segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Pará 2000 e Hangar, acautelai-vos!

No Blog do Alencar, sob o título “Riscos”:

O portal Gestão Sindical, do amigo Oswaldo Braglia, republicou este interessante artigo sobre os riscos que correm os dirigentes de entidades do terceiro setor quando elas se tornam reclamadas na Justiça do Trabalho.
Confirmo que é mesmo um risco e bem elevado.
E faço mais, pois estendo o alerta para os dirigentes de organizações sociais, porque a proximidade delas com os governos potencia os riscos.
Aqui no Pará tem o caso emblemático da Associação São José Liberto, organização social entregue à própria sorte - ou azar, conforme o ponto de vista - pelo Governo do Estado do Pará (impessoalmente considerado pois isso aconteceu no final de uma e início de outra gestão). Para encurtar, foram dezenas de reclamações trabalhistas contra essa organização social e em algumas delas pelo menos uma diretora chegou a ter seus poucos bens - móveis de sua residência - penhorados.
Esse é o mesmo risco que correm atualmente os dirigentes das organizações Pará 2000 e Hangar, que parecem não ter dele muita consciência, a julgar pela alegria - e destemor - com que exercem seus respectivos cargos de direção.

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Riscos aos dirigentes de entidades do Terceiro Setor

RAFAEL AUGUSTO PAES DE ALMEIDA E EDUARDO PANNUNZIO

A Justiça do Trabalho determinou, recentemente, o bloqueio de R$ 68 mil na conta bancária do vice-diretor de uma organização da sociedade civil de interesse público (Oscip), em decorrência de três processos movidos por ex-funcionários contra a organização. Ocorre que, muitos dos gestores das entidades sem fins lucrativos são voluntários, não são os "donos do negócio" e não lucram com seu trabalho. Assim, atuais ou possíveis voluntários podem desistir de executar tão importante tarefa de interesse público pelo receio de terem suas contas penhoradas em função das referidas decisões judiciais.
Infelizmente, a Justiça do Trabalho, nitidamente "protecionista", acaba causando graves distorções na utilização da desconsideração da personalidade jurídica, que significa desfazer a separação patrimonial da empresa e de seus sócios e administradores.
Ao contrário do que ocorre na esfera cível (artigo 50 do Código Civil) e consumerista (artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor), nas quais a lei determina que a desconsideração da personalidade jurídica ocorre somente quando há abuso evidenciado em atos atentatórios a lei, aos atos constitutivos e desvio de finalidade, na esfera trabalhista ela acontece automaticamente. Ou seja, na ausência de bens para a satisfação do crédito do reclamante, o Juízo do Trabalho defere o bloqueio de imediato, sem a análise detalhada de eventuais elementos ensejadores da desconsideração da personalidade jurídica.
Ademais, temos situações semelhantes nos processos de execução fiscal. Muito embora o artigo 135 do Código Tributário Nacional determine que os diretores e gerentes respondam com seu patrimônio pessoal em situações de excesso de poderes ou infração à lei, a realidade nos mostra que o Poder Judiciário vem deferindo os requerimentos de desconsideração da personalidade jurídica de forma ampla e genérica, avançando-se sobre o patrimônio dos diretores e sócios sem a cuidadosa análise do artigo 135. Ressalte-se, ainda, que a penhora on-line trouxe celeridade ao processo de bloqueio de numerário em contas bancárias.
Entendemos que o prévio ajuizamento da declaração de insolvência civil, uma vez diagnosticada a situação de ruína patrimonial da entidade sem fins lucrativos, revela-se como uma medida de precaução para mitigar a possibilidade de bloqueio de ativos financeiros de seus administradores (art. 748 do Código de Processo Civil e 955 do Código Civil). Finda a fase de conhecimento nos processos trabalhistas, não restará alternativa para o reclamante senão a de habilitar o crédito (título executivo judicial) nos autos da insolvência. De forma análoga ao processo de falência, por ocasião da satisfação do passivo deverá observar a ordem de preferência dos créditos: 1) Créditos acidentários e, trabalhistas, 3) Créditos com garant ia real, 4) Créditos Tributários e 5) Créditos Quirografários.
Ainda assim, o risco de desconsideração da personalidade jurídica em caso de insolvência civil não está totalmente descartado. Caso se comprove confusão patrimonial ou desvio de finalidade, os bens dos administradores poderão responder pelas dívidas contraídas pela ONG. Contudo, mesmo nessa situação, a desconsideração não é automática como ocorre na Justiça do Trabalho, pois é condição sine qua non o atendimento aos requisitos do artigo 50 do Código Civil, vez que a Justiça Cível é muito mais rigorosa para a concessão da desconsideração da personalidade jurídica.
Não existe em nosso em nosso ordenamento jurídico, para as entidades sem fins lucrativos, um regime análogo à recuperação judicial de empresas. A Lei n.º 11.101/05 (Lei de Falências e Recuperações Judiciais) somente é aplicável para as sociedades empresárias e o empresário. Todavia, a opção que o sistema oferece para a organização sem fins lucrativos em situação de ruína patrimonial é a declaração de insolvência civil, pois de acordo com o artigo 778 do Código de Processo Civil, todas as obrigações do devedor serão consideradas extintas decorrido o prazo de cinco anos da data de encerramento do processo de insolvência.
Os seguros de responsabilidade executiva (D&O) poderiam até ser uma opção para o resguardo dos dirigentes das entidades sem fins lucrativos, porém referida modalidade securitária mostra-se economicamente inviável para a maioria das entidades do terceiro setor. Infelizmente, diante da crescente tendência da Justiça do Trabalho de desconsiderar a personalidade jurídica das entidades, e, por consequência, avançar sobre os bens pessoais de seus administradores e gestores, a atividade de gerir uma ONG será cada vez mais arriscada.
Para que isso não leve a uma diminuição da atuação de organizações de tal natureza, em prejuízo para a própria sociedade brasileira, é fundamental que as entidades sejam cada vez mais rigorosas em seus processos de gestão e controle, precavendo-se contra eventuais tentativas de responsabilização judicial dirigidas a elas próprias e seus dirigentes.

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RAFAEL AUGUSTO PAES DE ALMEIDA é advogado especializado em Direito Civil
EDUARDO PANNUNZIO é advogado especializado em Terceiro Setor

2 comentários:

Anônimo disse...

A questão, PB, é que o governo FHC criou a lei federal das Organizações Sociais e os governos estuduais a copiaram ou replicaram.

Há doutrinadores da área do Direito que a consideram uma burla ao Estatuto das Licitações porque somente o governo tem o poder de credenciar uma empresa como organização social e, depois que a empresa recebe esse status, ganha, via de regra, um contrato de gestão no qual lhe é assegurado o repasse de recursos públicos com uso da patrimônio público (e até de servidores públicos).
Quer dizer, é uma, com o perdão da palavra, uma teta.

Com condições tão generosas, a OS não faz esforço algum para tornar-se lucrativa, prefere ficar atrás do Poder Público ao qual está vinculada desde o nascimento.

Na minha opinião, só poderia dar certo se fosse fixado prazo para deixar de receber subsidios públicos, ainda que o prazo fosse generoso, algo de dez ou doze anos, por exemplo.

Do jeito que está, as OS vão ficando cada vez mais parecidas com repartições públicas, até mesmo pelo número de demitidos do Serviço Público que ali se abrigam.

Não pode dar certo, além de representar uma evidente burla ao Estatuto das Licitações.

JOSE MARIA disse...

Prezado Bemerguy,

Obrigado pela repercussão do post.
Quando as organizações foram criadas eu dizia que se dessem certo é porque tinha dado errado.
Como nesta terra só as piores profecias são realizadas, essa é uma delas.
Mas fora daqui consta que tem algumas bem sucedidas, inclusive o INPA e o Laboratório de Luz Síncroton.