domingo, 7 de dezembro de 2008

Isolado, Lacerda é o alvo


A pergunta que não quer calar é: por que tanta gente no Congresso Nacional, no governo e no Supremo Tribunal Federal quer o afastamento definitivo do diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin)? Rasga-se o véu da ilusão e desvenda-se o vilão como a melhor forma de destruir a Operação Satiagraha. Dá a entender que Paulo Lacerda está sendo uma vítima solitária do "Estado policial".
Nesse embate silencioso nas criptas da política, o lema dos três mosqueteiros (que são quatro), não tem base para ser aplicado. Lacerda acredita que a luta de um contra todos deveria ser pelo menos no plano pessoal irrepreensível, e no político circunstancial.
Há precisamente três meses, o delegado Paulo Lacerda vive como um autista, em um mundo particular de solidão e clausura, à espera de uma possível absolvição de um crime sobre o qual não há nenhuma evidência concreta de que tenha sido cometido. Atualmente, para achar o delegado - uma das estrelas do primeiro mandato do Nosso Guia justamente por ter transformado a Polícia Federal em um órgão público eficiente -, é preciso atravessar o subsolo da Corte e chegar ao labirinto onde se encontra.
Não é fácil encontrar o policial, que passa os dias encafuado numa sala esquecida da Secretaria Nacional Antidrogas. Com seus modos franciscanos, escondido no subsolo do mesmo palácio onde diariamente vários de seus adversários circulam na tentativa de removê-lo de vez da direção da Abin, Lacerda tem tentado sobreviver a um mundo em desconstrução, inclusive de forma literal.
No início de setembro, o delegado foi afastado temporariamente do cargo de diretor-geral da Abin depois de ter sido acusado de participar de um suposto grampo telefônico de um insípido diálogo entre o presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, e o senador Demóstenes Torres (DEM-GO).
Evidências apontam que o áudio de tal conversa tenha jamais aparecido, o suposto grampo serviu à tese de que se vive no Brasil um "Estado policial" e um descontrole do aparelho jurídico-policial, representado pela PF, a agência de inteligência, o Ministério Público e juízes de primeira instância que se portariam como justiceiros.

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“Por que a Satiagraha teve o poder de mobilizar tantas forças contra ela? E por que, para muitos no Executivo, no Legislativo e no Judiciário, tornou-se de vital importância não só afastar Lacerda da Abin, mas aniquilar sua carreira?”

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Tempos atrás, um diretor-geral da Polícia Federal (Vicente Chelotti) foi afastado do cargo por grampear o gabinete de um presidente da República (Fernando Henrique Cardoso). Antes disso, espiões - até parece que estamos vivendo o recrudescimento do nacional-socialismo que Hitler chefiou - do extinto Serviço Nacional de Informações (SNI) foram identificados como responsáveis pelos grampos ilegais que revelaram os bastidores nada angelicais da privatização da Telebrás - é a cucurbitácea em estado de germinação, mais conhecido como pepino, da disputa empresarial que desembocaria na Operação Satiagraha.
Nesse momento, Marcos Valério de Souza, que não tem amigos de fé e não tentou subornar um delegado da PF, completa um mês e meio de cativeiro - na quinta-feira 27, o Supremo Tribunal Federal voltou a negar sua liberdade. Incrivelmente, nem em épocas remotas e muito menos no caso de Marcos Valério levantam-se vozes para aprontar a existência de um "Estado policial" ou para acusar o desrespeito às garantias individuais.
Na realidade, é um grande abacaxi para se descascar. Muitas indagações se fazem: por que a Satiagraha teve o poder de mobilizar tantas forças contra ela? E por que, para muitos no Executivo, no Legislativo e no Judiciário, tornou-se de vital importância não só afastar Lacerda da Abin, mas aniquilar sua carreira?
São questionamentos que as circunstâncias ainda não permitiram responder, mas que talvez algumas pistas terminem por elucidá-las. Tornar anódina a investigação de Protógenes Queiroz, sob o argumento de que seus excessos e arroubos serão excluídos, e manter Lacerda em banho-maria, nesta quadra dos acontecimentos, soa como leviandade. Como Dantas foi condenado pelo juiz Fausto de Sanctis, pouca gente duvida que, diante dos crimes, em especial a tentativa de suborno de um delegado federal.
A defesa de Dantas vai recorrer e a melhor estratégia e aproveitar e estimular a tese das irregularidades cometidas durante a Satiagraha. E agora? O afastamento de Protógenes do setor da inteligência é o último golpe.

Sergio Barra é médico e professor
sergiobarra9@gmail.com

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