quarta-feira, 26 de março de 2008

Procurador apura indício de dinheiro ilegal em campanhas

Teor de gravações colhidas durante investigações da Operação Rêmora leva José Augusto Torres Potiguar a determinar abertura de procedimento interno

O procurador regional eleitoral José Augusto Torres Potiguar determinou nesta terça-feira (25) a abertura de procedimento administrativo para apurar denúncias de que dinheiro público teria sido utitilizado “na campanha de candidatos ao cargo de deputado estadual em 2006.”
Procedimento administra, ou PA, como se chama, é uma apuração preliminar, que se processa no âmbito interno do Ministério Público. Se, ao final, forem encontrados indícios de delitos, o MPF ajuíza a ação adequada. Do contrário, o PA é arquivado e, portanto, não tem conseqüência no âmbito judicial.
No despacho que ordenou a abertura do procedimento administrativo, o procurador faz referência, especificamente, aos fatos “consubstanciados nas denúncias formuladas no bojo da Ação de Perda de Cargo Eletivo nº 2044”.
Trata-se do processo de cassação, por infidelidade partidária, de Fernando Navarro, que realmente teve seu mandato cassado por 4 a 2, na semana passada. Nos autos do processo, conforme o Espaço Aberto revelou, um CD anexado pelo advogado Guilherme de Almeida, defensor do agora ex-parlamentar, revela conversas entre dois interlocutores.
Nas alegação finais – a última peça apresentada pelas partes antes do julgamento – pela plenário da Corte Eleitoral, o advogado de Fernando apresenta a degravação de vários trechos da conversa entre duas pessoas. Uma delas é mencionada apenas como “interlocutor”. A outra é identificada pelo advogado como sendo Wallace Almeida, assessor da Prefeitura de Bragança.
Lê-se, então, o seguinte diálogo travado entre os dois:

Interlocutor: Vai ter repasse agora? (quase que inaudível).
Sr. Wallace: É, foi uma emenda, aprovada, pelo foi uma emenda do Priante que já ta na Caixa esse dinheiro, no valor de 300 mil, e a prefeitura entra com, com uma, como é.. Uma contra.. Com, com mais um de 15% ou 10%.
Interlocutor: De contrapartida.
Sr. Wallace: A contrapartida dela. Porque eu to lhe falando isso, porque eu chamei, o pessoal aqui ta aperreado de dinheiro, pessoal ta sem dinheiro pra campanha, ai eu liguei, eu me lembrei de mim, olha pessoal tem essa obra, arranja 10% disso, parcelas de 10, até o final da campanha 10 mil, daqui a quinze dias 10 mil, e na véspera da campanha 10 mil, pra ajudar a Simone que é 10%, numa obra dessa a gente tem um lucro mais de 10%, e isso em vez de dar pra outra pessoa, que com certeza vai sair pra outra pessoa, teria que molhar a mão essas coisas todas, o senhor sabe como é, façam isso, garantam isso pra ela é um compromisso com ela, a Simone não vai deixar isso ir pra mão de outra pessoa, nós temos como direcionar, o projeto é meu, eu posso administrar isso tudo, só que os meninos.. Acho que.. Ou.. Ele, mais ai eu abri o verbo, disse como é o prefeito disse as dificuldades que tão tendo e tal, não sei o qual foi o medo que tiveram, eu não sei se realmente eles estão aperreados de dinheiro ou se eles estão com medo, entendeu, eu não sei ta, o Marco Antonio e o Marcio, mais existe essa, existe uma outra obra também no valor de 1 milhão que é de asfalto, que também seria direcionada pra eles, né..
Interlocutor: Certo.

Em outro momento, segundo se lê nas alegações finais de Navarro, aquele que o advogado do ex-vereador afirma ser Wallace Almeida diz o seguinte: “Nós temos aqui empenhado, 1 milhão pra asfalto, empenhado; nós temos empenhado 1 milhão esgoto que o doutor Jader trouxe em mãos, já empenhado esse dinheiro, já ta sacramentado, nós temos esses outros 300, quer dizer, tem muito dinheiro aqui, que se juntar 10% disso tudo da mais de 200 mil e ajuda uma campanha, o senhor ta entendendo, e fica tudo na nossa mão, não to entendendo o porquê ele não faz isso rapaz, eu não to entendendo.”
A Simone mencionada nas gravações seria a deputada Simone Morgado, do PMDB de Bragança. Fernando Navarro alegou, no processo de perda de mandato julgado pelo Tribunal Regional Eleitoral, que foi obrigado a migrar do PMDB para o Partido Republicano (PR) porque foi alvo de perseguições desde que passou a fazer denúncias sobre o suposto envolvimento da parlamentar em ilegalidades apuradas durante as investigações da Operação Rêmora, deflagrada pela Polícia Federal em novembro de 2006.
A deputada Simone Morgado nega as acusações e diz que tudo não passa de perseguições, rancores e ressentimentos de seus adversários na política bragantina. A parlamentar já divulgou nota expondo sua versão sobre as denúncias e também recebeu a solidariedade dos presidentes de vários diretórios municipais do PMDB.
O TRE não acolheu as alegações de Navarro e acabou por cassá-lo, mesmo com o parecer contrário de Potiguar e do voto do relator, o juiz federal Alexandre Franco. Ambos entenderam que havia justa causa para o vereador ter mudado de partido.
Alexandre Franco não apenas votou pela improcedência do pedido, como pediu que todas as denúncias constantes do processo referentes ao uso irregular de dinheiro público em campanhas eleitorais fosse remetido ao Ministério Público, para dar início aos procedimentos que entendesse necessários.
Mas o voto vencedor, no julgamento, não foi o de Alexandre. Foi do juiz Rubens Leão, que abriu a divergência em relação ao magistrado federal e, além de ter votado favoravelmente à perda do mandato de Fernando Navarro, não fez qualquer menção sobre o envio dos indícios de irregularidades para investigação no Ministério Público Federal. A determinação do procurador eleitoral supre essa omissão constante do voto do juiz Rubens Leão.

O despacho na íntegra
É o seguinte, na íntegra, o despacho do procurador eleitoral:
“Considerando as denuncias formuladas pelo demandado na ação de perda de cargo eletivo que tramitou perante o Tribunal Regional Eleitoral do Pará sob o nº 2044, de 2007, levado a julgamento no último dia 18 do corrente, segundo as quais teria havido uso de dinheiro público na campanha à candidatos ao cargo de deputado estadual em 2006;
Considerando que referidas denuncias, se verdadeiras, indicam prática de abuso de poder econômico, além de outros atos ilícitos em outras áreas, como atos de improbidade administrativa, além de ilícitos penais;
Considerando ser dever do Ministério Público Eleitoral a apuração de fatos que lhe chegam ao conhecimento e que, em tese, podem representar ilícitos eleitorais, bem como, proceder ao encaminhando de investigações em áreas especificas que entender cabíveis
Procedo à instauração do presente procedimento com a finalidade de apurar os fatos aqui indicados e consubstanciados nas denuncias formuladas no bojo da Ação de Perda de Cargo Eletivo nº 2044, pelo que determino:
a) seja o presente autuado;
b) seja oficiado diretamente ao juiz relator do aludido processo solicitando remessa de cópia de todas as peças dos autos, notadamente das gravações a ele acostadas com a defesa do demandado.

Belém, 25 de março de 2008

José Augusto Torres Potiguar
Procurador Regional Eleitoral”

Um comentário:

Anônimo disse...

Parabéns Dr. Potiguar. Tudo deve ser muito bem apurado para que seja descoberta a corja de canalhas que está por trás dessa denúncia, passando por Viseu, Augusto Correa, Bragança(município onde a deputada, com a sua eleição, exterminou o grupo que já estava há quase doze anos no poder), Tracuateua, Capanema e outros municípios da região nordeste do Pará, além de Belém e Brasília.
Mas apure também tantos outros processos que estão "dormindo" por aí, como por exemplo o do Projeto Alvorada, que já criou teia de aranha. Será que é só porque envolve um pássaro de bico grande? Ou então um mais recente. Só para lembrar, também diz respeito a uma gravação telefônica. É isso mesmo, o que envolve outros dois deputados: Luis Cunha e Adamor Aires. Será que é porque eles foram para a tribuna da Assembléia se defender e com isso o Sr. achou que não precisaria fazer mais nada? Vamos lá! Estamos esperando pela abertura de procedimento administrativo para apurar essas denúncias também.