pública federal há 28 anos, exercendo há 26 anos o cargo de auditora-fiscal da Receita Federal do Brasil, cujo exercício funcional sempre foi primado pelo trabalho com dignidade, ética e verdade.
2. Fui nomeada pelo Presidente Rafael Correa Delgado para integrar a Comissão de Auditoria da Dívida Equatoriana (CAIC) devido à minha participação, como voluntária, na campanha da Auditoria Cidadã da Dívida desde o ano 2000, movimento social que reivindica o cumprimento da Constituição Federal Brasileira, cujo art. 26 do ADCT determina a realização de uma auditoria da dívida externa.
3. A CAIC foi instituída mediante o Decreto Executivo nº 472, assinado pelo Presidente Rafael Correa em 9 de julho de 2007. Inicialmente, estive no Equador contribuindo com os trabalhos da CAIC durante meus períodos de férias regulamentares: de 5 a 13 de outubro de 2007, e 27 de janeiro a 23 de fevereiro de 2008[1].
Posteriormente, atendendo ao pedido formulado pelo governo equatoriano[2], e pela Embaixada do Equador no Brasil[3], o governo brasileiro autorizou meu afastamento do País, mediante atos administrativos que cumpriram todas as exigências legais e obedeceram aos princípios da administração pública, inclusive o da transparência, com publicação no Diário Oficial da União, respectivamente em 10/04/2008 e 25/07/2008. Em virtude dessa autorização legal trabalhei para a CAIC a partir de 14 de abril de 2008, tendo concluído os trabalhos em 26 de setembro de 2008. Em 29 de setembro de 2008 me apresentei ao trabalho na Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento em Brasília[4].
Cabe destacar que a cessão de servidores públicos para outros países é um procedimento legal, de praxe no âmbito das relações de cooperação internacional e obedece à legislação de regência, que advém do princípio estabelecido no inciso IX e no parágrafo único do art. 4º da Constituição Federal Brasileira:
Art. 4º - A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
...
IX – cooperação entre os povos para o progresso da humanidade.
...
Parágrafo Único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.
4. Minha cessão ao governo do Equador foi autorizada com base no art. 1º, inciso IV, do Decreto nº 1.387/95, que trata do afastamento de servidores públicos do País, regulamentando o art. 95 da Lei 8.112/90.
A modalidade autorizada - “com ônus limitado” - significou que o governo brasileiro não arcou com gastos relacionados a diárias, passagens ou quaisquer vantagens, mantendo unicamente meus vencimentos, direito assegurado a qualquer servidor autorizado a se afastar do País, nos casos elencados no precitado Decreto 1387/95[5]. Assim, não cabe dizer “e até pagou salário”, como fez a matéria de “O Globo”, pois este é o procedimento legal e de praxe.
5. Considerando o grande volume de documentos a serem analisados pela CAIC, uma vez que a auditoria determinada pelo Decreto nº 472 compreendeu 30 (trinta) anos do processo de endividamento público equatoriano, desde 1976 até 2006, a Comissão foi organizada em subcomissões, dedicadas respectivamente à auditoria das dívidas Multilateral, Bilateral, Comercial e Interna.
Trabalhei exclusivamente na “Subcomissão de Dívida Comercial da CAIC”, cuja atribuição era auditar a dívida externa contratada com bancos privados internacionais (em especial Lloyds Bank, Citibank, JPMorgan, Chase Manhattan Bank, Shearson Loeb Rhoades).
Por sua vez, os financiamentos relacionados ao BNDES faziam parte do trabalho da “Subcomissão de Dívida Bilateral” da CAIC, da qual não participei. A Dívida Bilateral corresponde à dívida contratada com outros países ou com bancos públicos de outros países.
Portanto, o trabalho que realizei no Equador[6] não teve qualquer relação com a maliciosa conexão feita pela matéria do jornal “O Globo”, resultado de ardilosa montagem que visou a promover criminosa DIFAMAÇÃO PÚBLICA. O jornal estampa minha imagem, cita meu nome 10 (DEZ) vezes, além de uma série de outras referências à minha pessoa como servidora, auditora e funcionária, inventando uma correlação absurda entre a autorização do governo brasileiro relacionada ao meu afastamento do país, o caso Odebrecht e a “preparação de um calote”, fato inexistente, pois nunca ocorreu o tal calote alardeado na matéria.
O jornalista autor da matéria, José Casado, tinha conhecimento do fato de que eu não atuei na Subcomissão de Dívida Bilateral, pois durante sua entrevista telefônica ele me perguntou vários detalhes relacionados à Odebrecht/BNDES e eu informei a ele que não possuía aquelas informações, pois meu trabalho havia se restringido à Comissão de Dívida Comercial da CAIC. O jornalista ignorou estes esclarecimentos e publicou matéria altamente tendenciosa e difamatória, por meio da qual faz justamente a conexão que sabia não existir.
A realização de auditoria é um procedimento legítimo e necessário para garantir transparência e segurança às contas públicas. A falta ou a negação da auditoria da dívida é que deveria ser tida como situação esdrúxula e indefensável do ponto de vista legal e moral, por ser adversa ao interesse público. A realização da auditoria da dívida externa está inclusive prevista na Constituição Federal de 1988, sendo absurda a vinculação da realização de auditoria à “preparação de um calote”, como consta da matéria.
Ao publicar que “O governo brasileiro emprestou mão-de-obra, pagou o custo e, assim, ajudou o Equador a preparar o calote em uma dívida com o BNDES, avalizada pelo Tesouro Nacional” o jornal “O Globo” distorceu os fatos, responsabilizando o próprio governo brasileiro pela preparação do factóide “calote”. Também desqualificou o ato soberano e responsável do Equador de realizar uma auditoria de sua dívida pública, desmerecendo ainda o árduo trabalho técnico que realizei no Equador, o qual exigiu muita dedicação e sacrifícios, tudo enfrentando para bem representar o País no exterior e honrar a oportunidade de contribuir para a aproximação das nações latino americanas.
Acima de tudo, essa matéria investiu contra a integração latino americana e atentou contra a Constituição Federal Brasileira, pois, paradoxalmente, sem aprofundar na análise do Caso Odebrecht, a matéria trata como grande “ameaça” uma demanda de caráter meramente comercial que envolve atuação dessa empresa privada no Equador, cuja solução deve ser buscada nos fóruns competentes, e de forma alguma pode vir a afetar as relações bilaterais entre o Brasil e o Equador.
A desqualificação do trabalho de auditoria da CAIC visou desviar o foco das graves irregularidades, ilegalidades e ilegitimidades encontradas pela Comissão de Auditoria Equatoriana[7], que durante os trabalhos identificou inúmeros fatos históricos idênticos aos verificados em processos de endividamento de outros países da América Latina, cuja integração é essencial para a defesa dos interesses das nações e povos do nosso continente.
A montagem[8] evidenciada na escandalosa matéria do jornal “O Globo”, concatenando repetidamente uma inventada ligação entre minha designação para a CAIC, o caso Odebrecht e o factóide “calote” provocou um ambiente de polêmica em todo o País, mobilizando autoridades, entidades, trabalhadores, consumindo tempo valioso de todos e também recursos, ante o clima de verdadeiro terrorismo gerado a partir das graves acusações e ilações construídas pela alarmante matéria “Uma ameaça de US$ 5 bilhões”.
É preciso esclarecer cabalmente que fui vítima de jornalismo irresponsável; que fui legalmente cedida ao Equador com base em atos fundamentados em preceitos legais e constitucionais; que não “ajudei a preparar calote” algum; que não participei da investigação do caso Odebrecht; que realizei trabalho técnico na investigação do endividamento com bancos privados, cujo aprendizado pode ter relevância especialmente para o Brasil, que confio um dia cumprirá a Constituição Federal e realizará a auditoria da dívida pública.
Além disso, nunca fui “voluntária de ONG” como diz a matéria, pois sempre atuei como voluntária de movimentos sociais e não de “ONG”; não criei entidade denominada “Dívida Cidadã”, como erra a matéria, pois o movimento da “Auditoria Cidadã da Dívida” foi fundado por dezenas de entidades e pessoas em respeito aos mais de seis milhões de votos colhidos no Plebiscito[9] da Dívida realizado no ano 2000 (www.divida-auditoriacidada.org.br); o movimento da “Auditoria Cidadã da Dívida” é apartidário, independente, e aberto à participação de todos os cidadãos que se incomodam com as injustiças provocadas pelo processo de endividamento brasileiro e que exigem o cumprimento da Constituição Federal de 1988; não escrevi livro sobre o assunto da dívida, apenas organizei e apresentei o livro “Auditoria da Dívida Externa: Questão de Soberania”, em janeiro de 2003[10], cedendo todos os direitos para a Rede Jubileu Sul Brasil.
Esperando ter esclarecido as dúvidas que têm sido levantadas em pronunciamentos dos senhores parlamentares, coloco-me à inteira disposição de V. Exas, especialmente diante da necessidade de conhecer e divulgar os importantes resultados da auditoria equatoriana, de aprofundar a discussão sobre o endividamento público brasileiro no atual cenário de crise financeira global, e especialmente de promover o fortalecimento da integração dos países da América Latina.
Brasília, 4 de dezembro de 2008.
Maria Lucia Fattorelli Carneiro
Auditora Fiscal da Receita Federal do Brasil e
Coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida
--------------------------------------------------------------------------------
[1] Certidão do trabalho realizado no Equador, datada de 26 de setembro de 2006 e subscrita pelo Ministro de Coordenação Política e Presidente da CAIC, Ricardo Patiño Aroca.
[2] Oficio Nº MCP-DM-213, de 12 de fevereiro de 2008, e Oficio Nº MCP-DM-037-08, de 27 de fevereiro de 2008, ambos de lavra do Ministro de Coordenação Política e Presidente da CAIC, Ricardo Patiño Aroca, dirigidos respectivamente ao Ministro da Fazenda Guido Mantega e ao então Secretário da Receita Federal Jorge Rachid
[3] Documento Nº 4-2-27/2008, datado de 07.03.2008, dirigido ao Ministério de Relações Exteriores, Subsecretaria Geral para a América do sul.
[4] Carta datada de 29 de setembro de 2008, dirigida ao Delegado da DRJ, Dr. José Domingos de Medeiros, e devidamente recebida pela responsável pelo Selog/DRJ, Helen Chrispim Machado.
[5] Decreto nº 1.387/95, Art. 1º - O afastamento do País de servidores civis de órgãos e entidades da Administração Pública Federal, com ônus ou com ônus limitado, somente poderá ser autorizado nos seguintes casos, observadas as demais normas a respeito, notadamente as constantes do Decreto nº 91.800, de 18 de outubro de 1985:
I - negociação ou formalização de contratações internacionais que, comprovadamente, não possam ser realizadas no Brasil ou por intermédio de embaixadas, representações ou escritórios sediados no exterior;
II - missões militares;
III - prestação de serviços diplomáticos;
IV - serviço ou aperfeiçoamento relacionado com a atividade fim do órgão ou entidade, de necessidade reconhecida pelo Ministro de Estado; (Redação dada pelo Decreto nº 2.349, de 15.10.1999)
V - intercâmbio cultura, científico ou tecnológico, acordado com interveniência do Ministério das Relações Exteriores ou de ultilidade reconhecida pelo Ministro de Estado;
VI - bolsas de estudo para curso de pós-graduação stricto sensu .
[6] Documentos que comprovam o desempenho de atividades na Subcomissão de Dívida Comercial:
1. Publicação da CAIC, datada de maio/2008, disponível no seguinte endereço eletrônico, página 9:
http://www.auditoriadeuda.org.ec/images/stories/documentos/folleto_quien_debe_a_quien.pdf
2. Oficio Nº MF-CAIC-2008-0585, de 16 de julio de 2008, subscrito pelo Ministro Ricardo Patiño Aroca, Ministro de Coordenação Política e Presidente da CAIC, o qual atesta que “El trabajo de la Dra. Fattorelli ha tenido una relevancia especial en la Subcomisión de Deuda Comercial de La CAIC, por la rigurosidad su labor y el compromiso asumido en todas las tareas que emprendiera para cumplir con los objetivos señalados por El Presidente y que fueran El fundamento para que se creara ese organismo.”
3. Memorando Nº MF-CAIC 928-2008, de 24 de setembro de 2008, referente à apresentação de todos os relatórios finais que elaborei em cumprimento ao Decreto nº 472, todos relacionados à auditoria realizada sobre o processo de “DÍVIDA EXTERNA COMERCIAL EQUATORIANA”, que corresponde à dívida contratada com bancos privados internacionais.
[7] Relatório Final Executivo da CAIC disponível no endereço eletrônico: http://www.auditoriadeuda.org.ec/images/stories/documentos/informe_final_CAIC.pdf
[8] Evidências de montagem, para promover DIFAMAÇÃO PÚBLICA:
a) A matéria estampa minha foto ao lado do título que diz “BRASIL EMPRESTOU AUDITORA E ATÉ PAGOU O SALÁRIO”, concluindo com a frase “A comissão deu a Correa as justificativas para que ele procurava para anunciar o calote na dívida com o Brasil”, repetindo assim a conexão inventada, entre minha designação e o “calote”.
b) Na seqüência, a matéria estampa partes do Decreto nº 472, destacando meu nome em trecho da nomeação pelo Presidente do Equador, cola partes dos dois despachos que autorizaram o afastamento do país, sublinhando meu nome, e conclui em letras maiúsculas: “RESULTADO DA AUDITORIA: A CULPA É DO BRASIL” copiando parte de uma frase do relatório executivo da CAIC, referente à subcomissão bilateral, da qual não participei. A matéria induz ao erro de que a conclusão descrita seria de minha autoria e que o resultado se resumiria somente nessa frase isolada. Essa montagem configura grave acusação falsa e criminosa.
c) Na parte em que a matéria detalha a “Cronologia do Caso”, página 26 do Caderno de Economia, uma vez mais vincula, na seqüência, minha nomeação e, em seguida, novamente destaca unicamente uma frase do relatório executivo da outra subcomissão, de Dívida Bilateral, da qual eu não participei.
d) No final da matéria, outra vez a falsa vinculação entre minha pessoa e o Caso Odebrecht, que foi objeto de análise por outra subcomissão, de dívida Bilateral, da qual não participei: “No fim de setembro, quando Maria Lucia retornou a Brasília, o presidente do Equador já tinha cópia do relatório final. O Brasil era destacado: “Os três contratos principais (com a empresa Odebrecht)...”. Essa falsa correlação visou unicamente reforçar a idéia inventada nessa matéria, com objetivo claramente DIFAMATÓRIO, contendo graves acusações e ofensas.
[9] O plebiscito foi uma iniciativa popular, mas o então deputado federal José Dirceu (PT-SP) apresentou o projeto de Decreto Legislativo nº 645-A, de 2000, que propôs oficializá-lo: “Realizar-se-á referendo para que a população brasileira, na condição de eleitora e em pleno gozo de seus direitos políticos, decida sobre a realização de auditorias da dívida externa, das condições de pagamento da dívida externa, e sobre a manutenção dos acordos internacionais entre o Governo Brasileiro e o Fundo Monetário Internacional”.
[10] Os autores que contribuíram com textos para o referido livro foram: Alberto Acosta (Equador); Alberto Amadei (Brasil); Arnaud Zacharie (Bélgica), Beverly Keene (Norte-americana naturalizada Argentina), Carlos Marichal (México), Charles Abrahams (África do Sul), Dércio Garcia Munhoz (Brasil); Eric Toussaint (Bélgica), Hugo Ruiz Diaz (Paraguai), Jaime Atienza Azcona (Espanha), Kunibert Raffer (Alemanha), Marcus de Freitas Gouvêa (Brasil), Oscar Ugarteche (Perú), Reinaldo Gonçalves (Brasil) e Stella Pacheco Pimenta (Brasil).
Postar um comentário